quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Algumas considerações sobre Tiririca e a carnavalização

O Abestado no picadeiro de Brasília
Emanoel Barreto

Vejo na Folha: A Justiça Eleitoral de São Paulo rejeitou a denúncia oferecida pelo Ministério Público Eleitoral contra o palhaço Tiririca (PR) por causa do suposto analfabetismo do candidato.
O juiz Aloísio Sérgio Rezende Silveira, se baseou no entendimento do TRE (Tribunal Regional Eleitoral), durante o processo de registro de candidatura, de que não não havia qualquer causa de inelegibilidade, inclusive quanto à instrução mínima.

Agiu bem a Justiça. A presença de Tiririca no cenário político nacional já foi notícia até no Le Monde, de Paris, quando o jornal francês afirma que ele deverá ter uma votação "formidável", ajudando a eleger mais uns dois deputados do seu partido, o PR.

Tiririca será, na Câmara, poderosa presença da carnavalização da vida brasileira; metafórica presença do povo, pobrinho, a se contrapor às elites, aos grandes, aos bem-vestidos, aos sepulcros caiados. Será a figuração viva do Abestado, do homem comum, em meio ao happening dos falastrões e endinheirados. 


Ele é a contraface de tudo aquilo lá. O avesso do avesso do avesso  do avesso. Não, não será eloquente nem consciente do papel que representa; sequer vai perceber o quanto sua figura oriunda da grotesqueria causará impacto.


Sem dúvida, foi movido pelo oportunismo de embolsar uma boa nota no fim do mês. Se souber poupar, terá uma bela aposentadoria. 


Mas é importante a ascensão desse palhaço, não pelo que posse objetivamente fazer, mas como valor simbólico, como um tapa na cara dos bandidos de gravata, perfumados e podres. Ele viverá a farsa do poder como o escrachado, o malandro, o moleque, o Macunaíma se aproveitando da preguiça que enseba o plenário, os gabinetes, as farras, os roubos vestidos de decência.


No voto a Tiririca há uma forma de protesto bruto, regado a cachaça e a gritos de gol, galinha com farofa e arroto. Como Chacrinha, ele vem para confundir, não para explicar.

Agora, uma ligeira explicação a respeito da carnavalização. Visão que foge do senso comum a respeito do carnaval e da carnavalização diz o seguinte: 
1. Em seu livro, hoje clássico, e já traduzido para português, "Problemas da Poética de Dostoiewski", Mikhail Bakhtin lançou as bases da teoria crítica da carnavalização. 
 
Esta forma crítica de pesquisa veio dizer-nos que há textos literários que foram elaborados sob o signo da carnavalização. Esses textos mostram a cultura de um povo em seus efeitos cômicos e paródicos proporcionados pelo insconsciente social manifestados nos rituais de máscaras, no riso, na busca do grotesco, nas festas, nas orgias, no carnaval, nos rituais religiosos, etc. 

 
2. A carnavalização, segundo Bakhtin, pode ser um desvio e também uma inversão dos costumes consagrados, como fez a geração hippie, que sobrepôs o sacro e o profano, o velho e o novo, sem atender a certas normas de interdição social. A carnavalização é de alguma maneira o mundo às avessas e pode ter a leitura de uma parodização. 


3. A história nos mostra momentos de carnavalização. Esse mundo às avessas está na Idade Média, na pintura "O velho" de Breughel como na de Jerônimo Bosch e pode ser interpretado, conforme os casos, como desvio, como paródia, como estilização, como apropriação,como contra-estilo e até como contra-cultura, conforme já mostrou Affonso Romano Sant’Ana no capítulo "Carnavalização" do livro "Paródia, Paráfrase & Cia." publicado pela Ática, São Paulo(série Princípios), em 1985. 
 
O livro de Mikhail BAKHTIN, "Problemas da Poética de Dostoewski", saiu no Rio de Janeiro, pela Forense Universitária,em 1981. Quem estiver interessado na temática encontrará também em Nontgomery J. de VASCONCELOS, o capítulo "As funções da carnavalização na literatura”, inserida no livro "A Poética carnavalizada de Augusto dos Anjos". São Paulo, Editora Annablume, 1996, pp.29-50.Também Jorge SCHWARTZ, em "Um texto carnavalizado". In: Vanguarda e cosmopolitismo. São Paulo: Editora Perspectiva (Estudos 82),, 1983, pp.117-152, pode ajudar a pesquisa desta temática.

João Ferreira
outubro de 2001


2 comentários:

ana rita disse...

Até cheguei a pensar nisso. Entrei em contato com a assessoria dele em BSB. Imaginei-o de paletó, sem a sua dentadura, fazendo discurso no plenário... infelizmente o bufão que poderia ser diz por diversas vezes que lá dentro ele é sério, matando a intensidade do que poderia ter sido. Tiririca abriu mão do riso e murchou.. Faço doutorado em educação e estudo o riso na perspectiva de Bakhtin..a possibilidade de entrevistá-lo acompanhou-me por um tempo, mas eles n abriram a guarda, ainda que lhes dissesse que os motivos eram acadêmicos... Escrevi sobre como poderia usar o riso ao seu/nosso benefício...

ana rita disse...

Até cheguei a pensar nisso. Entrei em contato com a assessoria dele em BSB. Imaginei-o de paletó, sem a sua dentadura, fazendo discurso no plenário... infelizmente o bufão que poderia ser diz por diversas vezes que lá dentro ele é sério, matando a intensidade do que poderia ter sido. Tiririca abriu mão do riso e murchou.. Faço doutorado em educação e estudo o riso na perspectiva de Bakhtin..a possibilidade de entrevistá-lo acompanhou-me por um tempo, mas eles n abriram a guarda, ainda que lhes dissesse que os motivos eram acadêmicos... Escrevi sobre como poderia usar o riso ao seu/nosso benefício...