sábado, 6 de outubro de 2007

O direito à preguiça

Caros Amigos
Vejo na TV um professor doutor defendendo o direito à preguiça como algo de real importância para o povo brasileiro. Entre boquiaberto, perplexo, desencantado, caio em mim e entendo: preguiça pode mesmo virar jurisprudência social num povo que, convenhamos, não é mesmo muito chegado ao trabalho.

Os feriadões são espécies de datas sacras trabalhistas e infundem um tal estado de espírito carnavalesco-ocioso, que chego a temer pelas noções de civismo e responsabilidade. Às favas com tudo isso... é a norma. E lá vamos nós para o ócio desabalado.

E, chegando o domingo, vem mais um dia de modorra barulhenta, descanso esparramado em velhacaria televisiva vulgar e insusportável de programas como o do Faustão, que brada suas grosseiras baboseiras para um público que urra, após haver assistido a mais um jogo de futebol.

Diante de tudo isso, começo a suspeitar: será que o Brasil não é uma pegadinha?
Emanoel Barreto

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Tristes costumes políticos

Caros Amigos,
A decisão do Supremo, determinando que os mandatos pertencem aos partidos, não aos mandatários, inaugura, espero, um encaminhamento - mesmo que ainda tímido -, de nossos costumes políticos a uma postura algo civilizada.

É preciso acabar com a figura do velhado de paletó, que ao não ter atendidos seus apetites, muda de bando e se insere naquele que mais lhe atende aos intentos de pirataria.

Se alguém integra um partido político é porque o faz em consonância com afinidades ideológicas e históricas. É inaceitável que alguém mude de sigla partidária como quem sai da um ônibus político e passa para outro.

Trata-se, lamentemos, de uma cultura de há muito enraizada nas atividades políticas; mais que isso, integra a cultura nacional maior, os costumes do dia-a-dia, o jeitinho brasileiro, as coisas nossas do cotidiano.

E as pequenas infrações, corrupções, facilitações, enganações e procedimentos correlatos, terminam desaguando na eleição de mestres talentosos na estimada arte - em alguns círculos -, da manobra política em proveito de si e dos seus.

A determinação do Supremo dá algum alento a quem espera por novos tempos. Esperemos que estes venham, como se fora uma manhã aberta a uma nova vida à cidadania.
Emanoel Barreto

terça-feira, 2 de outubro de 2007

Um poema de Lord Byron

Caros Amigos,
Abaixo, "O Oceano" de Lord Byron. Belo, soturno, denso, talássico.

Rola, Oceano profundo e azul sombrio, rola!
Caminham dez mil frotas sobre ti, em vão;
de ruínas o homem marca a terra, mas se evola
na praia o seu domínio. Na úmida extensão
só tu causas naufrágios; não, da destruição
feita pelo homem sombra alguma se mantém,
exceto se, gota de chuva, ele também
se afunda a borbulhar com seu gemido,
sem féretro, sem túmulo, desconhecido.

Do passo do há traços em teus caminhos,
nem são presa teus campos. Ergues-te e o sacodes
de ti; desprezas os poderes tão mesquinhos
que usa para assolar a terra, já que podes
de teu seio atirá-lo aos céus; assim o lanças
tremendo uivando em teus borrifos escarninhos
rumo a seus deuses - nos quais firma as esperanças
de achar um portou angra próxima, talvez -
e o devolves á terra: - jaza aí, de vez.

Os armamentos que fulminam as muralhas
das cidades de pedra - e tremem as nações
ante eles, como os reis em suas capitais - ,
os leviatãs de roble, cujas proporções
levam o seu criador de barro a se apontar
como Senhor do Oceano e árbitro das batalhas,
fundem-se todos nessas ondas tão fatais
para a orgulhosa Armada ou para Trafalgar.

Tuas bordas são reinos, mas o tempo os traga:
Grécia, Roma, Cartago, Assíria, onde é que estão?
Quando outrora eram livres tu as devastavas,
e tiranos copiaram-te, a partir de então;
manda o estrangeiro em praias rudes ou escravas;
reinos secaram-se em desertos, nesse espaço,
mas tu não mudas, salvo no florear da vaga;
em tua fronte azul o tempo não põe traço;
como és agora, viu-te a aurora da criação.

Tu, espelho glorioso, onde no temporal
reflete sua imagem Deus onipotente;
calmo ou convulso, quando há brisa ou vendaval,
quer a gelar o pólo, quer em cima ardente
a ondear sombrio, - tu és sublime e sem final,
cópia da eternidade, trono do Invisível;
os monstros dos abismos nascem do teu lodo;
insondável, sozinho avanças, és terrível.

Amei-te, Oceano! Em meus folguedos juvenis
ir levado em teu peito, como tua espuma,
era um prazer; desde meus tempos infantis
divertir-me com as ondas dava-me alegria;
quando, porém, ao refrescar-se o mar, alguma
de tuas vagas de causar pavor se erguia,
sendo eu teu filho esse pavor me seduzia
e era agradável: nessas ondas eu confiava
e, como agora, a tua juba eu alisava.
Lord Byron


(Tradução de Castro Alves)

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Milhões de homens a morrer de fome

Caros Amigos,
O medo se espalha
no ar como peste invisivel.

Uma mulher aborta
E joga a filha em riacho imundo
para garantir-lhe uma morte bárbara.

Corrupção se espalha.
Mancha de óleo social
ensopa nossos olhos nas páginas do jornal.

As balas travam seu brutal diálogo
e gritam tiros de morte e de dor.

Um político sujo sobe à tribuna
e expõe solerte propostas pegajosas.

Nossas vidas caminham a passos tardos
Enquanto um grupo de
senhores, em gabinete fausto,
Secretam planos para transformar
em pasta milhões de homens
a morrer de fome.
Emanoel Barreto