sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

“Olhaí, pessoal, mais um ricaço está metido em apuros com a lei.”




A polícia 
midiática versus o garboso meliante


As constantes e espetaculosas operações da Polícia Federal no Brasil nos dão de alguma forma uma visão do que seja este país: algo que deveria ser apenas o cumprimento do dever legal é transformado em ação de mocinho, ato de heroísmo cívico. 

A questão também pode ser vista assim: a corrupção está tão entranhada em nossas práticas que, quando um bandido de luxo é preso a polícia quer surgir como merecedora de honras e vivas pois capturou alguém que vivia na impunidade, usurpando dinheiro que deveria ser usado em função social.

Digo que as ações são espetaculosas porque, ao ser deflagradas, já vêm com nome e marca para uso de mídia. Os jornalistas sabemos que, de tanto conviver com o noticiário e sabendo o impacto de agendamento que este implica junto à opinião pública, a fonte passa antecipadamente a adotar atitudes que se encaixam nos nossos padrões noticiosos. 

Como historicamente a imprensa costuma dar nomes a acontecimentos de grande repercussão como forma de melhor identificá-los, personaliza-los, digamos assim, a fonte – no caso a polícia – absorveu esse aspecto de nossas atividades e já carimba seus gestos funcionais com o peso apropriado à manchete do impresso ou à escalada da TV – escalada é aquela apresentação inicial, a abertura que os telejornais fazem ao enunciar seus principais assuntos. 

Acho que a Polícia Federal está fazendo um excelente trabalho ao capturar bandidos ricos, usufrutuários do poder, bem ao enfrentar os criminosos convencionais – traficantes de drogas, contrabandistas e quejandos.
Mas entendo que não seria necessário tal alarde como se fora para tirar proveito midiático da situação. 

A questão, porém, tem outro aspecto. É o seguinte: neste país a impunidade grassa e está imbricada à subcultura de valoração da esperteza e da safadagem; assim, quando se vê um banqueiro preso, um senador posto a ferros, um alto funcionário flagrado e levado ao cárcere isso transformou-se em algo digno de comemoração. 

E nada melhor, pelo lado da polícia, que trombetear mais uma operação-não-sei-o-quê. É como se os agentes estivessem dizendo: “Olhaí, pessoal, mais um ricaço está metido em apuros com a lei. E nós estamos no pedaço.”

Mas o espocar de fogos da polícia é o menor dos males. É preferível isso – bisonhamente preferível –, ao silêncio dos gabinetes onde discretamente se organizam as quadrilhas de gravata e se armam as tramoias mais sórdidas. 

OK pessoal, vamos botar na cadeia o garboso meliante.
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 Foto: http://www.otempo.com.br/cidades/pol%C3%ADcia-federal-divulga-a-extradi%C3%A7%C3%A3o-de-23-estrangeiros-durante-a-copa-1.880725