sábado, 11 de julho de 2015

Meu aeroplano, uma viagem

Uma aventura em África: a mulher e seu elefante

Já disse neste coranto que tenho um avião, um biplano da Primeira Guerra Mundial. Preciosa máquina, ágil como uma garça em voo, tornou-se um grande parceiro que comigo compartilha momentos, horas, vida. Como Natal é o ponto mais próximo da África, e como tenho longeva admiração por aquele continente, costumo atirar-me até lá, em voos que a licença poética me permite dizer que  duram meia hora, meia hora de alegria sobre mar reluzente.
http://www.google.com.br/search?q=mulher%20africana&oe=utf-8&rls=org.mozilla


Então, na travessia, vejo transatlânticos pesados, lerdos como arcas, passando ao lado de embarcações pequenas e corajosas. Observo grandes sombras afundadas se deslocando em meio a mar mítico e assombroso em sua plenitude de água. Imagino que sejam grandes monstros, os monstros que habitavam os mares tenebrosos, tão temidos pelos antigos navegantes.


Chegando à África passo a costear o continente. Grande, largo, misterioso, habitado por fauna primeva e basal, paraíso bruto, aquele mundo sempre me atraiu. Voando baixo, costeio suas bordas. Ali estão pessoas, pescadores chegando da luta, e, lá adiante, depois de muito voar, chego a praias desérticas, ausentes da presença humana, mas habitadas vez por outra por animais que estranhamente ali se chegam.


Elefantes e leões, por mais paradoxal que possa parecer, caminham aquelas paragens vazias de homens. Devo dizer que, de tanto viajar à África, de viajar a África, desenvolvi notável perícia em aterrissar em terreno tão difícil e hostil. Jamais enterrei as rodas na areia. Se isso acontecesse haveria desastre brutal e, em caso de fugir ao ataque de feras, jamais o conseguiria.


Ontem, quando por lá estive, parei numa praia bela, bela de uma beleza grande, agressiva e árida, intensa e desafiadora. Estava eu na companhia abençoada de um maço de cigarros e de uma garrafa de bourbon, aquela sagrada bebida do Kantucky. Amparado do sol por um coqueiro de somba bondosa e balouçante, fiquei a admirar a paisagem em que estava imerso.


De repente, saindo das verdejantes brenhas, sai um elefante. Imponente ser vivo, grandioso e forte. Presas do mais puro marfim. A segui-lo, minutos após, uma núbia. Mulher de grande porte, seios opulentos, ancas suntuosas, coxas de Salomé, vértice fêmeo delicioso. Caminhou atrás do portentoso animal e gritou-lhe algo, uma ordem, coisa assim. Tão logo ouviu o grito primal o bicho ergueu-se nas patas traseiras e barriu poderosamente. Escultura imensa recortada contra o céu.


Devo dizer que jamais vi cena igual: dois seres básicos, plenos de beleza bárbara e grandiosa, convivendo momento indescritível. Acho que até o sol parou para homenagear. Em seguida, num salto ágil e preciso, ela agarrou-se à orelha esquerda do animal e postou-se escanchada naquela besta formidável. 

Depois gritou nova ordem. O elefante apressou o passo, virou-se e entrou na floresta novamente. Corri para o meu avião, liguei o motor e sobrevoei aquela cena. Ela viu o avião que subia, fez um gesto ao elefante e ambos desapareceram para sempre da minha vista, encobertos pelas ramagens altas da floresta densa.