sexta-feira, 17 de novembro de 2006

Um livro lamentável

A atribuição de caracterícticas humanas a animais tem sido um recurso comum em histórias infantis ou livros didáticos, para divertir ou cumprir propósitos educacionais. Mas um livro lançado nos Estados Unidos está causando polêmica, por apresentar como gays dois pingüins machos que estão cuidando de um filhote.

Veja o que diz o Estadão online a respeito do assunto: "SHILOH, EUA - Um livro ilustrado sobre dois pingüins machos que criam um bebê pingüim teve uma recepção conturbada na cidade de Shiloh, que se preocupa com a disponibilidade do livro a estudantes do Ensino Primário, e com a relutância dos governantes em restringir a acesso à obra. As preocupações são as últimas envolvendo And Tango Makes Three, o livro infantil ilustrado baseado em uma história real de dois pingüins machos - Roy e Silo - do zoológico Central Park, em Nova York, que adotaram um ovo fertilizado e cuidaram do filhote como se fosse deles."

A matéria não traz o nome do autor ou autores do livro. Mas, quem o escreveu, certamente tem por único objetivo provocar polêmica, aproveitando-se de um acontecimento fortuito. A idéia é a de apresentar similaridade entre atitudes de animais e o comportamento humano, como se os animais, à maneira dos seres humanos, também tivessem tendências homossexuais e apresentassem afetividade entre seres do mesmo sexo.

Não questiono a orientação sexual dos humanos, que são livres para experienciar suas existências segundo seu livre arbítrio. Mas buscar atribuir às sociedades animais atitudes típicas dos humanos, socializadas ao longo do tempo e das mutações culturais, é apenas exploração barata, no melhor estilo dos jornais sensacionalistas.

Quem redigiu o livro acionou sem dúvida uma notável sensibilidade para polemizar, ao buscar verossimilhança entre homens e bichos. Há uns quinze anos a TV brasileira - não lembro qual canal, creio que foi a Globo - explorou algo parecido.

Num jardim zoólogico, um casal de macacos ocupava uma ilhazinha, bem próxima a outra, habitada por um macho solitário. Algum repórter mais atento percebeu que a macaca nadava de uma ilhota para a outra e cruzava com o macaco vizinho. Pronto: foi o suficiente para se dizer que a macaca estava "traindo" o "marido" e esse fato foi transformado em acontecimento noticioso, enfatizado ao longo de vários dias.

Não passou de vadiagem jornalística, um jornalismo mesquinho e explorador. A mesma lógica foi utilizada para a confecção do livro, que, como o jornal, é também um meio de comunicação de massa, se bem que com características bem diversas e objetivos diferentes da efemeridade das informações jornalísticas. Mas, em essência, enquando veículos, ambos são, tecnicamente, a mesma coisa.

Trata-se de uma exploração deplorável da inocência infantil. Entendo que seja uma forma de pedofilia sui generis. Espero que essa obra não seja traduzida para o português.

quinta-feira, 16 de novembro de 2006

Onde está Twiggy?

A imposição de padrões de beleza às mulheres é algo que não é novo, mas, nos últimos anos, tem se intensificado a um ponto que acontecem coisas como a morte da modelo Carolina Reston Macan, que morreu de anorexia aos 21 anos e 40 quilos. Tinha 1,74 m de altura. E muitas frustrações.

A questão de fundo é a criação no imaginário feminino de que para ser bonita é preciso ser magra a qualquer preço. E, de fundo mesmo, é isso o que move o mundo dos negócios da moda: o preço, o lucro, o dinheiro que as grandes empresas ganham às custas de meninas como essa. Além de não galgar a fama, ela ainda tinha de complementar sua minguada renda distribuindo panfletos que divulgavam uma boate.

A fatuidade, a futilidade, a exposição do lado externo do ser humano como objetivo de vida e essência do existir, formam o elemento-chave que movimenta as grandes empresas de moda e aprisionam em seu cárcere mental não apenas as que buscam aí profissão e sucesso, mas, de alguma maneira, as jovens de um modo geral, que consomem roupas, sapatos e bolsas.

Não houve nada de glamouroso na vida dessa jovem. E, não se engane, toda modelo está condenada ao esquecimento. Alguém aí ainda se lembra de Twiggy? Ou de Veruska? E Capucine, alguém me diz por onde anda?

terça-feira, 14 de novembro de 2006

Cárcere mental: a pior das prisões

A forma massiva como a publicidade e a propaganda utilizam suas mensagens para literalmente prender a atenção, seduzindo leitores, ouvintes e telespectadores tornou-se, com a sofisticação das tecnologias e da formulação de conteúdos de convencimento, uma forma virtual de prisão.

