sábado, 28 de agosto de 2010

O Pixador de volta


De volta: O Pixador

Anistia para Luiz, onde estiver
Walter Medeiros* - waltermedeiros@supercabo.com.br

A mulher com o "olhar no portão" sonhava, esperava, acreditava que um dia veria
chegar de volta o seu marido. Mas o tempo da sua vida não foi suficiente; ela morreu
e ele não voltou. Passou cerca de 28 anos esperando notícia do paradeiro do lutador
que foi preso em 1974 pelos órgãos de repressão do regime militar e nunca mais deram
informação sobre o seu verdadeiro destino. Assim, o ex-deputado Luís Maranhão Filho,
que teve seu mandato cassado, foi preso e entrou para a lista dos desaparecidos
políticos. Nunca voltou, para tristeza de Dona Odette.

O Estado brasileiro reconhece hoje que foi feito um mal à família daquele homem e
pede perdão de público. A Comissão de Anistia do Ministério da Justiça anistiou
aquele potiguar, juntamente com muitos outros que foram perseguidos, como Agnelo
Alves, Garibaldi Alves, Iaperi Araújo, Gileno Guanabara e Marcos Guerra. Eles
entraram no rol onde já estavam Glênio Sá, Meri Medeiros, Luciano Almeida, Cassiano
Arruda e outros. A cada julgamento, alguém afirma que é preciso lembrar sempre o que
ocorreu naquele período, para que não se esqueça e que para que tais fatos nunca
mais aconteçam.

A emoção era geral em cada canto da Assembléia Legislativa, onde foi descerrada uma
placa homenageando Luiz Maranhão. Seu sobrinho-neto, Haroldo Maranhão, fez um curto,
discurso emocionado, lembrando o que chamou de tempos de jeep. Explicou que teve um
jeep de brinquedo, com o qual se divertia muito. Era um brinquedo da época,
principalmente em Natal, resultado da movimentação da Segunda Guerra Mundial. Mas
depois apareceram para Haroldo os jeeps verdes, dos quais saíam homens de botas e
capacetes, naquele ambiente onde seu tio desapareceu. Depois ficou sabendo que ele
"foi levado para Recife, Fernando de Noronha, Rio de Janeiro, São Paulo e Nunca
Mais".


Num telão mostraram cenas do período da ditadura, que trouxeram de volta até aquele
cheiro de gás lacrimogêneo, mas também promoveram o reencontro de velhos sonhos,
conforme as palavras da vice-presidente da Comissão, Maria Aparecida Abelardo. Ela
mostra a importância de conhecer o passado e reconstituir a verdade através dos
processos de anistia, que acumulam histórias densas e intensas que o Brasil precisa
conhecer. Mais de 65 mil pessoas foram atingidas pelo regime militar.

Os chamados "anos de chumbo" vividos pelo Brasil entre 1964 e 1985 constituíram um
tempo atribulado, mas também - ao mesmo tempo - uma era de muita fibra, de muita
luta, de muita resistência no Rio Grande do Norte. Resistência à injustiça, à falta
de liberdade; resistência à solidão das noites nas quais ninguém podia nem devia
procurar notícias de alguns companheiros, para não desfalcar o movimento, pois as
movimentações poderiam terminar em prisões, em desaparecimentos ou mortes.

Naquele tempo, em Natal, os militantes tinham de possuir uma intuição muito aguçada,
para escolher em quem confiar, pois cada desconhecido podia ser um agente da
ditadura. A qualquer momento qualquer ativista podia ver-se diante de um fuzil, de
uma sala escura e de um inquisidor, determinado a descobrir até o que não sabia, mas
que achavam que devia saber. Todos viviam sobressaltados, pelo simples fato de
defender a liberdade, o direito ao habeas-corpus, o direito de votar para
Governador, Prefeito da capital e um terço do Senado.

A despeito de tudo aquilo, presenciávamos a cada momento gestos de coragem de
incontáveis militantes, destemidos democratas, resistentes cidadãos, que guardavam
aqueles livros que não podiam ser encontrados em nas casas dos militantes, o que
aumentava a certeza de que o dia anunciado por Vandré vinha vindo. Cada filme no
cinema de arte no cine Rio Grande era um grande ato democrático; cada música
executada nos diretórios acadêmicos era uma ascensão da luta; cada obra de arte
encenada era um impulso imenso para a derrocada do regime de exceção.

