sábado, 21 de julho de 2007

Cora Coralina e um país de emoções despenteadas

Caros Amigos,
Hoje não vamos ver as coisas de jornal. O Brasil está tão triste, tão feio, apesar do Pan. O Brasil é hoje um país de emoções despenteadas, rotas, cara fechada para uma manhã de nada. Em lugar das coisas de jornal, trago Cora Coralina num poema reflexivo, intenso, um jorro de emoção que nos joga ao encontro da vida, suas perplexidades e danos.
Abraços, e um bom fim de semana.

Emanoel Barreto

O Passado...
Homens sem pressa, talvez cansados,

descem com leva madeirões pesados,
lavrados por escravos em rudes simetrias,
do tempo das acutas.
Inclemência.
Caem pedaços na calçada.
Passantes cautelosos
desviam-se com prudência.
Que importa a eles o sobrado?

Gente que passa indiferente,
olha de longe,
na dobra das esquinas,
as traves que despencam.
-Que vale para eles o sobrado?

Quem vê nas velhas sacadas
de ferro forjado as sombras debruçadas?
Quem é que está ouvindo o clamor,
o adeus, o chamado?...
Que importa a marca
dos retratos na parede?

Que importam as salas destelhadas,
e o pudor das alcovas devassadas...
Que importam?

E vão fugindo do sobrado,
aos poucos,
os quadros do Passado.
Cora Coralina

......................................

E agora, uma postagem do amigo, jornalista e poeta Walter Medeiros:

Segredos

O relance dos teus olhos
Nos meus olhos
Tem um brilho inesquecível,
Uma profundidade inexplicável,
Um sentimento acalantador.

Teus olhos deviam ter
Todo tempo do mundo
Para ficar numa expectativa.
Mas um segundo que seja,
Deixa a lembrança inapagável
E a esperança do reencontro
Nos meus olhos.

Olhos belos, que brilham
E transmitem a doçura
Do teu pensamento.
Que tem segredos,
Bens incomparáveis
Que um dia saberei,
Tenho esperança.

São eles (teus olhos)
Que quero ter
Para contemplar
Todos os dias.
Eles falam por teu coração
E são uma mostra da tua beleza.
Walter Medeiros


sexta-feira, 20 de julho de 2007

Quando os ímpios comemoram

Caros Amigos,
As coisas de jornal estão dizendo - e mostrando no You Tube - a horrenda comemoração de dois assessores do presidente Lula, quando o Jornal Nacional aventou a possibilidade de a tragédia de São Paulo ter sido por falha mecânica do avião.

Uma câmera da Globo flagrou o assessor especial da presidência Marco Aurélio Garcia, fazendo gestos obscenos em comemoração ao anúncio, que, a seu ver, desculpabiliza o governo quando ao ocorrido. Sim, porque se o avião tinha problemas técnicos de frenagem ou o que seja, a questão da pista malfeita ficaria para segundo plano. Ponto para Lula!

A seu lado, o assessor de imprensa Bruno Gaspar também fazia movimentos obscenos com uma expressão corporal de fazer corar qualquer maníaco. A câmera da Globo estava ao longe e captou toda a imoralidade: a comemoração pelo escape do governo frente à opinião pública.

Depois, Garcia disse à Folha de S. Paulo: "Não aceito dizer que a gente comemorou. Foi um momento de extravasamento com a conclusão de que o acidente pode ter sido mais complexo do que em princípio chegaram a levantar. Foi uma reação de "poxa, tá vendo?'... Porque houve precipitação. Alguns setores tentaram atingir o governo politicamente e nos culpar. Agora está visto que não é bem assim."

Na verdade, quem procura politizar o tema é o próprio governo. Tanto, que seus usufrutuários comemoraram à larga, demonstrando toda a sua baixeza. Ou seja: vale qualquer coisa, mesmo tripudiar sobre a dor nacional, desde que as cadeiras reclináveis de Brasília fiquem a salvo de suas responsabilidades.
Os ímpios comemoraram.
Eles fazem sempre assim.
Emanoel Barreto

quinta-feira, 19 de julho de 2007

Os que caminham no nada

Caros Amigos,
Agora que as dores nascidas das chamas do avião de São Paulo começam a se acalmar, e a se transformar em saudade triste, aninhada no peito de quem perdeu amores, nasce em todas as vozes a revolta, a repulsa, o grito: onde estão os responsáveis?

