sábado, 3 de fevereiro de 2007

Pode vir quente, que eu estou fervendo

As notícias estão em ebulição na imprensa do mundo: os jornais tratam com destaque o aquecimento global, as pessoas se atemorizam, mas não há, em nível mundial, numa ação conjunta da humanidade, qualquer ação voltada para a realidade de hoje e prevenção daquilo que virá.

O Comitê Científico Internacional, encarregado de estudar o assundo, alarma que o quadro resulta de ação humana e deverá permanecer assim durante séculos. Com o aquecimento, haverá uma crescente elevação da temperatura do ar,derretimento de gelo e neve, bem como elevação do nível do mar.

Diz o Estadão on line que "o Comitê prevê uma elevação de temperatura de 1,1º C a 6,4º C até 2100. Esta é uma faixa de variação maior que a que constava do relatório anterior, de 2001, mas o comitê também diz que a melhor estimativa fixa a mudança entre 1,8º C e 4º C."

E mais: "No que diz respeito ao nível do mar, o relatório projeta elevações de 18 a 58 centímetros. Mas essa faixa pode ser ampliada em outros 10 a 20 centímetros se do derretimento das capas de gelo sobre as regiões polares continuar."

Está claro que estamos preparando um armagedom. A cobiça, a ganância, a necessidade desmedida de ganhar dinheiro às custas do meio ambiente, está levando as grandes corporações internacionais e grupos nacionais que lhes sejam satélites, a continuar com a insanidade. Muitas populações, por pobreza,ignorância ou estupidez, também contribuem para a degradação do planeta.

A Terra vai deixar de ser "azul e linda", como vista no olhar enternecido do cosmonauta Gagarin.
O objetivo dos homens é conviver com cinzas.

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2007

Panis et circensis

O Estadão online publica uma paleta de fotos sobre a estréia dos novos eleitos e dos reeleitos, para a Câmara e o Senado. Digo paleta pois as duas Casas terão efetivamente uma tal variedade de cores morais, de tons e semitons éticos, de valores intrínsecos aos parlamentares, que somente a designação, tomada de empréstimo ao léxico dos pintores, poderia abarcá-la por inteiro.

O trabalho feito pelos repórteres-fotográficos do Estadão, olhado em seu conjunto, dá idéia da pauta que receberam: exatamente colher pelo olhar e enquadramentos das lentes, uma forma de manifestação do que seja a essência do Congresso: um fulgurante cortejo de interesses os mais diversos. Desde a presença da cupidez do deputado Paulo Maluf, até a discretamente espalhafatosa presença do recém-empossado deputado Clodovil Hernandez.

Todo de branco, com um colete em tons negros, bengala, óculos escuros e a carteira de identidade parlamentar colocada sobre a bancada, ele apurou seus ademanes para manter-se no foco da mídia.

Vamos ver o que acontece. Collor está de volta, como senador. Sua primeira medida foi mudar de pardido. Ele fazia parte de um PS-não-sei-o quê e filiou-se ao PTB. A deputada Manuela, do PC do B, Rio Grande do Sul, foi de cara vista como a nova belezinha do plenário. Caras e bocas estão prontas para se apresentar.

Os velhos integrantes do baixo-clero também estarão atentos às suas manobras e meneios, jogadas e desvãos, sempre em busca de um mandato rentável. E ao, povo; bom, ao povo, pão e circo.

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2007

O preço da cascavel

A morte de Seu João Vilaça chocou a todos quantos o conheciam. Homem bom, sertanejo de têmpera de aço, tinha, por trás da cara amarrada, um grande coração, jamais negando uma ajuda a quem quer que fosse. Assim, familiares e amigos estranharam muito quando ele foi atacado e morto por um bandido.

O agressor chegou e, sem palavra, disparou a arma uma, duas, três vezes. Seu Vilaça caiu pronto. Homem querido, o velório recebeu muitas presenças. Todos lamentavam a morte: “Era um velho duro”, disse um amigo. “Se não fosse isso, ainda iria viver muitos anos”, completou uma senhora.

