Os que vão morrer te saúdam
Prepara-se o país para a festiva tragédia da Copa do Mundo.
De um lado o governo, os partidos políticos, os interesses da Fifa que nos trouxeram
o mal-afortunado evento; do outro, manifestações de sociedade civil gritando,
protestando, exibindo o flagrante erro que é a realização do torneio.
Ninguém em sã consciência pensará que tudo acontecerá
às mil maravilhas. Mesmo os mais temerários, irresponsáveis, inconsequentes,
devem estar sentindo que estamos às vésperas de ver as ruas a rugir. A questão
é que não dá mais para recuar: já está tudo definido; agora é entrar na arena
do asfalto e dizer como os gladiadores em Roma: “Ave Imperator, morituri te
salutant.”
A
tradução clássica da frase latina é: “Ave César, os que vão morrer te saúdam.”
Sim, é isso: a arena das ruas terá o drama, enquanto as arenas decoradas e
assépticas verão o festim dos gritos de gol.
Tudo tão trágico, tão
terrível, tão previsível. Tragicamente perfeita a trama histórica, o conflito
de interesses, a desavença entre o que a sociedade quer e precisa e o que os
interesses minoritários levaram a efeito.
Os que vão morrer, de
alguma forma morrer em desencanto, em repúdio, em indignação, já avisam que
haverá resistência e lamentosas procissões, gritos e sufocação à força de gás
lacrimogêneo. E, de forma soturna, saúdam a sombria alegria daqueles que desencadearam toda a
intentona.