sábado, 27 de setembro de 2008

A Liberdade em busca de um beco

Caras Amigas,
Caros Amigos,

Na foto de Evandro Teixeira, fotógrafo velha-guarda do então grande JB, um momento do tempo, instante congelado da ditadura perseguindo quem queria a liberdade como coisa cotidiana.

Liberdade, direito portátil e feito para todos.

Entre o momento da foto, que, creio, foi feita em 1968, e o instante do agora, já se passaram muitos anos. A Liberdade virou afinal um direito portátil. Mas, atenção, essa é uma liberdade formal, prescrita nos códigos, prevista em lei.

Então, e o povo? O povo que aquele jovem perseguido representa tão bem, onde estará? Aquele jovem lutava pelos direitos, dentre eles o direito de votar, a liberdade de votar.

Bem, o povo, o povo ganhou o direito de votar, afinal. Melhor dizendo, ganhou o direito para votar, ou seja: ganhou a obrigação de votar nos mesmos nomes, com as mesmas promessas, os mesmos encantos de um futuro reluzente, uma era fabulosa, onde todos serão felizes e fim.

O que quero dizer? Digo que há uma diferença entre o direito de votar e o direito para votar. A primeira situação pressupõe, simplificando, uma sociedade democrática, o que inclui melhor divisão de renda, consciência de classe e uma sociedade civil atenta, esclarecida e atuante. A segunda, indica mesmo o que já disse: uma obrigação de comparecer às urnas.

Mais claramente, os que são candidatos não são eleitos; fazem-se eleger, o que é sutilmente diverso da primeira situação. E o povo, bem, o povo segue perseguido, em busca do próximo beco da história, onde possa parar e ofegar.
Emanoel Barreto

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Do gemido das ruas aos silêncios e sotaques



Caras Amigas,
Caros amigos,

A política tem um lado espetáculo. Desde a Grécia antiga, quando os chamados homens livres compareciam à praça para debater as questões da cidade a oratória, a argumentação, a eloqüência, os grandes gestos retóricos, já compunham o dado dramático, encenador-teatral da arte política.

O espetáculo, hoje mais que nunca, é parte da política. Na atual campanha pela prefeitura do Natal, duas candidatas se apresentam com favoritismo frente aos demais: Fátima Bezerra e Micarla de Sousa. Das duas, Micarla parece ser a que tem chances reais de vitória.

Dois aspectos, para isso, devem ser levados em conta: a questão da mídia, que favorece Micarla, e o esvaziamento do discurso contestador, que fora o referente ideológico maior de Fátima.

Surgida do movimento sindical dos professores, Fátima chegou à Assembléia Legislativa como um furacão. Ela era a voz das ruas, o gemido do povo, o grito crispado dizendo "Não!". Agora, integrante de uma coligação que tem a consistência de uma lâmina de cavaco-chinês, está irreconhecível.

Hoje, a Fátima furacão cedeu espaço a uma candidata que repete diariamente um rol de realizações do governo Lula, numa ladainha cansativa e desgastada, típica dos políticos tradicionais.

As mazelas sociais, seus malefícios, são agora postos por ela pelo seu lado B, ou seja: existem, mas estão sendo tratadas, mesmo que, em sã consciência, todos saibam que medidas pontuais não revertem a situação trágica do povo.

Fátima perdeu o discurso: eis a real face, o fato que explica a perda do poderio eleitoral de Fátima. Fátima silenciou a voz que nela palpitava. O furacão transformou-se em tempestade tropical, perdeu força e pode acabar como brisa ligeira, dessas que, aos finais de tarde, tocam docemente os corpos de veranistas afortunados.

Ninguém pode, de repente, renegar seu passado. Ninguém pode transformar-se de um instante para o outro, esse o problema.

Quanto a Micarla, sua visibilidade diária, sua eloqüência visual, estão dando conta do recado. Utilizando-se de um sotaque que nada tem de nordestino, estranhíssimo, convoca a seu favor simpatias e, certamente espera, votos.