Quem optava por caminhar esses caminhos, findava marcado e perseguido. Naquele
quadro, cada um vivia a sua história e encontrava a face implacável do poder de
exceção, um poder desigual e injusto. Foram anos de solidão e aflição dos
interrogatórios, das acareações e dos assédios. Mas foram também dias de ânimo
cívico, têmpera revolucionária e coragem democrática. Uma luta ora aberta, ora
 solitária, ora clandestina, mas sempre no rumo de um amanhã, que seria outro dia,
como dizia Chico Buarque. O outro dia chegou. Estamos a vivê-lo. E é importante
fazer com que tudo aquilo tenha realmente valido à pena.
*Jornalista

O feliz menino que virou anão de duas corcundas, aleijado, porco e senador. Acha pouco?
Emanoel Barreto

O menino passeava pela Rua dos Mágicos quando foi abordado por um mágico.
-Parabéns - disse o Mágico. - Você acaba de pisar na pedra de calçamento de número 2.000.0000.1000.7000.777.999.000 e assim ganhou o direito a ter um milhão de bilhões de pedidos. Qual o primeiro?

- Pode ser para quando eu crescer?
- Claro - garantiu o mágico. - O quer ser quando crescer?
- Quero ser - pediu o menino - um anão? Anão pode?
- Obviamente.

Então o menino cresceu e se tornou um magnífico anão de dois metros de altura. Era portanto enorme e anão ao mesmo tempo.

- Posso pedir mais?
- Você ainda tem muitos pedidos. O que quer ser mais?

- Um aleijado.
- Ótima escolha. Um anão gigantesco e ainda por cima aleijado é uma grande escolha.

E o menino tornou-se anão e aleijado de uma perna ao mesmo tempo.
- E o que mais? - acrescentou o mágico.
- Quero uma corcunda. Mas bem grande.

E veio-lhe a preciosa corcunda.
- Agora, quero um espelho para me ver.
E apareceu o espelho. Disse o menino: - Estou ótimo. Posso ter duas corcundas?

- Tudo o que você pedir.

E ele ganhou uma corcunda em cima da outra corcunda.

Então o mágico indagou: - E emprego? Não quer um bom emprego?
- Quero, quero quero. Quero o meu emprego já.
- O que deseja?
- Trabalhar num banco. Um banco internacional. Melhor, transnacional. Banco transnacional pode?

- Pode sim. Qual emprego deseja no banco: diretor, presidente, caixa, officeboy, ASG, devedor inadimplente, passador de cheques sem fundos, empresário falido, lobista, especulador da bolsa, falsificador de dinheiro, desviador de dinheiro de fundos de velhinhas viúvas?

- Não. Num banco o melhor emprego é o de assaltante. Portanto, quero ser assaltante de banco.

E o menino tornou-se o maior assaltante de bancos do mundo. Era recebido por todos os donos de bancos com champanhe e canapés de caviar. Afinal, entre assaltantes de bancos e banqueiros a diferença é pouca. Assim, estavam, ele e os banqueiros, todos literalmente em casa.

- E o que mais? - quis saber o mágico.

- Aha! Agora quero algo muito importante.
- Diga.
- Quero ser uma bisteca suína.

E virou uma bisteca suína. Suculenta e muito cara. Feita de porco especial.
O mágico afinal perguntou: - Mais alguma coisa? Ainda tem milhões de pedidos.

- Não estou gostando de ser uma bisteca. Estou me sentindo, digamos assim, incompleto. Transforme-me num porco. Assim estarei completo. Mas, um detalhe: o porco deverá ser um porco anão de dois metros de altura, ser aleijado e ter duas corcundas.

E logo ele estava transformado na hedionda criatura que pedira.
- E então? Satisfeito?
- Ainda não?
- Não?
- Não.
- O que mais?
- Libero você de todos os pedidos restantes se você agora me garantir que, além de porco anão com dois metros de altura, aleijado e com duas corcundas, serei senador. Quero ser tudo isso e mais Senador. Isso e nada mais quero da vida.

E o mágico gritou Alakazan!
O menino virou então um senador. Foi eleito com mais de dez milhões de votos e o resto você está sentindo na pele.

