sábado, 16 de agosto de 2008

Caymmi foi pra Maracangalha...

Caras Amigas,
Caros Amigos,
E aí, calou-se a voz boa, o violão macio, as cordas amigas, acordes com cheiro de quadris e dengo; Gabriela, cravo e canela.

E aí, o coqueiro roçou a palha no anjo baiano e o vento das praias da Bahia chorou no velame das jangadas.

E tocaram todos os atabaques. Repicaram todos os agogôs e os terreiros da Bahia cantaram cantos de tempos negreiros.

Oxum, mulata e vênus, soltou seus cabelos e se enfeitou de conchas e perfumes, esperando ele. Os Orixás, todos, chamando por ele.

A Baía de Todos os Santos fez uma procissão de amor sagrado.

Iansã guardou seus raios. E Mãe Menininha do Gantois disse "meu filho, venha."

E Caymmi partiu.
Caymmi foi pra Maracangalha...
Emanoel Barreto

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Abaixo as algemas

Caras Amigas,
Caros Amigos,
A polícia está proibida de algemar bandidos, sejam eles bandidos digamos, convencionais, ou similares de colarinho branco. A exceção é se algum deles oferecer resistência ou perigo.

Talvez num país de bandidos educados, bandidos de alto nível de escolaridade criminal, isso tivesse razão de ser. Mas, convenhamos, o mundo ainda nao evoluiu para o crime charmoso, tipo
"Sr. Policial, eu vou ser preso? "
"Sim, vai, mas, por favor, sente-se no banco de trás. Aceita um drinque?"
"Só de for chmpanhe de boa safra..."
"Não seja por isso... pode beber."

Na verdade, todo crime, mesmo o de colarinho branco, tem algo, sim, de brutal, agressivo, ofensor. Não vejo motivo para a proibição do uso de algemas. Especialmente para aqueles infratores especiais, voces sabem, gente da elite. Eles são tão ou mais perigosos que o assaltante que trucida sua vítima ou o traficante que vicia um menino de quinze anos.

São mais perigosos porque seus crimes têm resultados morais e sociais largos, históricos e profundos. Ocultos sob os papéis que forjam e os paraísos fiscais que freqüentam, vergam ao peso do sofrimento milhares de vidas que tiveram retiradas de si serviços e assistência do Estado, já que o dinheiro vazou para os cofres desses criminosos.

O usos de algemas em criminosos ricos tem um poder de discurso fulminante, advertindo que, pelo menos com a Polícia Federal (a mais visada pela legislação que impede o uso de algemas), não há distinção de classe.
Emanoel Barreto

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Dinheiro não leva desaforo; você, sim. E calado

Caras Amigas,
Caros Amigos,
Um anúncio no Estadão Online chamou-me a atenção. Diz assim: "Dinheiro não leva desaforo", e aí entra uma mensagem de vendas, que não acessei. O que me interessou foi mesmo o fato da assertiva, sua atitude imperativa, atribuindo ao dinheiro personalidade, presença e força, como se fosse algo vivo, um alguém, um ser superior ao homem, de quem "não levaria desaforo".

E o pior é que humanidade, que criou o dinheiro como elemento comum de troca de mercadorias e serviços, acabou por atribuir a essa sua invenção uma espécie de essência, uma vida estranha e desumana, mas forte o suficiente para interferir na humanidade enquanto ser coletivo.

Então, saibam: dinheiro não leva desaforo; o dinheiro é um aliado das elites, sua carteira de identidade, seu passaporte para o prazer e para a exploração; seu espelho e seu destino.

Quanto aos demais, os demais são os demais... Eles sim, levam desaforo, pagam o pato, pagam a conta, pagam a dívida, pagam a prestação, pagam água, luz, supermercado e fazem uma força danada para dar aos filhos um ensino de melhor qualidade.

Os demais, esses sim, recebem o desaforo da vida e vêem, calados, o estalar do tapa e ainda têm de apresentar a outra face.
Emanoel Barreto

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Feliz, o humorista triste


Caras Amigas,
Caros Amigos,
Acabrunhado, com um câncer no intestino, desempregado e, é lamentável, infeliz, morreu o homorista Feliz, que durante anos foi o homem do tempo no programa Aqui Agora, SBT. As coisas de jornal dizem que ele chegou a pedir emprego a Sílvio Santos, mas não foi atendido.
Celebrizou-se pelo bordão "Piriri, pororó", sempre que terminava o anúncio da previsão do tempo. Mesmo com o câncer, seu fim foi determinado pela depressão. Desempregado, sem perspectivas no mercado de trabalho, Feliz, de 70 anos, viu-se perdido no cipoal da angústia e murchou como uma plantinha que não mais tinha o seu sol.
O mundo da TV, da comunicação de um modo geral é assim: fez hoje, fez muito, fez tudo; mas tudo isso é nada para a implacável gestão desse negócio, centrado num emaranhado de concepções subjetivas das gerências que, ironicamente para ele, visam apenas o aqui e o agora.
E quando ele parte, continua aqui a velha vida, cheia de faíscas e tempestades, raios, trovões e pouco céu-de-brigadeiro. Infelizmente.
Emanoel Barreto