Resultado: uma, por perda de identidade e outra, por assumir uma identidade de mídia, são personagens do nosso tempo, do tempo da sociedade do espetáculo.

Fátima, ao anunciar benesses, confia que o povo acreditará que a vida melhorou, só porque a televisão está dizendo; Micarla, ao prometer benesses afins, garante que não: ela é que trará as benesses - a televisão também está dizendo.

Enfim: a perda do discurso prejudicou Fátima; e ao incorporar um discurso de massa, Micarla ganha o que Fátima perdeu. Em ambas, o discurso vazio. O povo, bem, o povo, ora acredita, ora não.
Emanoel Barreto

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Os livros, esses bons amigos; os computadores, esses malucos que nos enlouquecem




Caras Amigas,

Caros Amigos,

Após, digamos, uma grande luta, consegui afinal recolocar o computador para funcionar. E cada vez mais me convenço do seguinte: essas máquinas têm uma espécie de vida. Quero dizer: algo como uma quase-vida.

Ao contrário dos livros, que são amigáveis, sensíveis ao toque das mãos e jamais faltam ao que deles esperamos, os computadores, não: são bichos bonitos, uma espécie de ave-do-paraíso, porém indócil e imprevisível. Quando menos se espera, eles nos enviam, como direi, uma mensagem dizendo que não obedecem. E pronto.

Livros são seres vivos bons e pacificados. Têm essência e consistência. Livros pensam. E a cada leitura, se for mesmo um bom livro, vocês podem navegar e navegar em suas páginas que, de alguma maneira, encontrão um novo encanto, um porto mais adiante, uma paisagem que a sensibilidade até então não habia percebido.

Quanto aos computadores, são como os pôneis dos tempos do correio a cavalo: intrépidos, impulsivos; corcoveiam em suas dunas digitais. E se o cavaleiro não for bom ou estiver distraído, pode, vejam só, ser destruído.

Anos e anos de pesquisa e trabalho podem ser levados para a zona etérea do disco ríogido e desaparecer em meio ao seu mar de informações. Então, adeus e só nos resta chorar. Se tanto.

Continuo amigo dos computadores, mas com saudade das velhas e boas máquinas de escrever. Quero ter sempre um por perto, mas sempre pronto para o próximo sobressalto. Espero que o mesmo se dê com vocês.
Emanoel Barreto

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Os computadores, esses seres estranhos


Caras Amigas,
Caros Amigos,

Problemas com o computador mantiveram-me afastado.
Computador, máquina fotográfica digital, laptop, carros também com sistemas eletrônicos no motor, GPS, palm-top... Cada vez mais dependemos da informática. Isso é bom, mas tem seu preço. O defeito no meu computaror foi no disco rígido, aliás, é no disco rígido.
O técnico virá mais tarde instalar um novo, mas deixou-me uma dúvida aterrorizante: teme pelo backup, pois o disco antigo pode estar com os arquivos corrompidos. Se isso se concretizar, toda a minha produção para a Universidade poderá estar perdida. Um trabalho de anos...

A informatização tem dessas coisas. Minha última esperança está no pen drive. Frente a isso, lembro-me das velhas e confiáveis máquinas de escrever. Tão antigas e tão boas: escreveu, estava ali, no papel. Pronto: seu trabalho, seu esforço, estava à mão, palpável e visível. Agora, não: é preciso tomar mil cuidados, cercar-se de precauções, caminhar num território virtual ao mesmo tempo maravilhoso e não totalmente confiável.

Chegamos ao tempo em que as máquinas de alguma forma fazem exigências. Seu mecanismo é algo volátil, bem diferente da troca de uma roda dentada ou um parafuso. Lidamos com o imaterial e o intocável, e a vida parece habitar esses estranhos seres que são os computadores.
Emanoel Barreto