As pessoas lamentavam o ocorrido e enfatizavam: mas como isso poderia ter ocorrido? Não houvera discussão, briga, desentendimento algum. Nem mesmo uma tentativa de assalto.

A família lamentava a frieza como o crime fora cometido, o que aumentava a revolta e a dor. Ninguém encontrava explicação e havia mesmo quem pensasse em reunir um grupo de amigos para encontrar e justiçar o matador.


“Não se pode aceitar uma coisa dessas. A violência chegou limites do insuportável para os cidadãos de bem”, reprovava um velho amigo de Seu Vilaça.

Como, porquê o bandido tomara tal atitude frente a um homem velho, indefeso, incapaz de agredir alguém?

Nisso, entra na casa um estranho. Esgueirando-se por entre as pessoas, o homem pediu licença a Genebaldo, um amigo do morto, e disse que precisava urgente falar com alguém da família, alguém muito próximo, de preferência filho ou até mesmo a viúva. Insistia: era assunto importante e somente com uma pessoa assim poderia conversar.

O velho tinha prole numerosa. Genebaldo ficou assim, olhou para um lado, para o outro e afinal seus olhos encontraram a figura de Arminda, a filha mais velha de Vilaça, e que estava em melhores condições emocionais frente à tragédia.

Ela conduziu o estranho à cozinha e dele ouviu a seguinte história: Seu Vilaça sempre havia devotado grande ódio a bandidos. Desde os bandidos convencionais, digamos assim, até aqueles de colarinho branco.

“Sei disso”, admitiu Arminda. “E daí?”
Daí, prosseguiu o homem, que Seu Vilaça havia encontrado um modo engenhoso de matar bandidos, sem que ninguém desconfiasse.
“Como assim?”, quis saber Arminda.


Ora, muito simples: toda semana o estranho, que morava numa cidadezinha do interior, capturava uma cobra, que era levada a Seu Vilaça. Ele recebia, pagava e colocava o bicho numa valise bem trancada. Ele tinha preferência por cascavéis (“Adorava o barulhinho assassino do maracá”), o homem fez questão de detalhar, assumindo ares de grande conhecedor.“E para que ele queria essas cobras?”, quis saber Arminda.

Claríssimo estava, salientou o sujeito: para matar bandidos. Seu Vilaça ia ao Centro da cidade com a valise na mão, encaminhando-se a locais onde notoriamente agiam ladrões especializados em furtar bolsas, pastas, carteiras.

Ele se enfiava no meio da multidão, procurando atrair a atenção dos bandidos. Logo, logo, um deles se atirava sobre o velho e roubava a mala. É claro que, na confusão, na correria, o bicho ficava assanhado e, pouco depois, quando o ladrão abria a valise, a cobra pá!, tacava-lhe a mordida letal. "E olhe que ele havia matado muitos, muitos desse jeito, viu? Pelo menos uns vinte."
“Então...”, balbuciou Arminda.


"...então", esclareceu o homem, "Vilaça foi morto por vingança."
“Vingança?, balbuciou a mulher.


Sim. Claro. Os marginais terminaram percebendo que estavam sendo vítimas de uma armadilha e abriram fogo. E afinal, frente a uma Arminda paralisada de susto e dor, o homem arremeteu seu bote:“Sim, minha senhora, foi uma vingança. E eu não posso ficar no prejuízo. E agora por favor, decida: quem vai me pagar a cobra?"

terça-feira, 30 de janeiro de 2007

E não tem sido sempre assim?

Estranhos tempos, tristes personagens.
Lutamos por dinheiro, luxo, luxúria,
vitórias, carros, mansões, poder, fama,
fortuna, dominação, império, tudo na
suave dormência de quem pode e manda.

Estranhos tempos, tristes personagens.
Lutamos tanto, que o dinheiro de poucos
é a miséria de milhões; e o luxo, a luxúria,
as vitórias, os carros, as mansões, o poder,
a fama, a fortuna, a dominação, o império,
tudo isso forma a terrível demência que
controla o mundo.

E não tem sido sempre assim?

segunda-feira, 29 de janeiro de 2007

José Wilker pode salvar o Brasil.

