sábado, 16 de dezembro de 2006

O escárnio dos deputados: os lobos atacam o dinheiro do povo

A Folha on line publicou: "Em pouco mais de 15 horas, desde as 20h de ontem, mais de 1.100 leitores enviaram e-mails para a Folha Online opinando sobre a decisão dos parlamentares de reajustarem os próprios salários em 90,7% a partir de fevereiro de 2007. Eles passarão a ganhar R$ 24,5 mil mensais.A maioria esmagadora das mensagens revela indignação, revolta e também sensação de impotência do cidadão comum diante da decisão dos políticos, que é tomada como uma espécie de escárnio. O aumento vai ampliar os gastos públicos em R$ 1,6 bilhão no próximo ano."

O jornal anunciou também: "O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta sexta-feira (ontem) que o aumento dos salários dos deputados e senadores para R$ 24.500 não vai produzir efeito cascata no funcionalismo público federal. "Não vai ter efeito cascata, pode ficar certo disso porque não vamos abrir mão da nossa responsabilidade de manter uma política fiscal com o desejo que temos de crescimento", disse.Apesar da declaração de Lula, Assembléias de vários Estados já estão programando o aumento dos deputados estaduais. Esse é o caso da Assembléia Legislativa de São Paulo. Em Brasília, os deputados distritais também querem auto-reajustar seus salários.Lula disse acreditar que os presidentes da Câmara e do Senado, Aldo Rebelo (PC do B-SP) e Renan Calheiros (PMDB-AL), autorizaram o aumento porque sabem que o Orçamento do Congresso Nacional poderá absorver os impactos do reajuste. "Eu acho que o país comporta [o reajuste] se o país tiver crescendo a economia, se o país estiver rico. Agora, como os dois presidentes conhecem os seus orçamentos, eles sabem se dá ou não para dar", afirmou."

Os deputados, com esse aumento estratosférico, escarnecem, tripudiam sobre o povo e ainda se apresentam como representantes do povo. Os políticos brasileiros formam uma espécie sui generis de casta que se autopreserva: mesmo sabendo a temporariedade do mandato, o político cumpre à risca os ditames da ideologia que perpassa esse estamento e, mesmo aqueles que não se reelegem, criam as condições perversas para que seus sucessores cevem seus apetites monetários mais baixos às custas de um povo que sobrevive com um salário mínimo de 350 reais.

Para completar, o presidente Lula diz que o aumento não terá repercussões no funcionalismo público: é claro que não. Aumento de servidor não está atrelado a aumento de deputado. O efeito se datá nos segmentos políticos localizados nas assemléias legislativas, cujas remunerações parlamentares estão vinculadas à da câmara federal. Câmaras de vereadores também engordarão o pagamento de seus integrantes, dependendo do tamanho do município. É uma farra com o dinheiro do contribuinte, é um acinte à pobreza do povo brasileiro.

E o presidente ainda tem a desfaçatez de afirmar que os presidentes da câmara e do senado (que também autorizou aumento para os seus pares) sabem o que estão fazendo. Sabem, sabem sim: sabem que vão ganhar muito dinheiro, que vão manter o povo encurvado ao peso de seus baixos salários e que, por isso mesmo, poderão prometer muito na próxima eleição. O povo vai votar e... não vai acontecer nada. A não ser um novo e escandaloso aumento de remuneração disso que se chama de classe política.

sexta-feira, 15 de dezembro de 2006

Foi-se o grande homem dos concertos sanfônicos

Com a morte de Sivuca desaparece mais um grande sanfoneiro. Há muitos anos foi-se Luiz Gonzaga, mais recentemente Mário Zan, e agora o grande Severino Dias de Oliveira, aos 76 anos.

Músico de capacidade e talento, fez carreira internacional. Foi diretor musical de Miriam Makeeba. Lembra-se de Pata-pata, sucessão nos anos 60? Era ele quem dirigia a encapetada cantora. Foi ele quem criou uma orquestra sanfônica, grande espetáculo de força e paixão musical.

