sábado, 1 de dezembro de 2007

Viver como os mortos

Caros Amigos,
O Estadão traz trechos de um pungente depoimento de Ingrid Betancuor, ex-candidata à presidência da Colômbia e hoje cativa dos narco-guerrilheiros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia-Farc. As declarações, na verdade um doloroso lamento escrito, mostram um ser humano abatido física e espiritualmente; uma pessoa que apenas pensa em existir, existir como existe uma pedra, um caco de vidro, no máximo uma planta. Ou, como ela diz na carta: os reféns "vivem como mortos".

O seqüestro e o cárcere privado são duas das mais cruéis formas de apoderamento que se tem sobre um ser humano, que é usado como moeda de troca entre um criminoso e, no caso, a sociedade. Não há respeito pela criatura em cativeiro. Ela é algo de serventia circunstancial. Em situação de emergência, poderá se eliminada sem qualquer sentimento de culpa por parte do matador. É o ser humano reduzido à condição de bem disponível.

Não dá para entender um grupo armado, que se diz a favor do povo, manter-se à custa da comercialização de cocaína. Entre eles não há nenhum Guevara; historicamente, não se postam condições para que surja uma nova Cuba; nada parece indicar que algum dia venham a assumir o Poder.

Não há dúvida de que as condições de vida do povo colombiano não são desejáveis e sejam inaceitáveis, tais os desníveis sociais ali encontrados. A Colômbia é um país estilhaçado por uma profunda crise sócio-econômica, a ação de grupos extremistas de direita e a presença dos narco-guerrilheiros.

Os reféns, resultado humano mais lamentável de tal situação, representam uma realidade triste, sombria, acabrunhante; uma manifestação do quanto a nossa degradação pode chegar. Imagine alguém preso ano após ano, sem ter culpa em qualquer crime, sem haver feito nada para merecer o isolamento. Respirando instantes, sorvendo momentos, buscando o fim de um tempo que não passa nunca.

A situação da Colômbia é um grito que não tem fim. E os loucos envolvidos em sua guerra vão se estraçalhar até o último chumbo. Aos demais, o sofrimento.
Emanoel Barreto

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

CPMF: que bom que caísse...

Caros Amigos,
Bilhetíssimo: o presidente Lula anda dizendo que "somente o DEM e os sonegadores" são contra a prorrogação da CPMF. Claro que não. Qualquer cidadão que sofra com esse imposto do cheque, que não é só do cheque, pois incide sobre qualquer movimentação financeira, está contra tal recolhimento. Não dá mais para suportar uma tamanha carga tributária, uma das maiores, senão a maior do mundo. A cobrança do imposto encurta o salário de muita gente, que fica com mês demais, a dinheiro de menos, para fazer frente às despesas. Vamos ver no que vai dar a votação. Torço pela queda da CPMF.
Emanoel Barreto

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

E foi assim? Sabia que eu não sabia?

Caros Amigos,
A governadora do Pará, Ana Júlia Carepa, acionou sua assessoria de imprensa para se desculpar, após o caso da menina que foi seviciada em uma cadeia onde ficou mais de um mês presa, entre 20 homens. Na edição de hoje da Folha de S. Paulo, na seção Tendências e Dabates, ela explica que herdou um Estado em condições que me pareceram falimentares, ao que ela diz, especialmente no setor de segurança pública.

No viés disso tudo utiliza, como argumento para a brutalidade sofrida pela criança, que as cadeias estão superlotadas, que há 12 anos não se faz concurso público para admissão de novos servidores setoriais, há um enorme rombo de déficit nesse segmento e mais isso, aquilo e aquilo outro.

Ou seja, seu antecessor, cruel e insensível - e deve ser mesmo -, legou-lhe uma herdade maldita, que ela não teve tempo, ainda - ainda? - de pelo menos tomar conhecimento, na plenitude, de suas condições molestas.

O argumento, velho e fácil, vem a calhar, ao lado das costumeiras promessas de "enérgicas providências" em favor de soluções para os dantescos problemas e - que gesto belo -, amparo à família da menina e dela mesma. Bom, quanto a isso, isso é o que vamos ver.

Mas, se o antecessor foi mesmo um arrasa-quarteirão e deixou o Estado à míngua, por que ela, que representa pretensamente a vanguarda do povo, é defensora dos direitos humanos, é feminista e batalhadora, vanguardeira e resoluta, não tomou a simples providência, ainda ao início do seu mandato, de instalar uma comissão para apurar a situação do quadro penitenciário do seu Estado? E, depois disso, promover reformas urgentes?

Simples assim? Simples assim. Só que não foi feito. A verdade é que a governadora somente tomou conhecimento dessa situação, que ao que parece não é pontual, através da imprensa. Daí o pânico, a vergonha, a necessidade de se arranjar uma desculpa de última hora, a demonstração de indignação, como se fora ela ainda uma opositora.

A indignação deveria ter sido demonstrada logo ao alvorecer do governo. Com a denúncia do estado de miséria e abandono das instituições. Com o flagrante de abusos. Agora, o discurso falsamente humanista somente revela a farsa improvisada e feia. O negócio é o seguinte: como o presidente Lula, ela também não sabia de nada...
Emanoel Barreto

terça-feira, 27 de novembro de 2007

A derrogação da Lei da Gravidade

Caros Amigos,
As coisas de jornal informam que a ONU colocou o Brasil entre os países que contam com um bom Índice de Desenvolvimento Humano. Custa-me crer que isso seja verdade. Somente algum malabarismo de cifras e estatísticas muito bem manipuladas poderia colocar nosso país em situação socialmente aceitável. Trata-se, estou convicto, de coisa de tecnocrata certamente sem conhecimento da realidade nacional.

É muito fácil, em números, desenhar-se uma dada situação, projetar circunstâncias favoráveis, enunciar feitos monumentais, prever-se a Terra Prometida. A situação brasileira, pela sua estrutura, pela sua conjuntura, não demonstra qualquer evolução social ampla e profunda, voltada para uma mudança de quadro em favor de uma alteração que melhore a vida do grande ser social que se conhece como povo.

Para que se tenha um bom IDH, é preciso que um país tenha uma realidade social, política e econômica de tal maneira dinamizada que, ao passar das gerações, molda uma situação propícia à reprodução de um círculo virtuoso - para usar expressão já meio desgastada -, que impulsione sempre em direção a melhores dias.

Não vejo assim o Brasil. Há, claro, um certo equilíbrio, em relação a quadrantes historicamente recentes, quando a inflação era a peça de resistência dos chargistas, que a representavam com a figura de um dragão. Isso, para tocar rapidamente em um aspecto da vida nacional.

Afora isso, não vejo qualquer mudança profunda na qualidade de vida do povo, ou, para falar o jargão oficial, no Índice de Desenvolvimento Humano, para cuja configuração exige-se o preenchimento de uma série de critérios envolvendo um real e bem qualificado padrão de vida.

Não é culpa do Governo Lula. Este é apenas mais um, no processo histórico em que transcorre a tragédia brasileira. A situação não está boa. Dizer o contrário é como querer derrogar a Lei da Gravidade por decreto.
Emanoel Barreto