O Jornal do Brasil de domingo último abordou tema que deveria causar temor em todo brasileiro: a crescente internacionalização da Amazônia mediante um estratagema simples e eficaz: permitindo-se a presença de missionários, cientistas, organizações não-governamentais e empresas, que, sob o aparente manto de agir sem segundas intenções, têm terceiras ou quartas,e todas elas muito más, todas voltadas para uma futura captura de toda aquela imensa e valiosa região.

O Estado brasileiro tem sido incompetente, ao longo dos séculos, para tratar da questão amazônica com a urgência e seriedade que esta requer: seja de povoamento, condições de habitabilidade, desenvolvimento sustentável, maior presença militar, implantação de rodovias e ferrovias, enfim, uma ação administrativa ampla, de forma a assegurar ao País a manutenção de um território tão grande e tão nosso.

Os indicadores históricos atuais apontam para o seguinte e sombrio quadro: o agravamento da violência no Rio e em São Paulo, sem que o Estado esboce qualquer reação estrutural mais vigorosa, a não ser que se considere ação vigorosa a presença da Força Nacional de Segurança; e a real possibilidade de perda da Amazônia para países centrais, de há muito cobiçosos em nosso território.

Por enquanto, eles estão pilhando a biodiversidade da Amazônia, ante a sonolência estatal. Proximamente, estarão desembarcando tropas, alegando que querem preservar o pulmão do mundo, interesse da humanidade.

Mas, como somos o país do carnaval, tropicalmente alegre, quem sabe venhamos convencer José Wilker a assumir de fato a personalidade de Galvez, o imperador do Acre, para que ele tome a pulso a defesa dos interesses nacionais. A Globo gravaria tudo e ainda passava no Jornal Nacional. Talvez seja, a loucura,
a solução para este país.

E, como dizia Jobim, é verdade que o Brasil não é para principiantes.

domingo, 28 de janeiro de 2007

A nova queridinha das passarelas é nordestina. Pode?

A Folha online anuncia: "Direto das passarelas internacionais, a nova promessa 'made in Brazil' é Bruna Tenório", de 17 anos. A jovem participa com grande destaque da 22ª Edição da São Paulo Fashion Week, que se encerra amanhã, em São Paulo.

No terceiro parágrafo a Folha se desmente e revela: "Bruna nasceu em Maceió e foi descoberta por um booker da New Models." Há aí um sutil processo de ocultação, de manipulação textual, ou seja, a menina não "veio diretamente das passarelas internacionais"; nada disso. A jovem é nor-des-ti-na. Por que o jornal não a apresentou assim?

Claro que não. A angulação da matéria não poderia jamais ressaltar esse defeito,claro. Ia pegar mal e prejudicar os lucros da indústria da moda.

Afinal, para a grande imprensa e para a grande mídia em geral, ser nordestino é ser pobre, mestiço, feio, esmolar alguma ajuda e viver na caatinga. Nordestino é como uma espécie de raça inferior, que fala com um sotaque feio. Basta ver qualquer novela ou produção da Globo, onde atores representem de forma caricata personagens vindos do Nordeste, que é quase uma pátria para os que aqui nascemos.

Mas a beleza e o modo de desfilar da jovem, elogiados pelo jornal, desmantelam o preconceito e a colocam, mesmo contra a vontade do texto,como uma espécie de síntese da grandeza e da essência do nosso povo. No Nordeste há beleza, não só nas praias e no sertão, quando a chuva inunda açudes e faz da caatinga um verde só,uma festa para os olhos. Há beleza e alegria no nosso povo.

Tenho uma visão bastante crítica, ácida mesmo, com relação ao mundo da moda, pela forma como manipula moças e até as mata, literalmente, de fome. Mas, se uma nordestina chega lá, e chegou para brilhar, ela não "veio das passarelas internacionais". Veio mesmo daqui. Brotou desse chão de Brasil e assim deve ser apresentada.

Falar que "ela nasceu em Maceió", ao invés de apresentá-la como nordestina, é ato falho, é revelação de preconceito. Qualquer análise de discurso descobrirá isso facilmente.