A morte de grandes artistas, nos dias atuais, em que o lado comercial tem grande prevalência na música, sinaliza para uma preocupação: até que ponto os interesses da grande mídia musical tem condições de impedir o surgimento de talentos de valor, favorecendo grupos e cantores descartáveis?

Trata-se, na verdade, de um processo perverso, que fideliza, ou melhor, vicia, um certo tipo de público, definido com bastante precisão por pesquisas e estudos de recepção de mensagens de massa, cujo perfil torna-se assim bem delineado e apto a comprar coisas como a "Egüinha Pocotó", somente para citar um exemplo.

Por trás de tudo, interesses comerciais que não têm qualquer compromisso com a cultura, o respeito às artes, o respeito até mesmo à pessoa humana, já que o consumidor é visto e tratado apenas como alguém apto a comprar, a curvar-se a modismos e vulgaridades.

Sivuca, a quem conheci em Natal após um show, marcou um período de criatividade e consolidação da música nordestina. Que faça uma grande festa com seu Luiz e Mário Zan.

quinta-feira, 14 de dezembro de 2006

Pimenta nos olhos da Justiça

O jornalista Pimenta Neves, ex-editor do Estadão, assassino da sua colega e namorada Sandra Gomide em agosto de 2000, agora está na condição de foragido. Ele fora condenado pelo corpo de jurados, mas, mesmo assim, colocado em liberdade logo em seguida, pelo juiz que presidia o júri. Ou seja: somente depois desse tempo todo, a Justiça percebeu que havia posto em liberdade um criminoso frio, calculista e cruel. E agora, está acionando o aparelho policial para a sua captura.

Enquanto isso, a mãe da jornalista, Leonilda Gomide, sofre com sérios problemas psiquiátricos. Está internada em uma clínida em Santos, onde alterna fases em que acredita que a filha está viva, com etapas de sanidade. O pai, também um homem doente, sofre com tudo isso.

E Pimenta, alheio ao sofrimento que causou, continuava desfrutando total tranqüilidade, até que afinal foi decretada a sua prisão. São casos assim que fazem do nosso País uma espécie de circo de horrores; horrores que nos cercam e que de alguma forma ameaçam a qualquer um de nós, que pode entrar no espetáculo da agressão e do desamparo a qualquer momento.

A conclusão é triste, surreal e absurda: Pimenta nos olhos da Justiça não é refresco para o cidadão. Data vênia.

quarta-feira, 13 de dezembro de 2006

O Vietnã voltou. E os americanos não querem acreditar

O Estadão online traz a seguinte matéria: "Heróis são necessários para se sentir em casa. Este é o cerne da revista em quadrinhos The New Avengers - Letters Home. Numa revista que se confunde com a própria mensagem, ela mostra Capitão América, Surfista Prateado, Motoqueiro-Fantasma e Justiceiro numa “nobre” missão: garantir que os soldados americanos espalhados pelo globo na guerra contra o terror mantenham contato com seus entes queridos e se sintam mais próximos de casa."

Diz ainda a matéria: "Na revista, a organização criminosa Hydra - pense aí uma versão em quadrinhos da Al Qeada, Taleban ou ETA altamente sofisticada - rouba um satélite de comunicações americano. Cabe aos heróis liderados pelo Capitão América resgatar o artefato e permitir que os soldados no exterior consigam mandar mensagens de natal para suas famílias nos Estados Unidos."

O lançamento da revista está previsto para o próximo dia 20. O uso de personagens de histórias em quadrinhos pelos Estados Unidos em períodos de guerra é recorrente. Os personagens são símbolos, reúnem em suas figuras características e essências muito caras ao povo americano, especialmnte o patriotismo e a defesa subliminar da democracia. Democracia na acepção americana do termo: todos os povos obedecendo ao que eles determinam. Esta a liberdade versão United States.

Entretanto, agora, quando aumentam as baixas do exército, já há descontentamento entre o povo, mães e pais temem pela sorte dos filhos que podem morrer no Iraque por uma causa no mínimo duvidosa, eis que surgem os super-heróis para compensar, no imaginário da tropa, a dura realidade do dia-a-dia de homens-bomba, armadilhas e medo.