Estudantes de Comunicação preparam jornal

Em reunião ontem com grupo de alunos de jornalismo decidimos a criação do Jornal Livre, uma produção impressa cuja iniciativa surgiu deles. A ideia é fazer isso mesmo que o título do jornal indica: um produto sem vínculos, independente de partidos, informativo e opinativo. Acima, foto da primeira reunião. Neste sábado-domingo darei mais detalhes. (EB)

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

 
 A montanha dos sete abutres e os mineiros chilenos
Emanoel Barreto

Em 30 de janeiro de 1925 no estado do Kentucky, EUA, o camponês Floyd Collins penetra na mina de Sand Cave, de instáveis condições de segurança, em busca de galerias que atraíssem turistas. Movimentando-se em situação perigosa, acaba por ficar com braços e pernas paralisados pelas rochas que se acumularam ao seu redor. Ele havia deslocado uma grande pedra que ao se mover propiciou o desastre.

Daquele dia a 16 de fevereiro ele ficou só, sem alimentação ou atendimento médico. As condições da época impediam qualquer auxílio efetivo, apesar das tentativas feitas para ajudá-lo. Homens meteram-se terra adentro, mas nada conseguiram fazer. Naquele dia de fevereiro, afinal, foi encontrado por equipe de salvamento.  Estava a pouco mais de 16 metros de profundidade. Morto.

Ao longo de todo o período formou-se grande ajundamento de imprensa. Mais de 1.200 jornais cobriam o fato, que transformou-se em espetáculo, com todas as manifestações negativas que esse tipo de cobertura suscita. O rádio também compareceu.

Um repórter, Skeets Miller, do Courier Journal, chegou bem perto dele e quase conseguiu retirá-lo. Do lado de fora da minha o uísque moonshine, de fabricação caseira, corria solto apesar da lei seca. Serviço religioso foi aprontado para pedir pela salvação daquele homem, "um cristão às voltas com o mal".

Enfim, todas as manifestações do senso comum, da solidariedade mística ao mais barato sensacionalismo, acorreu à pequena Cave City, local onde ficava a mina. A série de reportagens valeu a Miller o Pulitzer.

O episódio serviu de inspiração ao filme A montanha dos sete abutres, com Kirk Douglas no papel de um repórter inescrupuloso, que ao final se arrepende de seus métodos.

Qual a ligação entre aquele acontecimento ocorrido no primeiro quartel do século passado com a situação de hoje, vivida pelos mineiros no Chile? A primeira, claro, é a prisão de 33 homens no interior de uma mina, ou seja: a condição humana, lá e cá, que nos expõe aos riscos e misérias próprias do nosso existir.

A segunda diz respeito ao espetáculo; muito embora, pelo que sei nos noticiários, não se esteja organizando um carnaval, como no Kentucky. Modernos meios de comunicação apropriados para tais circunstâncias permitem-nos entrar em contato com os prisioneiros da tragédia; o que, para as famílias, é consolador.

De qualquer maneira há uma crescente expectativa, já que os homens somente deverão estar livres em novembro ou dezembro. Eles não sabem disso. A tragédia assume condições aflitivas. A situação é gravíssima, os trabalhadores estão em situação desalentadora: pelo menos dez quilos mais magros, têm diarreia e são alimentados aos poucos - cumprindo-se o que determinam especialistas em tais casos.

Estão a 688 metros de profundidade e experimentam sem dúvida sentimentos os mais terríveis: angústia deve ser o menor deles.

Temos com eles proximidade afetiva. De alguma forma alguma parte de nós está emparedada naquela mina de cobre no Chile.

O Pixador: e aí, Serra disse:

Lançada nova chapa à sucessão na UFRN

Professora Ângela Maria Paiva Cruz
Recebo e publico carta aberta de lançamento das candidaturas das professoras Ângela Maria Paiva Cruz a reitora e Maria de Fátima Freire de Melo Ximenes, vice. Coisas de Jornal está aberto à divulgação dessa e de outras chapas. (EB)

Novas conquistas
A UFRN avançando com você


Está deflagrado o processo sucessório para Reitor(a) e Vice-Reitor(a). Cabe à
Comunidade Universitária envolver-se efetivamente nas discussões acerca da UFRN do
presente e das diretrizes e ações estratégicas imprescindíveis à manutenção do
processo de crescimento e projeção da Nossa Universidade, tendo em vista a
construção da UFRN do futuro.


