sábado, 31 de dezembro de 2011

Uma velha tipografia, uma história... Com este texto despeço-me de 2011



A história do Grão-Louco do Almofariz
Emanoel Barreto

Nobre Senhor,
Sede bem-vindo.

Não sei o que vos trouxe aqui ou se precisais de meus simples labores, visto que os tempos são outros e ambientes como este estão em desuso ou simplesmente desapareceram. O ambiente modesto onde estais , devo informar, é uma tipografia; como já disse, superada e antiga. Era a acá mesmo que tínheis vindo?

Ao que vejo, sim: era acá mesmo que tínheis vido. Entrai, pois. Sou, de profissão, tipógrafo. Aqui ainda trabalho com papel feito de trapos, sendo este o melhor que existe; digo de passagem e com certo afã. Esta profissão se me foi herdada d'um velho monge, que há muito morreu, e em seu monastério mantinha uma prensa d'onde tudo aprendi .

Mas, vinde, vinde. Vede os meus tesouros. Desculpai, a iluminação é baça; é que ainda uso velas, velas de sebo, pois este ambiente é antigo e assim o exige. É que os meus fantasmas, nobres impressores, seres pertinentes, jamais aceitaram que assim não o fosse.

Mas, eis os meus tesouros: as minhas caixas, aprumadas no cavalete. Caixa alta e caixa baixa e seus respectivos caixotins. Letras maíusculas, caixa alta; minúsculas, caixa baixa. Letras lapidadas pelos melhores artesãos de França. Letras das mais diversas e trabalhadas famílias tipográficas. Ricas, belas, expressivas. Muitas deles imprimiram Hugo, Balzac e Zola, tenho certeza. Quanta honra senhor, quanta honra, não é mesmo?

Mas, quereis algo? Alguma impressão a essa hora? Não? Apenas conhecer o que faço e como vivo? Dir-vos-ei: moro aqui, aqui vivo, aqui trabalho. Ali, minha enxerga, donde me alcanço estirado, altas horas da noite. Mais adiante, um velho e pequeno fogão. Ao lado da cama é onde guardo os meus andrajos.

E o que imprimo? Tolices, senhor, tolices. Como em tempos quase já imemoriais lanço ao papel corantos, avisos, gazetas. Neles conto histórias fabulosas: o dragão que surgiu do mar e devorou toda uma aldeia pesqueira; flamejante mulhar que voa em vassoura e atormenta alguma vila perdida em confins, batalhas de grandes cavaleiros, histórias de damas tão gentis, versos de menestréis e viandantes, contos para adormecer crianças e coisas de monstros horrendos. De tudo o que o humano engenho inventivo já imaginou aqui nasce na força destas letras.

Se alguém ainda os compra? Não, senhor. Ninguém. Ninguém compra o que escrevo. E assim, depois de andar o dia inteiro sem adquirir sequer um só ceitil, retorno ao meu tugúrio. Antes porém, de voltar, ando por arrabaldes deserdados. Ali encontro quem me leia. Aproximam-se de mim os desprimorosos e os desvalidos, os aleijados, os tronchos, os alienados e os sem-destino, as súcias e os mandriões. Biltres e velhacos são o meu público.

A eles entrego de graça o que escrevo. E formam-se implausíveis clubes de leitura: cada um que queira ler mais alto e com entonações as estórias que redijo. E como em suas vozes noturnas tudo aquilo se torna galante e de bom feitio. Declamam e empostam os dizeres. Acendemos fogueiras, discutimos as lendas e os mitos, acreditamos em tudo o que escrevi e para nós está tudo muito bom; e após todo o falariço nos despedimos com mesuras e até amanhãs.

Volto então feliz e realizado. Chego, abro a forte porta que protege esta cave e então me tranco. Aqui vivo um silêncio antigo, pesado; silêncio que abraça e protege as coisas que ainda vou escrever.

Como?, o senhor quer um texto? Vou já, senhor, já vou compor. Demora um pouco, pois cada letra é retirada ao seu ninho, ao seu caixotim, para vir repousar na rama. Vou escrever-vos uma hstória: a história do Grão-Louco do Almofariz. O que isso quer dizer? Não, não sei: a ideia vai-me brotando aos poucos, ganha vida e dirige meus dedos. Confiai. Ficará boa a história, muito boa. Como disse, demora um pouco. Meus dedos já não têm tanta agilidade. Enquanto trabalho podeis achegar-vos ao catre e dormir. Quando acordardes, estará pronta a história. Boa noite, senhor. Boa noite. Grato por terdes vindo...