A missão, resgatar um satélite para que os soldados possam mandar mensagens de natal a seus familiares - que amor -, reveste-se não só do patriorismo heróico, mas do pieguismo choramingas: o filhinho que precisa falar com mamãezinha mas não pode porque meninos maus querem dominar o mundo, o filhinho tem que enfrentar os malvados e precisa deixar o ninho e sair de metralhadora em punho, tadinho.

Agora, chega o Natal e não é que os malvados querem até mesmo que Johnny deixe de falar com a mamãe? Nada disso! Capitão América chegou, para resolver a situação.

Assim estão as coisas. Zé Carioca já serviu para incluir o Brasil no mundo da Disney, na Segunda Guerra. Fomos promovidos a personagem da Disney, já pensou? Agora, até msmo as tropas deles precisam ser incluídas em seu próprio mundo de simulacro, para poder suportar o real. O Vietnã voltou e eles não querem acreditar.

terça-feira, 12 de dezembro de 2006

Lula: esquerda é coisa de menino

O presidente Lula agora está dizendo que essa coisa de esquerda é para a juventude. Quem tem maturidade vai para o centro, tende a um maior equilíbrio, entende o presidente. Destacou que um jovem de direita está com problemas e um homem maduro de esquerda, também está com problemas. Ou seja: posições extremadas têm data certa para começar a terminar.

Reducionismos à parte, o presidente tem razão ao, mesmo que transversalmente, tocar na questão de que, com o tempo, o ser humano sofre mudanças que o encaminham para a ponderação, a serenidade, a sobriedade. O que não se pode é aceitar que, em nome da maturidade, alguém renegue todo o seu passado e adote comportamentos que contrariem frontalmente aquilo que sempre defendera.

Existe, a par da maturidade, uma coisa chamada coerência. O que se deve, com o passar do tempo, é reelaborar convicções, aperfeiçoar visões de mundo, aprender a convivência com os contrários, sabendo que as divergências são essenciais à vida em sociedade.

Para encerrar: maturidade não se confunde com sagacidade; escolher o caminho do meio não significa esconder-se nas dobras da dubiedade. Falar em equilíbrio não quer dizer jogar na lata do lixo da História compromissos que sempre foram bandeira de luta.

segunda-feira, 11 de dezembro de 2006

Morre El Jefe Pinochet: da cinzas à cinza; do pó ao pó

Morreu ontem, Dia Internacional dos Direitos Humanos, El Jefe Augusto Pinochet, que durante 17 anos fez do Chile um país sitiado pelo terror e pelo ódio aos mais mínimos princípios da democracia. Se a história lhe foi irônica ao marcar sua morte no dia em que, em essência, se comemora a dignidade humana, algo que o general desprezava, também lhe foi implacável pelo lado afetivo, pois ontem também se comemoravam os 84 anos de sua mulher, Lucía Hiriart Rodríguez.

O que se viu ontem, com a morte de Pinochet em tais circunstâncias, em que as coincidências tornam ainda mais dolorosas para seus seguidores as condições em que se deu seu fim? A pura e simples demonstração da triste condição humana. Aquele que foi o todo-poderoso, o tirano que impunha terror como norma de estado, o general que ordenava a morte de pessoas sem pestanejar, foi afinal fulminado e mergulhou seu nome sombrio nos registros implacáveis da História.

Seus admiradores o têm na conta de uma espécie de déspota esclarecido, um homem que deu rumo à economia do Chile. Mas os familiares de milhares de homens e mulheres, velhos ou jovens que tombaram sob o peso dos sabres da opressão, entendem bem o que seja a acepção estrita e bruta da palavra ditadura.

Foi sob Pinochet que desenvolveu-se a partir do Chile a Operação Condor, que reunia numa espécie de força-tarefa da morte os sistema de repressão dos países do cone Sul, para a captura e troca de prisioneiros políticos. Houve também a sinistra caravana da morte, onde batalhões percorriam prisões e locais onde estavam presos oposicionistas e simplesmente os executavam.

Ontem, multidões barulhentas acorreram às ruas de Santiago e outras cidades para comemorar, com brindes de champanhe, vinho e cerveja, a morte do Jefe. Seu corpo será cremado e as cinzas entregues à família. Somente em quartéis e repartições militares as bandeiras ficarão a meio pau.

