sábado, 1 de setembro de 2007

Oração para aviadores

Caros Amigos,
"Oração para aviadores" é poema de Manuel Bandeira. E bastante atual para os tempos de hoje em dia. Bom final de semana.

Santa Clara, clareai
Estes ares.
Dai-nos ventos regulares,de feição.

Estes mares, estes ares
Clareai.
Santa Clara, dai-nos sol.
Se baixar a cerração,
Alumiai
Meus olhos na cerração.

Estes montes e horizontes
Clareai.
Santa Clara, no mau tempo
Sustentai
Nossas asas.
A salvo de árvores, casas,
E penedos, nossas asas
Governai.

Santa Clara, clareai.
Afastai
Todo risco.
Por amor de S. Francisco,
Vosso mestre, nosso pai,
Santa Clara, todo risco
Dissipai.

Santa Clara, clareai

sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Caros Amigos,
algumas notinhas rápidas:
  • Continua o deplorável combate entre Renan Calheiros, seus iguais e uns outros tantos, contra aqueles que querem ver valer a moralidade, com a cassação do político alagoano. Tristes tempos, pobre povo, que tem no senado um homem tão enormemente baixo em termos de estatura moral.
  • O Supremo, após a grande lição de considerar réus os 40 do mensalão, deixa vazar que seus membros votaram "com a faca no pescoço", ante a pressão da imprensa. Discordo. A pressão dos jornais não foi exatamente dos jornais: estes, de algum modo, refletem a insatisfação nacional com o lodoso terreno em que se move a política brasileira. E como, afinal, saiu uma decisão que coloca corruptos na condição de réus, houve festejos em cada cidadão digno desse nome. A imprensa cumpriu o seu papel.
  • E as coisas de jornal informam que na China havia um elefante viciado em heroína, que lhe era administrada pelos seus tratadores, juntamente com a comida. Assim, o animal liderava a manada para onde os tratadores quisessem. Autoridades florestais tomaram conhecimento, apreenderam o animal e o trataram durante um ano. Agora, o elefante está prestes a ser devolvido à floresta. Pobre mundo, em que pessoas se dedicam a drogar um animal para que ele atenda aos seus comandos. Pobre mundo, pobre mundo...

Emanoel Barreto

quinta-feira, 30 de agosto de 2007

Um ciúme muçulmano

Tinha da Mulher um ciúme muçulmano. Um ciúme feito de lençol. Fino e enlaçante como um abraço no silêncio cúmplice da noite. Noite de largo plenilúnio. Um ciúme delicado, tecido ao longo das páginas de um pergaminho construído de tempo. Tinha da Mulher um ciúme muçulmano. Daqueles que são feitos de aparições contínuas. Um ciúme namorado, diferente, protetor como uma tenda. Oásis.

Tinha da Mulher um ciúme muçulmano. Um ciúme que não segue os passos, porque já conhece e confia em todos os caminhos. Às vezes ficava parado, sentado à sombra de uma palmeira marroquina, observando o caminhar das caravanas que seguem caminhos feitos de distante.

A Mulher era feita de princesa e paz, gestos no ar fino da manhã de aurora. Depois, Ela se compunha, feita de acordes. Acordes em perfeito maior. O estranho naquele Casal era o seu silêncio calmo. Um silêncio que seguia sempre. E surgia nas curvas da vida como um momento que não tem minutos, como um instante que não tem segundos. A pausa do violino que espera um lá. Gesto de maestro que virou semínimas.

Para o Casal o tempo não passava, pois seu todo tempo era eternidade e eternidade é um tempo sem fim. Como nave grega que procura Ítaca. A Mulher, menina, estava companheira. Fazia-se de tarde, quando se queria noite; sentia-se manhã, quando se queria dia. Um dia inteiro, permanente instante. E o sol, amigo, só tinha estrelas. Como se fosse lua, crisálida de luar.
Emanoel Barreto

quarta-feira, 29 de agosto de 2007

Só Ali Babá reuniu tantos...

Caros Amigos,
Quando criança, eu ouvia na Rádio Rural de Natal, aos domingos, um programa infantil que repetia inevitavelmente as mesmas histórias. Uma delas era a de Ali Babá e os quarenta ladrões. Os bandidos tinham até uma musiquinha, uma espécie de hino. Era assim: "Nós somos ao todo quarenta/Quarenta famosos ladrões/Roubar o ouro não contenta/Nós só queremos milhões."

E agora nos chegam os 40 mensaleiros, colocados agora na condição de réus pelo Supremo Tribunal Federal. Não são poucos corruptos. São quarenta homens e mulheres, todos ricaços ou quase isso, poderosos e influentes. Quarenta indivíduos com notável poder de fogo jurídico para se defender.

Advogados caríssimos ganharão milhões ao longo da causa que no mínimo se arrastará por três anos, dizem as coisas de jornal. Acho que isso vai durar muito mais tempo. E temo que nenhum seja preso. Pelo menos, com a atitude do STF, levantou-se a ponta do tapete da impunidade. Espera-se que todo o tapete seja levantado, descobrindo-se toda a sujeira que estava jogada embaixo.

Mas, como no mundo da fantasia infantil havia tapetes mágicos, os quarenta famosos bem poderão achar o seu e sair, airosamente, voando ante os nossos olhos estarrecidos... O Brasil não muda assim tão fácil.
Emanoel Barreto

terça-feira, 28 de agosto de 2007

Os barcos mortos

Caros Amigos,
Uma lembrança de Natal.

Os barcos mortos

Trágicos em seu silêncio de madeira triste,
os barcos mortos do Potengi
são relembranças de marés em preamar.

Grandes corpos de madeira que sofre,

seus corpos se vão.
E seguem parados,
sem vela ou navegador.

Quantas vezes se fizeram ao mar,

quantas vezes se apressaram no confronto com ondas.
E de todas as batalhas corsárias de que participaram,
voltaram sob a bandeira da vitória.

Pescadores, corajosos,

enfrentaram tempos,
bateram milhas,
superaram noites.
E agora, guerreiros esquecidos,
sucumbem ao silêncio do frio.

E ninguém, ninguém,

se lembra de que lutaram tanto.
Emanoel Barreto