A atual gestão da UFRN termina o seu mandato em maio de 2011 conduzindo a
Universidade num contexto de crescimento e avanços, levando a Instituição a obter
respeito e reconhecimento da sociedade.


O amplo processo de crescimento da UFRN é notório em várias dimensões, o que pode
ser comprovado nas seguintes ações: ampliação do número de alunos de graduação e de
pós-graduação, de professores e de técnicos; construção de novas salas de aula e
laboratórios, bem como de novos espaços administrativos e de convivência;
implantação de novos modelos acadêmicos e formativos, com novos cursos na graduação
e pós-graduação; implementação de novos formatos organizativo-institucionais postos
em prática no campo da pesquisa e da extensão, apoiados pelo crescente número de
bolsas e apoios institucionais; criação de novos arranjos institucionais


estratégicos, como a Escola de Ciências e Tecnologia, a Secretaria de Educação a
Distância (a SEDIS), o Metrópole Digital, o Instituto Internacional de Neurociências
e o Instituto Internacional de Física.


Tais ações influíram positivamente nos índices de permanência e sucesso dos alunos e
trouxeram melhorias para docentes e técnicos no desempenho de suas atividades. Como
resultado de todo esse trabalho, a UFRN conquistou uma posição de destaque nacional
e internacional nas avaliações acadêmicas e, nos últimos anos, vem alcançando
progressivamente padrões superiores de excelência acadêmica.


Tudo isso decorre de estratégias e ações orientadas para a expansão e a melhoria de
qualidade das atividades acadêmicas; a ampliação, a qualificação e a capacitação dos
recursos humanos; o crescimento e a requalificação da assistência ao estudante; a
modernização e a democratização da gestão universitária; a expansão e a reforma da infraestrutura, com aquisição de equipamentos para os ambientes acadêmicos e administrativos.


Nós, que compomos a chapa Novas Conquistas, reafirmamos o compromisso de, nos
próximos quatro anos, consolidar as atuais conquistas e avançar no crescimento da
nossa Instituição, melhorando a qualidade das atividades acadêmicas, aperfeiçoando a
qualificação e a democratização da gestão universitária e ampliando a atenção à
qualidade de vida e às condições de trabalho dos nossos servidores.


É nossa meta trabalhar para que a nossa Universidade prossiga, de forma responsável
e inovadora, evoluindo no ensino de qualidade, nas ações de pesquisa, de extensão e
na área cultural, bem como dando respostas às necessidades do desenvolvimento da
sociedade norte-rio-grandense. Para isso, faz-se necessário intensificar e ampliar
cada vez mais a interação com as organizações e os movimentos sociais, com as
instituições públicas e os setores produtivos.


Em poucos meses, os docentes, os técnicos e os discentes terão a oportunidade de
decidir por uma gestão que reafirme a UFRN como instituição de ensino, pesquisa e
extensão de referência regional; que consolide o papel relevante da nossa
Universidade no contexto nacional e, além disso, promova sua inserção no cenário
acadêmico internacional. Por isso, queremos, desde já, lançar o convite para
construirmos coletivamente um programa de gestão adequado aos novos desafios da
Universidade na sociedade contemporânea.

Ângela Maria Paiva Cruz
Professora Associada - Departamento de Filosofia/CCHLA
Candidata a Reitora

Maria de Fátima Freire de Melo Ximenes
Professora Associada - Departamento de Microbiologia e Parasitologia/CB
Candidata a Vice-Reitora

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

O Pixador está de volta

Dilma já é, virtualmente, presidente eleita
Emanoel Barreto

Deu na Folha: A candidata do PT a presidente, Dilma Rousseff, manteve sua tendência de alta e foi a 49% das intenções de voto. Abriu 20 pontos de vantagem sobre seu principal adversário, José Serra, do PSDB, que está com 29%, segundo pesquisa Datafolha.



Realizado nos dias 23 e 24 com 10.948 entrevistas em todo o país, o levantamento também indica que Dilma lidera agora em segmentos antes redutos de Serra. A petista passou o tucano em São Paulo, no Rio Grande do Sul e no Paraná e entre os eleitores com maior faixa de renda.
...
A não ser que haja "fato novo" Dilma é virtualmente presidente eleita. Cristianizado pelos correligionários, Serra amarga, pesquisa após pesquisa, quedas de intenção de voto.
 
