Vamos viver ao sol da Vida
Por Emanoel Barreto
Observando nossa vida em
perspectiva reversa, ou seja, olhando o nosso passado e o que fizemos ao longo
do percurso podemos perceber o quanto tudo se modificou depressa. Em nós e à
nossa volta tudo mudou muito rápido – talvez depressa demais, para desespero de
alguns.
A incapacidade de aceitar a impermanência
das coisas, a mutação silenciosa e implacável dos nossos corpos no
envelhecimento diário, o desfazimento de laços de afeto, a perda de bens
materiais, o fracasso de sonhos – só para citar alguns casos – tudo isso pode
trazer sofrimento e dor a quem não se preparou para perdas e mudanças que a imaturidade
de muitos entende como inaceitáveis.
A mutabilidade de tudo em direção
ao fim é o grande problema. Somos impotentes, não conseguimos impedir de mudar aquilo
que foi feito para se desfazer e finar.
O inverso desses apegos a coisas
e pessoas a quem desejamos ter a nosso lado diz respeito ao apego a coisas e
pessoas que nos fazem mal.
Refiro ao quanto é difícil nos
livrarmos do ódio a alguém, do ciúme de alguém, do medo do outro, da submissão ao
opressor – aqui não no plano ideológico, mas pessoal – da falta de atitude
frente àqueles que nos ferem ou ameaçam.
O apego à saudade, o acorrentar-se a
velhas ofensas, a insistência em não perdoar são formas terríveis e ilusórias de
experienciar nosso processo existencial na cotidianidade do pó que escorre na
ampulheta da vida. Pura perda de tempo.
Suspeito, todavia, que talvez seja
mais fácil superar a perda de alguém a quem amamos que nos desvencilharmos do ódio
pelo outro. O abraço ao ódio é terrível e faz mal, muito mais mal a quem o
sente do que àquele a quem é dirigido. Porque o ódio é vivido somente por quem
o interiorizou. É impossível fazê-lo chegar em essência ou toque corporal àquele que é alvo de tal sentimento.
O ódio é um sofrimento em vão. Mas, quanto apego existe por ele.
Essa valorização do negativo é mero
fruto de construções mentais. A pessoa passa a acreditar na importância do ódio
como objetivo de vida e no despeito como forma de compensação. O mesmo se diz da
inveja, da frustração, do sentimento de culpa por não ter atingido um certo propósito,
seja sucesso pessoal ou vingança a quem o magoou.
Tudo isso porém, analisado friamente,
revela-se como algo tolo e desnecessário, pueril e gerador de mais sofrimento aos
que têm no negativo seu referente e o carrega como coisa própria e essencial. Mas
esse sofrimento é passível e possível de superação. Basta refletir. Com método e
decisão é possível livrarmo-nos de tais situações e viver cada dia com consciência
de cada momento.
Viver passo a passo creio que
seja o melhor caminho para ficar em paz. A idade, para quem já envelheceu, deve
ser tida como resultado de todo um processo de vivências e aprendizados.
Se a idade nos sinaliza a
proximidade do ocaso não é preciso apegar-se à saudade. Mas sorrir às lembranças de
tudo o que nos fez chegar até onde chegamos e ao tudo que somos. Sem medo, sem
lamentar tempo perdido. Não há perda de tempo quando se soube viver ao sol da
Vida.