sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Oração da Bolsa - ou Vade Retro Mr. Dollar

Cara amiga,
Caro Amigo,

Dólar nosso que estais no Inferno,
maldito seja o teu nome.
Não venha a nós o vosso terror
nem seja feita a vossa vontade,
nem aqui, ou em parte alguma.

O pão nosso de cada dia,
não tomai.
Perdoai as dívidas que nunca fizemos,
assim como nós perdoamos tudo o que
nos tomastes.

Não nos deixeis cair na recessão,
mas livrai-nos do vosso Mal.
Amém.
Emanoel Barreto

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Os otários querem futebol

Cara Amiga,
Caro Amigo,

As notícias, as coisas de jornal, informam que "o Rio Grande do Norte segue firme como candidato para ser uma das sedes da Copa do Mundo de 2014. Na próxima semana, Natal receberá os técnicos que farão um levantamento das cidades que buscam sediar os jogos. Eles virão com objetivo de fazer um estudo que será finalizado no dia 14 de dezembro e que servirá de base para a escolha das cidades-sede."
O Estado brasileiro fará descomunal esforço para desperdiçar dinheiro público com a Copa do Mundo, em 2014. E isso, como se não tivéssemos problemas como o combate às drogas, uma rede de saúde lastimável, péssimos salários pagos a professores dos três níveis, defesa do meio ambiente, proteção à Amazônia, malha rodoviária em péssimo estado... Fiquemos por aqui.
No Rio Grande do Norte, estado riquíssimo, como se sabe, a farra com o dinheiro do contribuinte terá resultado inversamente proporcional às suntuosas instalações que a Fifa exigirá. Ou seja: quanto mais se gastar com futebol, menos haverá para fazer funcionar de verdade postos de saúde, escolas, aparelho policial, etc... etc... etc...
A desculpa será o surrado refrão de que a Copa incentivará o turismo e, por gravidade, outros segmentos da economia serão dinamizados. Balela. Uns poucos lucrarão com esses jogos e a população ficará segundo a lei do pão e circo.
Tolos das mais variadas espécies gritarão como loucos a cada gol, e se sentirão honrados em ser enganados. Na volta à casa, serão assaltados e reclamarão. Não terão esse direito: o dinheiro para o trabalho da polícia foi todo gasto com futebol, sob o aplauso daqueles mesmos bobos. Então: calaboca!
Espero que o Rio Grande do Norte não seja escolhido pela Fifa. Se mal temos dinheiro para dar aumento ao funcionalismo, de onde tiraremos recursos para gastar com bola?
Emanoel Barreto

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

A guerra do fogo

Cara Amiga,
Caro amigo,
O filme "A guerra do fogo", talvez você se lembre, é uma grande metáfora da condição humana, um magnífico trabalho poético. Em sua trama, a descoberta da solidariedade e a sobreposição do que hoje chamamos de amor, ao instinto básico de reprodução.
No final, uma cena belíssima, intrigante, instigante, desafiadora: ao fundo, bem distante, a noite que se derrama sobre o mundo é riscada por um pontinho de luz, na caverna onde o homem passou da hominização à humanização. Aquele pontinho de luz era o graphos, a escrita poética a nos mostrar o início da nossa aventura sobre a Terra: um ser frágil, dependente de um fogo tão imponderável e perigoso, quanto amigo e essencial.
Creio que você poderá encontrar essa produção numa videolocadora.
Da época tratada pelo filme até agora, passou-se um tempo incontável para os nossos pobres relógios. Relógios que só marcam horas, mas não registram os momentos humanos das horas, a ação trágica do homem; o tinir da espada, a explosão da bomba.
Talvez somente nos reste buscar uma caverna e sentirmo-nos como aquele pequeno grupo de homens e mulheres, perdidos naquele tempo: acender uma pequena chama e esperar.
Emanoel Barreto

terça-feira, 7 de outubro de 2008

A fera, o ferro e o ferido


Cara Amiga,
Caro Amigo,
Quem com fera fere, com ela será ferido.
Quem com sangue pinta, com ele será tingido.
Quem com erro anda, desterro é o seu destino.
Quem com ferro marca, de fera será chamado.
Quem as feras chama, no fogo será queimado.
Quem se envolve em lama, revolve seu próprio eu.
Quem do revólver saca, engole sua mesma bala.
Quem embala o ódio, tem como presente o gatilho.
Quem tem no presente a fera, o sangue e o desterro;
o fogo, a lama e o revólver, se envolve tanto em ódio,
que então um dia descobre: para sempre estivera morto.
Emanoel Barreto

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

A perfeição da desgraça

Cara Amiga,
Caro Amigo,


A eleição para prefeito de Natal resultou no que se esperava. A Câmara de Vereadores foi re-novada em 50 por cento. E la nave va...

No cenário profundo, uma crise se posta com a força de um tsuname. As elites financeiras, donas de tudo, brincaram demais com dinheiro. Venderam e compraram demais papéis podres e agora, se falharem as medidas que os governos tentam acionar, algum miserável no Brasil ou na Somália, ficará mais miserável. As elites financeiras, não tenha dúvida, sobreviverão; e continuarão maquinando planos para mais lucros, mais fome, mais desolação.

A irracionalidade que domina o mundo desde os tempos das mais antigas civilizações, arremete para mais insensatez, apoiada agora na sofisticação, aprimoramento e agudização da tecnologia, o que permite ao homem chegar à perfeição da desgraça.

Multidões sucumbem ao peso da ideologia e do fundamentalismo, religioso ou financeiro. Nunca a religião deu tanto lucro, jamais as armas renderam tanto. O desvario neoliberal apodera-se de tudo e de todos. Corpos e mentes obedecem docilmente.

E no silêncio grande das favelas e dos becos, surgem novos e novos famintos e bandidos; do mesmo modo que, no silêncio dos grandes escritórios de Wall Street, algum sorriso sarcástico comemora. A crise é só um susto para a síndrome de Tio Patinhas.
Emanoel Barreto