As pesquisas têm esse poder midiático: criar um clima de otimismo junto aos que são favorecidos por seus números e, mais que isso, funcionar como discurso não-pronunciado pelos que estão na frente.
 
As pesquisas "dizem" que candidato A ou B está ganhando, logo tal candidato é o melhor, já que cria consenso tendencial em torno de sua figura midiatizada. A onda dilmista tende a se espalhar e isso configura situação quase irreversível para Serra.
 
É esperar novas pesquisas.
Fotos de 18 dos 33 mineiros presos em galeria desde o dia  5 (Imagem Folha)

A proximidade afetiva
Emanoel Barreto

Chaplin dizia que "a vida é um fato local". Os acontecimentos que nos são próximos, aqueles que estão em nossa circunvizinhança, são valorados e tidos como importantes pelo fato mesmo de nos serem próximos espacialmente. Dizem respeito ao nosso lugar, à paisagem humana e física na qual transcorre a nossa cotidianidade, alentada pelo afeto que nos prende à sensação de estarmos imersos em território de bem-querer. O meu lugar é o meu mundo.

Todavia, acontecimentos distantes têm também potencial de atrair a nossa atenção pelo conteúdo humano neles depositato pelo nosso olhar. É o que costumo chamar de proximidade jornalística afetiva.

Tragédias, fatos que envolvam dor coletiva ou individual, acontecimentos pungentes, mesmo que espacialmente afastados conseguem despertar em nós o sentimento de solidariedade e isso os transforma em jornalisticamente noticiáveis, como é o caso dos mineiros chilenos e o terremoto no Haiti, o tsunami e o drama da mulher que pode ser apedrejada no Irã. Os exemplos são infindáveis.

O jornalismo tem sempre esse condão: é todo ele, mesmo no mais frio noticiário financeiro, movido pela emoção. Os mineiros encurralados nas entranhas da Terra, a débâcle da Bolsa de Nova Iorque, a apreensão de acionistas calculistas quanto ao futuro dos seus investimentos, tudo tem de alguma forma o envoltório da emoção, a preocupação, o temor existencial pelo futuro imediato ou longínquo.

No caso da proximidade afetiva esta se dá em função da sensação de participarmos da grande comunidade do Homem, a condição humana falível, instável, perigosa. Os mineiros, dizem as coisas de jornal -as notícias - somente deverão ser libertos, digamos assim, daqui a quatro meses.

Até lá haverá sempre uma corrente de expectativa, uma espécie de ansiedade social implorando que não morram de forma tão cruel. E o jornal é o precário hífen que nos prende a eles.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

O inquérito
Emanoel Barreto

Passava pela Rua dos Inquisidores quando foi abordado: - O que faz aqui?
Respondeu: - Estou andando.
O Inquisidor, como é próprio dos inquisidores, desconfiou de tão estranha resposta. E inquiriu: - Andando? Com que finalidade?

- Andar, apenas andar.
- Andar a esmo?
- Sim.
- Pode não. Andar a esmo é sinônimo de vadiagem. Assim, a partir deste momento considere-se preso - determinou o inquisidor.

Ele pensou um pouco e disse: - Mas preso, assim, sem inquérito nem nada?
- Ah!, reivindica seu direito a um inquérito? - objetou o inquisidor.
- Claro, todo cidadão tem direito a um inquérito - defendeu-se.

- Pois bem - continuou o inquisidor - democraticamente, terá o seu inquérito. E competente inquérito, diga-se de passagem. Inquéritos competentes são os melhores, sabia? É um privilégio ter direito a um competente inquérito.

Respondeu: - Muito obrigado. Posso ir então?
Inquisidor: - Claro que não. O inquérito vai começar. Direito a inquérito é como direito a voto: é direito, mas também é obrigação. Pronto para começar a responder?

- Já que não tem jeito...
- Não. Não tem jeito. Sendo assim, comecemos a qualificação do réu. Primeira pergunta: tem profissão?
- Tenho não: sou jornalista.
- Sabe ler e escrever?

- Claro que não.
- Ótimo. Muito bom. Jornalistas que não sabem ler nem escrever são os melhores. Quer ter direito ao uso de algemas?
- Claro, claro que quero. Se é um direito, exijo.
- Que conste no inquérido: o réu exige o direito a portar algemas. Pronto: já está algemado. Mais alguma coisa?
- Posso ser levado a cárcere secreto e ficar incomunicável?