A sociedade está em choque, o brasileiro está pasmo, perplexo com tanto horror. E tudo é culpa da incompetência gerencial, da imprevidência administrativa, da inapetência por um serviço ao público sério e bem feito.

Dizem as coisas de jornal que a pista de Congonhas é cheia de falhas, que não permitem a aderência perfeita dos pneus em dias de chuva. E que falta, ao final da pista, um sistema de frenagem que literalmente prende o avião ao solo em caso de emergência; pois essa parte, feita em concreto poroso, se racha, as rodas afundam, e isso detém a corrida da aeronave.

Agora, esteja certo - eu já estou - virão mil desculpas, inquéritos, declarações as mais escabrosas, acusações sempre rebatidas, e, tenho quase certeza, nada será feito. É parte da nossa cultura: acomodatícia, solerte, um meio tom de cinza, sempre a encobrir culpados e criminosos de toda espécie.

Se a pista tem falhas, como está sendo dito, não houve um acidente, mas homicídios culposos. Todas aquelas pessoas foram assassinadas pelo engenheiro ou engenheiros que projetaram-na imperfeita e pelos que a aprovaram como obra pronta. Mas ninguém será preso, nada se fará. Esteja certo - foi feito algo a respeito da construção do túnel, também em São Paulo, cujas paredes ruíram? Não. Nada aconteceu.

E depois, em meio à solidão escura dos que perderam amigos,esposas, maridos, filhos, gente a quem se queria bem, haverá silêncio grande a soluçar saudades e dizer baixinho que estar só é como caminhar no nada.
Emanoel Barreto

quarta-feira, 18 de julho de 2007

O avião que explodiu em dores

Caros Amigos,
A tragédia de São Paulo mostra o quanto é insana e desvairada, gauche e imponderável essa louca vida, paradoxalmente breve e sutil maravilha, que em seu destino de vida se transforma em caos e pavor.

As coisas de jornal informam, já com mais detalhes, o horror de São Paulo, um horror que atingiu a todos nós, em cada recanto mais escondido destes brasis de asfalto e rincões perdidos em vastidões tão largas, tão largas que podem abraçar todas as eternidades.

Aquelas pessoas vinham em viagem tranqüila, esperando chegar. De repente, o destino, fado, sina ou acidente, como se queira, aparece e puxa as cortinas da tragédia, abrindo o palco amargo dos horrores a todos que estavam ali dentro.

E então o ser humano, em sua condição mais desesperadora, viu-se frente a frente com o espanto, o terror circulando nas veias, olhos olhando a morte amordaçando a vida.

Vida presa na fornalha daqueles instantes. O Brasil está perplexo com o pior acidente de avião de sua história. E o público das coisas de jornal tornou-se, de alguma forma, uma família. Todos nós, de alguma forma, perdemos alguém naquele avião que derrapou e explodiu em dores.
Emanoel Barreto

terça-feira, 17 de julho de 2007

É início de noite. E uma tragédia explode nossos medos

Caros Amigos,
É início de noite: pela TV, imagens ao vivo do avião que incendiou-se em São Paulo. A vida, e as tragédias do cotidiano, passam rápidas pela tela da TV. Imagino o horror, o pavor paralisando corações e mentes daqueles que estavam presos à terrível masmorra em que, de repente, o avião se transformou.

Imagino pessoas petrificadas de medo, os gritos, todos tentando de alguma forma escapar; a fumaça ácida penetrando os pulmões, corpos transidos de desespero, o calor brutal esmagando esperanças de salvação, casais buscando se ajudar, vidas com medo de morrer.

As coisas de jornal na internet dão informações incompletas, o que faz aumentar em mim um sentimendo de solidariedade, uma espécie de ânsia temerosa de que haja muitos mortos.

É início de noite. Daqui a pouco os telejornais devem espocar dados e números. E o ser humano que em mim me habita compreende que é pouco mais que um suspiro.
Um abraço.
Emanoel Barreto

domingo, 15 de julho de 2007

Memória do Comércio do Rio Grande do Norte

Caros Amigos,
Será lançado hoje(16/07) no Portugal Center, às 18h, o livro Memória do Comércio do Rio Grande do Norte. É um trabalho de minha autoria, em parceria com a jornalista Auricéia Antunes de Lima, realizado sob o patrocínio da Federação do Comércio do Rio Grande do Norte. Abaixo, uma breve introdução da obra.

