sábado, 10 de setembro de 2011

O empresário que quer vender lágrimas

Várias vezes já fui procurado por pessoas que me pediam opinião a respeito de projetos pessoais. Coisas tipo projeto de vida, sabe? Sempre questionei o motivo da minha escolha e todos me diziam: você é jornalista. Continuei sem entender, mas...

Pois bem: há muitos anos um cidadão que se considerava poeta procurou-me na redação onde eu trabalhava para que estimasse seu talento para ser publicitário, uma vez que, como dizia, era um sensível vate; assim, completava, teria meio caminho andado para ser uma brilhante mente criativo-publicitária.
"Você sabe, né? Sou poeta. Poeta, né? Então..."

Claro que, diante de tal argumento, não tive dúvidas em dizer que ele deveria assumir seu lado publicista e arcar com a responsabilidade de tentar vender bens, serviços e ideias. Pois bem: de outra feita, um rapaz apareceu e indagou-me o seguinte: ele poderia ser um grande escritor? Perguntei por que a dúvida. Respondeu-me que pensara em escrever um livro contando o sofrimento de uma jovem que queria ser freira mas o pai, ateu, não deixava. 

Ergui-me da cadeira e aplaudi de pé, dizendo que ali estava uma grande ideia para um livro estrondoso. Ele saiu e até hoje não consegui encontrar seu livro, embora sinceramente o tenha procurado em muitas livrarias. Hoje, afinal, fui procurado por um outro amigo, com pedido assemelhado aos dois exemplos: só que agora a coisa ficou mais séria: um cidadão veio à minha casa e disse-me que, diante do quadro instalado no Brasil, especialmente em Natal, quadro digno de lágrimas, resolveu botar uma fábrica exatamente disso: uma fábrica de lágrimas. Lágrimas vendidas em casa, lágrimas entregues em casa. Igualzinho a água mineral. Alegou que chegamos a situação insustentável. Concordei. A tendência é piorar.
Não tenho dúvidas. Já está piorando. Admito. Vai ficar pior. Não questiono.

Mas então, perguntei: o que tem a haver essa fábrica? Como poderá ter sucesso? Explicou: as pessoas já choraram tanto nesse Brasil de meu Deus, tanto na Natal de Nossa Senhora, que já não têm mais lágrimas. Como assim, não têm mais lágrimas? E ele insistiu: não têm mais lágrimas por causa disso mesmo que já falei: excesso de uso das lágrimas, extinção dos mananciais lacrimais. 

Resolvi fazer um teste: li notícia policial num jornal. A morte de um cidadão pobre por notório desordeiro. Fomos à casa, em arrabalde sofrido e lamentável, e aí constatei: as pessoas lamentavam, estavam em estado de pranto, olhos vermelhos mas não choravam. As pessoas haviam esgotado seu estoque de lágrimas.

Aí compreendi o sentido da expressão "vale de lágrimas" da Salve, Rainha. Lembra?: diz que estamos "vivendo e chorando neste vale de lágrimas". E então, virei-me para o futuro e vitorioso empresário e assegurei: "Amigo, abra já sua fábrica de lágrimas. Lágrimas a domicílio serão um sucesso."
Ministério Público quer gasolina mais barata em Natal

O Novo Jornal traz notícia alentadora: o Ministério Público deu entrada no Tribunal de Justiça a ação direta de inconstitucionalidade contra a lei dos postos aprovada pela Câmara Municipal. Ou seja: quer permitir que supermercados e empresas semelhantes possam fazer funcionar postos de gasolina em suas instalações. Com isso se espera que o cartel dos postos seja desfeito, passando a viger a lei do mercado: vende mais quem tiver o melhor preço.

Os empresários do setor estavam temerosos de se verem obrigados a se curvar ao determinsmo do que eles defendem: a concorrência, alma do capitalismo. Com a iniciativa do Ministério Público, caso venha a ser acatada pelo Tribunal, terão que tornar-se ágeis e competitivos, colocando seu serviço ao dispor da sociedade em vez da sociedade ao dispor do seu lucro.

A Câmara Municipal - matéria abaixo -, postou-se contra o interesse social ao derrubar projeto de lei que obrigava os empresários a curvar-se ante a lei do mercado. Estimando-se que a Justiça tenha bom senso e também compromisso com o natalense a lei será declarada inconstitucional, uma vez que os vereadores legislaram em área que não é da sua competência. 

O Novo Jornal diz também que os empresários do setor de postos irão reagir no plano jurídico caso se vejam na iminência de dobrar-se ao imperativo social. Espero que, no fim, prevaleça o interesse coletivo.