terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Povo marcado para morrer



“Nenhum governo
é bom para o povo”

Quem assistiu o documentário “Cabra marcado para morrer” - realizado em 1984 por Eduardo Coutinho para rememorar o assassinato do líder camponês João Pedro Teixeira, ocorrido em 1962 -, deve lembrar da cena em que um trabalhador rural, contemporâneo  do líder morto, afirma, ao falar de política: “Nenhum governo é bom para o povo”. 
 
http://www.folhapolitica.org/2013/12/hospitais-federais-do-rj-tem.html
A frase; rascante, desencantada, permeada por um pessimismo justificável e que deve ser levado em consideração, é plenamente aplicável à quadra histórica que vivemos: um governo que se diz “de esquerda” adota a paradoxal fórmula neoliberal sob a alegação de que esta será para atender de forma pragmática a necessidades urgentes. 

A questão é que o povo brasileiro, na campanha eleitoral, não tinha a quem apelar. Era escolher entre Aécio que certamente iria privatizar a universidade brasileira e a Petrobras, além de fazer tudo o que Dilma está perpetrando ou votar no governo do PT et caterva. Passada a eleição o Partido dos trabalhadores está se revelando ruim, mas talvez não tão perverso quanto o que seria o PSDB. Para usar uma parábola: o PT é o assaltante; o PSDB seria o latrocida. 

Mas este texto seria ingênuo se quisesse comparar o ruim com o péssimo, a mentira com o lesa-pátria, as alianças espúrias com alguma outra manifestação da malignidade política. O que tratarei aqui é de um perigoso, lamentável distanciamento do Estado ante a questão social. E tudo isso ocorrendo sob a alegação de racionalidade, parcimônia administrativa, controle de gastos, reforço de caixa da Previdência. 

A questão é que os aspectos administrativos, frios em si, decididos à luz de números, não leva em consideração as consequências humanas, a tragédia na casa dos desamparados, o olho arregalado do desempregado, a viúva sem a pensão, a lágrima na cara triste dos filhos. 

O governo, em sua suposta busca de equilíbrio de contas não busca seu reforço de caixa na taxação das grandes fortunas, na redução dos gastos com o funcionamento dos três Poderes, na seleção de prioridades: os estádios da Copa estão aí para comprovar tal destempero.

A realidade brasileira deixa bem claro que os partidos que aí estão representam menos o povo que certos segmentos, mais o capital que o salário. Partidos supostamente comprometidos com o social são tão insignificantes que valem mais pelo que simbolicamente dizem, acusam e apontam que por aquilo que efetivamente possam fazer.

Ante uma tal realidade precisamos de uma sociedade civil atuante, firme, decidida. Uma sociedade civil independente de partidos e reunida em torno de ideias, programa e ações de pressão. Precisamos esquecer o PT e todas as suas manobras e incoerências, jogar o PSDB à sarjeta e fazer surgir mobilizações novas, corajosas, com trabalho capilar de conscientização e preparação que necessariamente deverá alongar-se na estrada do tempo histórico. 

Acompanhei com serenidade a campanha eleitoral e já intuía que o novo mandato do PT desaguaria nisso que aí está: ou concede, ou não governa, ou capitula ou vai ao fundo. Para completar age com o pragmatismo do pensamento do capital financeiro: o lucro é sagrado, a fome é coisa para amanhã. 

E como nenhum governo é bom para o povo é bom ficar atento para o futuro. Enquanto isso deve a sociedade se mobilizar. A pressão sobre governo e parlamento deve ser constante e organizada em fóruns, debates, interpelações em praça pública. Ou a sociedade se organiza ou uns poucos vão se organizar para manter seus privilégios.