Coletividades formadas por milhões de pessoas, globalmente, atendem aos chamamentos e incorporam a seus comportamentos atitudes de consumo, seja de idéias ou de produtos. A própria idéia, de alguma forma, é um produto, já que manipulada pela indústria cultural. As campanhas políticas e os padres e pastores midiáticos são a prova disto.

As sociedades humanas, ao longo do tempo, entretanto, sempre conviveram com essa forma de prisão mental. Desde o tempo em que os humanos viviam em hordas, passando pelas Idades Antiga e Média, até hoje, as determinações e crenças sempre ditaram os comportamentos coletivos. Sacerdotes, líderes políticos e militares mobilizavam os povos em torno de suas pregações e convocações, mantendo em hegemonia um determinado status quo.

O grande perigo dos cárceres mentais de hoje, entretanto, é que, com a facilidade e velocidade da comunicação de massa, criou-se uma espécie de território invisível e vasto, quando, através de filmes, internet, TV e jornais, somos todos incluídos nessa fluida comunidade, participando da ordem geral: compre, siga, acredite, busque sua salvação.

E mesmo quando nossos filtros de percepção rejeitam a intenção manipuladora, guiados por valores interiores como moral ou convicções de ordem político-ideológica, aqueles que assim procedem são uma minoria. Desta forma, termina por prevalecer a lei do consumismo e da submissão aos ditames de quem se volta para o lucro; mesmo que às custas do sacrifício e da ilusão imposta a todos os que se curvam à ordem ditada pelas leis de mercado, que disseminam com eficácia falsas necessidades e comportamentos padronizados.

Objetivamente: quem compra aquele celular que até serve para telefonar, é in; quem não acompanha a onda, é out. O pior de tudo é o paradoxo: eu e você somos in. Afinal, é forçoso reconhecer, estamos inseridos na internet... É incrível, mas não é inverdade...

segunda-feira, 13 de novembro de 2006

Os deputados vão abocanhar mais 30 dinheiros: e todos os pilatos já lavaram as mãos

Os jornais estão anunciando: até o final de dezembro a Câmara dos Deputados deverá votar, e aprovar, aumento de 90 por cento dos vencimentos dos 513 deputados, que hoje recebem o básico de R$ 12.847, mas, com o reajuste, passarão a embolsar R$ 24.500.

Como os deputados têm, digamos assim, prebendas, agrados financeiros que o Legislativo lhes proporciona como verba de representação, auxílio moradia, auxílio correio e dinheiro para compra de passagens aéras, tudo somado, isso atualmente, chegamos ao total de R$ 51.647. Com o aumento do vencimento básico, essa quantia subirá ainda mais.

Um deputado vale isso? Será que essas pessoas trabalham tanto assim para receber tamanha remuneração? Detalhe: os deputados têm também dinheiro repassado para a contratação de assessorres, mas muitos desviam isso para seu próprio bolso. As informações foram colhidas na Folha de S. Paulo. Mais detalhe: essa renda mensal pode ser bastante aumentada caso o deputado ou deputada seja corrupto ou corrupta. E não são poucos, mas históricos, recentes e muitos os casos de parlamentares envolvidos com corrupção.

Aprovado o aumento, o Senado deverá seguir os passos da Câmara. No senado, seus integrantes somam 81 detentores de mandato. Tudo está sendo desenvolvido em surdina pelo presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP). É claro, o aliado do presidente Lula sabe que essas coisas de dinheiro devem ser tratadas com um certo sigilo, não?

Como resultado final e perverso de tudo isso, o aumento brasiliense descerá em cascata, atingindo Assembléias Legislativas e Câmaras Municipais de todo o País.

Enquanto isso, estamos todos sob o temor de que haja uma reforma previdenciária, que venha a prejudicar aposentados, além de uma reforma trabalhista, retirando direitos e conquistas históricas dos trabalhadores brasileiros, facilitando demissões, por exemplo.

O mais terrível de tudo, entretanto, é a constatação de que quem colocou esses homens e mulheres nos diversos níveis do Parlamento foi o povo brasileiro. Quer dizer: de alguma forma eles representam não apenas por delegação legítima do voto a cidadania nacional, mas, acima de tudo, a cultura nacional, o comportamento micro do brasileiro, em suas ações cotidianas em casa, no trabalho, na escola, na universidade.

Somos o país da Lei do Gérson, levar vantagem em tudo. E, sendo assim, não adianta pedir: "Pai, afasta de mim este cálice" - nós mesmos nos crucificamos. Nossos judas já ganharam seus trinta dinheiros e todos os nossos Pilatos, de há muito, já lavaram as suas mãos.