- Sim, sim, sim. Claro que pode. Pronto: já está algemado e colocado em cárcere secreto e incomunicável. Tem mais alguma habilidade, além de não saber ler nem escrever?
- Sim.
- Qual?
- Surdo e mudo.
- Excelente. O senhor está me saindo melhor que a encomenda. Um réu de primeiríssima qualidade.

- E agora, posso me defender?
- Obviamente que não: defesa só por escrito ou sustentação oral. Como não escreve, não fala, não ouve, perdeu o direito de defesa.

- E se eu for cego, isso tem alguma vantagem? Juridicamente falando, quero dizer.
- Mas é claro que ser cego é uma vantagem. Não verá quando se aproximam os chicoteadores, uma divisão especial dos inquisidores.

- Ótimo. Como não vejo os chicoteadores, não vejo o senhor e nem mesmo sei onde estou, sinto que estou livre para continuar andando.

-Mas isso é vadiagem e o senhor volta à situação inicial.
- Volto não. Vadios  não param em lugar algum. É da nossa natureza. Obrigado, vou embora: redigir no meu jornal o que não sei escrever, contar o que não vi e escapar rapidamente. E sabe o que mais? Sabe qual a minha manchete?

- Não - respondeu atônito o inquisidor.

- A manchete será o seguinte: "Inquisidor inepto é enganado por cego que é mudo, mudo que é surdo e surdo que é jornalista que não sabe ler nem escrever". Destarte, não brinque com a imprensa, senhor. Só aparentemente somos fracos, surdos, mudos, cegos e analfabetos. Já pra casa. E, no caminho, compre o meu jornal.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

O Pixador ataca outra vez
Folha agora posa de porta-voz de Dilma
Emanoel Barreto

Quem diz, sem provar, é a Folha: A candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, já discute com auxiliares e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva medidas econômicas duras, sobretudo na área fiscal, para adotar no início de um eventual governo.



Segundo a Folha apurou, a intenção é repetir a estratégia do começo do governo Lula, em 2003, quando o novo presidente fez ajuste fiscal e monetário mais duro que o esperado pelo mercado.


A avaliação de Dilma e auxiliares é que esse ajuste não precisará ter a intensidade do adotado por Lula, porque ela herdará situação econômica melhor. No entanto, serão necessárias medidas para dar sinais mais concretos ao mercado de que a eventual gestão Dilma reduzirá o ritmo de gastos dos últimos dois anos do governo Lula.


As medidas em análise se concentram na área fiscal, mas há também estudo sobre a área monetária. A Folha apurou que uma medida será reduzir drasticamente a política de reajuste salarial para o funcionalismo público.
 
[...] Com a hipótese concreta de vitória no primeiro turno, apontada pela última pesquisa Datafolha, Dilma deixará claro que manterá o tripé da atual política econômica: câmbio flutuante, meta de inflação e superavit primário. Mas vai enfatizar cada vez mais em declarações públicas que não haverá descontrole das contas públicas. ...


A Folha faz anúncio antecipado de medidas que o futuro governo deverá pôr em prática. Sem citar fontes, a assetividade do jornal insinua que tudo isso já está sendo estudado; ou melhor, tramado.
 
Desta forma, no subtexto está dito que quem votar em Dilma estará apoiando as tais "medidas duras", especialmente aquelas que dizem respeito ao funcionalismo público.
 
Todavia, em nenhum momento o texto a cita como o declarante de tais medidas. Assim, como pode a folha ter certeza de que "Dilma deixará claro que manterá o tripé da atual política econômica: câmbio flutuante, meta de inflação e superavit primário. [E que vai ] enfatizar cada vez mais em declarações públicas que não haverá descontrole das contas públicas"?
 
Até agora a campanha dilmista sequer sinalizou tais aspectos. Até mesmo porque é admissível que em momento eleitoral não haveria tempo para tanto: ou se pensa em eleição ou se pensa em questões fiscais e monetárias.

A Folha agora é porta-voz de Dilma?
Ou será que a Folha pensa que com tais anúncios ainda pode ajudar a reverter a presuntiva derrota do seu candidato?