sexta-feira, 14 de junho de 2013



Felicidade não se improvisa

Há algo de estranho nessas manifestações populares contra o aumento de preços de passagens de ônibus. O meu estranhamento se dá em função do seguinte: o país é imerso nessa festa trôpega da tal Copa das Confederações, realização irreal de uma felicidade coletiva. Esta, por sua vez, se esvanece em meio à fumaça das bombas da polícia. 
 
https://www.google.com.br/search?q=protestos+em+sao+paulo+onibus
Colocando as coisas de outro modo: se a felicidade fosse real, se fôssemos um povo que vivesse com dignidade, você acha que milhares de pessoas iriam às ruas manifestar indignação ante um aumento de míseros vinte centavos em passagens de ônibus? Iriam as pessoas se arriscar a apanhar por tão pouco?

Claro que não. Quem reclama por tão pouco e porque também tem muito pouco, e desse pouco não pode abrir mão. 

Em meio a tudo isso emerge a condição humana e surgem os atos de vandalismo, depredação, desordem. Está errado, mas a essência do movimento representa um legítimo sentimento de repulsa às desigualdades sociais. Disso não se pode abrir mão, mesmo que seja inaceitável a desordem.

Então, o que quero dizer é o seguinte: as elites do país precisam entender que o povo, parcela ponderável desse povo, não está se contentando com o pão e circo tão bem expresso pela Copa das Confederações. 

Governo e elites parecem não perceber que não podemos mais esconder as misérias do país com a empanada sonora do circo do futebol, os gritos de gol, a felicidade da torcida alegre e bêbada.  

Felicidade não se improvisa. Mas tem gente nesse país ainda acreditando nisso. E o preço pode sem bem mais alto que os vinte centavos de uma passagem de ônibus. Quando o povo vira turba a culpa é de alguém que não é povo.




Os crimes 

do Padre Heusz

Ele diz : “O salário do pecado é a morte”; e pune os pecadores do hóstias envenenadas

 
“Os crimes do Padre Heusz” é o título do romance que envuiei à Editora Sebo Vermelho. O lançamento ocorrerá emdia 10 de  julho próximo, a partir das 19h no Solar Bela Bista. “Os crimes...” conta a história do Padre Heusz, que toma ao pé da letra a assertiva bíblica “o salário do pecado é a morte” e pune os pecadores com hóstias envenenadas.
As hóstias, no entanto, não recebem poção bruta ou grosseira; ao contrário, a  fórmula do veneno leva o pecador, pouco antes de morrer, a estado de beatificação, sensação de estar em paz, gozo místico.  Padre Heusz não quer que os pecadores sofram fisicamente,  sintam angústia ou sequer percebam que estão morrendo, mas partam em completa sensação de paz. Isso porque não se  sente um assassino; acredita-se em missão, pois em sonho que um anjo lhe aparecera convocando-o a punir os pecadores. Então, pede a um químico que produza o delicado veneno.
O prefácio é do escritor François Silvestre. O livro é dedicado aos repórteres policiais Pepe dos Santos, Genésio Pitanga e Ubiratan Camilo (in memoriam).
 O relato da história é feito por meio de cartas que o Padre Heusz envia ao editor de um jornal que aos poucos vai se envolvendo na trama até o confronto final, quando o sacerdote tenta matá-lo em uma caverna profunda que havia sido transformada em catedral.
A obra trata, em meio ao suspense em que foi construída, da questão da condição humana, da queda, das incertezas e questionamentos entre os conceitos do Bem e do Mal. Como exemplo pode-se citar o personagem que é sósia do Padre Heusz e vai à sua procura.
É um homem rico, cruel, invejoso e sem limites morais. É essa inveja que o leva a capturar e martirizar Padre Heusz, a quem acredita um santo. E como entende que todo santo deve ser martirizado, confia estar dando a Padre Heusz aquilo que todo santo deseja. E o prende a uma roda medieval de tortura, usada pela Santa Inquisição. O sequestrador considerando-se um  “piedoso inquisidor”.
Supõe que, morto o padre, poderia assumir sua personalidade e assim tornar-se um digno sacerdote. Padre Heusz escapa no último instante.
Há situações que foram tiradas da vida profissional do autor no exercício do jornalismo. Foram usadas para dar maior verossimilhança à narrativa. Como exemplo, a invasão da redação onde trabalha o personagem que é editor do jornal. De repente, chega ao local um homem perseguido por multidão que queria o seu linchamento.
O fato foi transposto ao livro. Eu realmente enfreitei tal situação na Tribuna do Norte, quando um homem que havia surrado o pai foi perseguido e refugiou-se na redação.
Quando a turba foi expulsa o arruaceiro explicou o motivo de haver corrido até o jornal: como a Tribuna pertencia a Aluizio Alves e este era tido como o protetor do povo, o fugitivo fora ao jornal para ser “protegido por Aluizio”.
O romance é uma sucessão de acontecimentos bizarros e terríveis situações, com os personagens levados ao limite da condição humana. Tudo se passando em meio a momentos de terror e um final absolutamente inesperado. 

quinta-feira, 13 de junho de 2013

Mossoró, minha segunda pátria



Mossoró, minha segunda pátria ou a luz de Lampião brilhou menos que a de Santa Luzia

Tenho Mossoró como uma espécie de segunda pátria, terra iluminada pelo olhar de Santa Luzia, luzente cruzeiro das procissões e crenças boas do povo. Hoje a cidade comemora sua vitória sobre o bando de Lampião em meio à festa de balas coloridas, vivas, alegres. Ou, para acompanhar o título desta homenagem, naquela dia distante a luz de Santa Luzia iluminou mais que o brilho baço do bandido armado.
Foto: mural de Riacho da Cruz

Passei grandes e bons momentos naquela cidade. Ali aprendi a andar de bicicleta e assisti a muitos filmes no Pax. Adorava ir ver uma tartaruga que nadava num grande espelho d'água de uma bela praça. Saudades, Mossoró, saudades.

E hoje, como na música famosa, hoje em Mossoró o que explode nas trincheiras da alegria é o amor. Terra da resistência, firme como o chão duro do sertão, Mossoró tem o timbre da coragem, a marca da honradez, o selo dos grandes compromissos. 

Um abraço aos mossoroenses. A cada rua, a cada casa, a cada coração um abraço.

domingo, 9 de junho de 2013

Pequena 

carta à chuva

Cai uma chuva noturna e boa. Amiga do vento, a chuva se espalha como um véu d’água, um solidéu, algo assim. Como se fossem bichinhos vivos, os pingos enfeitam vidraças e correm para se aninhar não sei aonde.

Acho que o barulho da chuva é a sua voz. Uma voz que tem o brilho perolado da água, um cheiro de mato e chão. A chuva é a mãe do arco-íris que dorme nas nuvens, a avó de todos os roçados, prima do gado sertanejo, irmã da floração das plantas. A chuva é verde em essência. Irmã gêmea da vida.

Obrigado, chuva, por chover.


Emanoel Barreto