Mesmo comemorando, o Chile secretamente chora os mais de três mil mortos e desaparecidos. E entidades internacionais de direitos humanos reclamam que seres como ele não sejam punidos, tais os entraves legais.

De qualquer maneira, foi-se Pinochet. Seu corpo prestes e virar cinzas. Da cinza à cinza; do pó ao pó.

domingo, 10 de dezembro de 2006

"Turistas", uma história de horror onde o Brasil é personagem e monstro

Circula na internet um indignado texto atribuído à internauta Rosely Júlio, onde se denuncia que estreará no Brasil, em fevereiro de 2007, o filme "Turistas" - assim mesmo, em português. A indignação com a produção da Fox é que, em resumo, esta apresenta nosso país como uma terra de bárbaros, aproveitadores, gente sem o menor escrúpulo que seqüestra um grupo de jovens americanos para lhes retirar órgãos e vender no sinistro mercado que comercia a vida humana.

Trata-se evidentemente de um reducionismo grosseiro e mal-intencionado, feito a partir do estereótipo sensualidade tropical&selva. Selva para onde os jovens são levados após uma farra na praia, quando teriam sido vítimas do golpe do boa-noite-cinderela. Ali, em plena jungle, são submetidos a tratamento brutal numa cabana e aterrorizados. Aparetemente tentam fugir e uma jovem cai num abismo. O trailer que me chegou mostra até aí.

Vejamos agora alguns aspectos: primeiro - a Fox é propriedade do magnata anglo-australiano Rupert Murdoch, dono do grupo News Corporation, que no Brasil tem o controle das operadoras Sky e DirecTV. Portanto, ele tem todo o interesse em desmoralizar o Brasil selvagem, inculto, belo porém bárbaro, para dar lugar à nova cultura globalizada, que certamente nos levará ao caminho reto e seguro do american way of life.

Segundo, e aí a visão internacional sobre o Brasil se arrima para avançar sobre nós garras e asas dos falcões do capitalismo internacional, nós mesmos projetamos para o exterior a idéia de que somos ao mesmo tempo hedonistas e dependentes, lascivos e irresponsáveis, licenciosos e incompetentes. Ficamos loucos de alegria quando o carnaval explode em sexo e orgia e isso atrai dólares e, aí sim, turistas.

Para completar, os correspondentes estrangeiros somente enviam aos seus jornais e agências de notícias aquilo que a noticiabilidade jornalística já tem incorporada há séculos: acontecimentos brutais como a guerra dos traficantes no Rio, a incompetência do Estado brasileiro em enfrentar o crime organizado, sua histórica omissão perante a Amazônia em devastação.

Para os invasores, vale tudo para manter em maré alta sua situação central e a nossa periferia. De alguma forma esse tipo de filme é indicial, é uma pista de que algo não vai bem. E não vai bem há muito tempo. Há poucos dias a presidente do STF, ministra Ellen Gracia, foi assaltada. Seus seguranças sequer resistiram. Ela não deu queixa à polícia. Os invasores vêem isso e estão à espreita. Depois, sair da ficção para ingressar na realidade é um passo.

Ou alguém duvida que em mais uns quarenta anos os marines estejam saltando sobre a Amazônia para garantir que o Inferno Verde seja salvo da insanidade nossa, e todo o território seja entregue ao controle internacional? Afinal, a floresta está sendo atacada, e atacada por nós, brasileiros.

Como no filme, seus órgãos vitais, as árvores, estão sendo retirados e vendidos. E então, Turistas será uma visão antecipada, uma metáfora inesperada e truculenta daquilo que, temo, virá. E aí, chegará a hora dos rangers aportar em socorro da vida. Depois bye, bye Brasil. Será tarde e Inês é morta.

E o mais irônico: mesmo manifestando indignação com Turistas, o texto atribuído a Rosely informa que ela mora no exterior, amedrontada que está com a violência em nosso país. É um protesto ridículo ou deplorável? Será que somos apenas isso: ridículos e deploráveis?