Aos leitores
Registrar a vida é como documentar uma aventura, a grande aventura do Homem sobre a face da Terra. Há algo de inesperado e belo, grandioso e fugaz, sofrido e vitorioso no dia-a-dia, mas nem sempre o percebemos. Ao assumir o compromisso da realização desta obra encarei o desafio de resgatar memórias, recordar emoções, palmilhar sentimentos e instantes de vidas cuja intensidade verteu-se no empreendedorismo e realizações com largos desdobramentos humanos, econômicos e sociais.

As entrevistas que me chegavam às mãos vinham plenas de um vigor que somente os depoimentos de vida, histórias no tempo, podem conter. Havia palpitação emotiva e força poética no declaratório de quem falava de si ou sobre o personagem biografado. E isso guiou o meu texto, permitindo-lhe vôos de verossimilhança, caminhos para a imaginação, descrição de momentos, intensidade de situações, imersão em instantes de humana força.

Foram seis meses de trabalho intenso, ao lado de uma jovem equipe. O instigante desafio partiu de Tertuliano Pinheiro, executivo de marketing da Federação Norte-rio-grandense do Comércio e idealizador deste projeto. Com ele, Rogério Almeida Freitas, também executivo da Fecomércio-RN, que sob a liderança e sensibilidade do presidente da instituição, Marcantoni Gadelha de Sousa, asseguraram todas as condições para a execução do empreendimento, um resgate urgente e oportuno da memória do comércio do Rio Grande do Norte.

Registrar a vida, sabendo que o registro passará a compor a própria vida, é sentir-se na situação de quem caminha: seus passos deixam rastros, que se aliam ao tempo e são acolhidos pela História.
Emanoel Barreto


BARRETO, Emanoel; LIMA, Auricéia A. de. Memória do Comércio - Rio Grande do Norte. Natal: RN Econômico, 2007

O Risco Brasil

Caros Amigos,
O capital internacioinal estabeleceu uma tabela pela qual calcula os riscos de investimento em países periféricos. É o chamado risco país. Quando mais um páís se inserir no perfil previsto pelos investidores, menor o seu risco. O inverso também é verdade.

Aqui, ele é denominado Risco Brasil. As coisas de jornal indicam que ele, o risco, aponta que são boas as perspectivas para quem queira trazer capital de fora para aqui investir.

Para mim, Risco Brasil é o seguinte: balas perdidas, ônibus incendiados, escolas que não funcionam, universidades sem dinheiro para completar seus quadros docentes, poderio do tráfico de drogas, instituições políticas decaídas, corrupção no governo e fora dele, má educação, seqüestos, crianças sem futuro, prostituição, trabalho escravo, cinismo dos políticos, poluição ambiental, destruição das florestas, má utilização de verbas públicas, falta de políticas públicas, desperdício de dinheiro com coisas como o Pan, o Nordeste ainda dependente da chuva para garantir safras, desemprego, cidades inundadas quando chove - por falta de planejamento urbano - miséria, pedintes nos sinais de trânsito, favelização crescente nas grandes áreas urbanas, políticos impunes, trânsito caótico, o lamentável "jeitinho" brasileiro, o baixíssimo nível de leitura de livros e jornais, o uso da internet para tolices, os crimes via informática, o desaparelhamento das polícias, hospitais públicos em péssimas condições, uma juventude inculta, tola e consumista, professores desmotivados e mal pagos, a mercantilização do ensino superior, uma programação de TV voltada para tornar estúpidas todas as pessoas, as agressões aos valores culturais, a falta de preservação do patrimônio imaterial, a leniência e paralisia das autoridades governamentais, o uso criminoso dos dinheiros públicos, a falta de memória da sociedade que elege e reelege indivíduos notoriamente criminosos, a necessidade quase patológica que o brasileiro tem de feriados e feriadões, a preguiça que domina os jovens, o vagabundo que ataca uma menina e lhe toma a bolsa, o traficante que lhe ameaça a família, o bandido que decepa vidas para comprar drogas, o empresário que arma esquemas para se apoderar de verbas, o lobista que fecha negócios com o dinheiro do povo, deputados, senadores e vereadores de mãos encardidas, um país inteiro vestido de trapos, fiapos e restos de uma moral perfurada.

Vou parar por aqui. Sinto uma espécie de tristeza cinza, um sentimento de saudade dos meus sonhos e uma vontade enorme de dizer: "Por quê?"
Emanoel Barreto