sábado, 16 de fevereiro de 2008

E as chuteiras ficaram tristes

Caros Amigos,
As coisas de jornal têm possibilidades múltiplas, ampliando seu leque de abordagem, dando curvas na comunicação. A depender da notícia ou reportagem, as coisas da vida, como o título de um filme, de um livro ou de uma canção, um ditado popular ou algo assim, podem perfeitamente se encaixar no espírito da matéria.

Por exemplo: certa vez, ao fazer uma reportagem sobre depressão, titulei o texto com o seguinte verso de Chico Buarque: "Tem dias que a gente se sente como quem partiu ou morreu." Percebe? Isso dá mais força ao texto, uma vez que remete o leitor a uma circunstância já experienciada, que foi o contato prévio com a composição famosa de Chico e a situação cinzenta de quem esteja passando por uma depressão.

No caso das charges, como essa de Ique, acima, publicada hoje no JB, temos exemplo claro de como uma determinada manifestação jornalística pode ir além daquilo que dela se espera comumente, e partir para angulações outras.

Comumente a charge é irônica, marcadamente política, tem cunho opinativo e, portanto, editorial. Acontece que charge, por isso mesmo, é um a visão de mundo, uma contemplação que, sendo irônica, não deixa de ter seu conteúdo trágico, uma vez que deplora sarcasticamente a miséria humana na gestão dos negócios da política e do governo. E, sendo visão de mundo, pode alentar-se a abranger outros significados, tratar de outras pulsações do humano gesto nesta vida louca e bela, triste e ao mesmo tempo magnífica.

Ique utilizou o espaço da charge para, vamos dizer assim, uma reflexão sobre a condição humana: um jogador de futebol, rico e famoso, ainda em condições de desfrutar de suas condições de atleta, de repente vê-se lançado ao escanteio da vida, durante uma jogada infeliz. Mais uma, em sua atribulada carreira de quedas e contusões.

Ique conseguiu, com vigor incomum, captar o sentimento de Ronaldo a partir de imagens da TV que o mostravam cabisbaixo, as muletas conduzindo, trôpegas, os pés de quem um dia já foi o melhor do mundo. Veja o traço, perceba o sofrimento que a imagem transmite. E o detalhe: junto ao rosto do jogador, três tracinhos dão o toque que expressam a sua dor. É a vida cabisbaixa e o homem sucumbido a ela.

Tudo parece ser o indício do fim. E reconfirmo: tem dias que a gente se sente como quem partiu ou morreu.
Emanoel Barreto

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Olhai este lírio do pranto



Caros Amigos,

Ai que triste momento da criança, a brincar de perigo sem temer. Com firmeza no olhar tão triste e pobre, ela mostra o troféu que é sua dor.

Sucumbido instante, lamentável proeza.

Aprenderam-lhe artes desumanas, ensinaram-lhe atos ribanceiros. Meio aos pais que lhe forjam vida suja, a criança corre a virar restolho.

E se a vida cobrar, nalgum instante, que lhe pague tão caro um preço vil, a menina terá sempre o direito de enroscar-se e matar quem a picou.

Emanoel Barreto

Fonte: http://www.picarelli.com.br/fotolegendas/fotolegenda012003d.htm

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Comissão para Produzir Inutilidades-CPI




Caros Amigos,
PT e PSDB, como na alegórica foto acima, estão às mil maravilhas. Não, não se trata de uma afirmativa paradoxal: os partidos agora deram para, veja só, brincar de CPI. Como num jogo de amarelinha político, vão ficar atirando pedrinhas e saltitando do plenário para salas de reuniões e de lá para o plenário e deste para as TVs, jornais, rádios e internet, fuxicos e tolices.


De um lado e de outro há telhados de vidro, e as pedrinhas da amarelinha política vão certamente estilhaçar os finos cristais de deslizes, malversações, cambalacho, patranhas, acertos, jogos de luz e sombra. Foi só a oposição falar em CPI, que o Governo entrou na brincadeira e quer também esmiuçar o uso dos cartões corporativos dos tempos de FHC.

Tal panorama, lamentável procedimento de políticos que deveriam ter mais o que fazer, é o mapa exato e perfeito do nosso Congresso: apenas magotes de deputados e senadores trocando acusações, mas deixando blindadas as figuras presidenciais de Lula e FHC. Isso é coisa séria? Francamente, o povo não deveria ser engodado com essa amarelinha. Todos sabemos que a CPI dará em nada; ninguém será preso, dinheiro não será devolvido aos cofres públicos, a sociedade nada terá a lucrar.

Lucrar, lucrar mesmo, somente os partícipes do festim do Poder, que vão jogar sua amarelinha e não vão amarelar quando seus nomes pipocarem nas manchetes das coisas de jornal. Trata-se apenas, como veremos, de uma Comissão para Produzir Inutilidades. No mais, tudo bem.
Emanoel Barreto
* Ah, sim... No You Tube há um filminho de uns 15 segundos, que flagra o presidente Lula dizendo um baita palavrão, ao reclamar de fotógrafos de jornais que, segundo diz, o assediam em demasia.
Foto - Fonte: http://www.radiobras.gov.br/brasilia45anos/brasilia45anos.htm

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Carona com a morte



Caros Amigos,
A guerra no Iraque, com sua ira que se espalha em todas as direções naquele país, é o demonstrativo exato da brutalidade humana que se repete ao infinito. Ao lado dos tanques, caravana de dor, não ladram os cães, mas inocente criança que parece pedir carona. É a ingênua vida estendendo a mão à morte que passa bem perto.

O poderio das caríssimas máquinas de matar passa solerte e vai cumprir com sua sina de destruir e vitimar. A ira que recobre o Iraque com seu véu escuro, de terrível transparência fria, segue. E deixa atrás de si o rastro dos que foram preparados para conduzir a morte, que de há muito pediu carona nas balas e nos canhões.
Emanoel Barreto

domingo, 10 de fevereiro de 2008

Olha o Obama aí

Caros Amigos,
Sob a proteção do Superman, Barack Obama posa para o futuro. E surge uma pergunta: como reagirá a ultra-direita americana? Será inaceitável a segmentos conservadoress da sociedade norte-americana, a presença de um negro, veja só, na Casa Branca. Não creio que, com ele, haverá mudanças substanciais na política externa dos americanos. Mas, de alguma maneira, seria uma mudança, o surgimento de um novo discurso da presença afro, um embate com o racismo.

Obama, ao colocar-se em comparação com o Superman, atribui a esse comportamento, implicitamente, sua adesão ao establishment, empalmando os valores brancos e dizendo apenas que os negros têm direito a dirigir o país que ajudaram a construir, nada mudando em termos de estrutura ideológica.

De qualquer forma, valeria a tentativa histórica de fazer valer a presença negra e sua importância nas formulações de mundo. Há quem fale que, eleito, em algum ponto do seu mandato seria alvo de atentado. Como se já não bastasse o assassinato de Martin Luther King e a agressão à sua grande pregação em favor dos direitos civis, afinal conquistados pelos negros.

O tempo vai escrevendo a história e cada parte da história tem o seu próprio tempo. George W. Bush riscou o cristal da história com sua guerra e seus terríveis gestos. Obama bem pode ser um bom sinal. Olha o Obama aí, gente!
Emanoel Barreto