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

O presente capítulo deste folhetim somente será entendido por quem leu os capítulos anteriores

Alberany, o abominável, faz grande fortuna

Em minha fuga deixei o cavalo seguir qualquer estrada, qualquer fosse o rumo. Após horas de fuga terminei no centro de grande e escura floresta onde encontrei soturno acampamento. Reinava ali ambiente de agruras e algum choro. Uma mulher barbada de aspecto terrível aproximou-se e temi estar na presença de uma fúria perigosa. Segui adiante e logo me vi diante de um que parecia ser o chefe daquele ambiente de horrores. Apresentei-me e pedi pouso: - Podeis ficar, mas aqui nada há para um homem decente. Se quereis sorver dos nossos sofrimentos ficai à vontade - foi a resposta.

Indaguei o que se passava e ele explicou: aquilo era um circo falido. A empanada havia pegado fogo e eram tantas as dívidas com o alimento dos animais e das pessoas, em atraso o salário dos artistas, que a miserável companhia havia entrado em total descalabro. Ante tal situação reagi: - Eis aqui, no problema, nossa solução.
http://www.google.com.br/imgres?q=mulher+barbada

O chefe perguntou-me como. Em rápidas palavras expliquei meu plano sinistro e isso o fez sorrir. Vede a seguir como é plena de artimanhas minha inteligência sôfrega de atos deslavados: mandei que se juntassem restos de panos; tais tecidos, sustentados por armação de varas, formaram um grande paralelepípedo de três metros de altura por sete de fundo. Isto feito, rumamos a uma cidade próxima. Pouco antes de nela adentrarmos mandei que um grupo de ordinários entrasse no paralelepípedo e ali acendessem tochas e nos pusemos a caminhar. 

Quem via de fora aquela patranha tinha a impressão de que algo vindo do inferno estava a chegar para o final dos tempos. Seguiu assim nosso maléfico cortejo: a armação flamejante andando pela noite, antecedida por grupo de malfazejos que rufava muitos tambores. Outros sopravam horrendas cornetas. Mais sinistro impossível.

À frente de todos eu, todo vestido de preto. Chegamos à infeliz povoação noite fechada, e qual não foi o espanto de seus honrados moradores. O cura foi tirado de sua casa pelos moradores aos gritos de - Salvai-nos, senhor cura, eis que chegam os loucos do inferno a nos atacar! - o pobre sacerdote saiu à rua e prosternou-se ao chão  pedindo socorro divino. 
http://www.google.com.br/imgres?q=seculo+17&hl=pt-BR&safe=off&client

Aquela infausta procissão cruzava as ruas e os becos levando o terror e o desespero. Eu anunciava: - Chegamos a esta cidade pecadora e exigimos de todos temperança e bondade. O pecado mora em vossos corações. Quem é daqui o maior e responsável? 

Após algum tempo apresentou-se o maior e pediu para saber do que se tratava. Expliquei, enquanto os tambores troavam soturnamente: - Deveis dar o dinheiro devido aos pobres da grande visitação para que tenhais vossos pecados perdoados.

- Quem são os pobres da grande visitação? - indagou o trôpego mandatário. 
- Nós somos os pobres da grande visitação. Estamos percorrendo as cidades onde imperam o pecado e o vício. E todo aquele que paga tem os pecados perdoados - os tambores continuavam sua surda ameaça. Mas a multidão, que aos poucos se acalmava, disse não crer em nós, mesmo vendo que trazíamos o fogo das ameaças. 

Percebendo que a luta não seria fácil, eu disse: - Então, preparai-vos! Sobre esta urbe cairá uma tal fauna de animais perigosos, infames e nocivos que preferiríeis antes a morte. Eia! - e meus sequazes gritaram também: - Eia! - e nos retiramos em meio a grande alarido. 
http://www.google.com.br/imgres?q=mandril&hl=pt-BR&safe

Deixamos seguir a noite; noite seguinte retornamos. O mesmo fogaréu entre os tecidos, o mesmo batecum de tambores. E logo atrás uma leva de animais terríveis: rinocerontes e leões, tigres e hipopótamos, girafas e elefantes. Mandris e outros macacos malignos urravam e bramiam por toda parte. Aranhas e outros bichos perniciosos alarmavam mulheres e crianças. Mosquitos de grande porte enlouqueciam a quem não se protegesse. 

Gritei: - Aqui é o que se passa em tais cidades de gomorreus! Vinde e assisti a vosso próprio sofrimento! Tais bestas não se afastarão antes que pagueis o devido aos pobres da grande visitação!

Instalado o terror, foi o suficiente para que pessoas começassem a admitir culpas escondidas, pecados os mais mal-afamados, procedimentos injustos, tramoias e planos secretos, maus feitos e outras abominações. Aí, começou a aparecer dinheiro de toda parte e nisso fizemos muito gosto. Somente saímos quando as burras estavam cheias, levando para o profundo da floresta o butim daquele saque inominável. 
(Continua)
O imperador na alça de mira

Começa a se tornar ridícula a insistência da Rede Globo em torno do jogador Adriano e seu envolvimento no tiro acidental de uma pistola. O assunto, banal em sua essência, ganhou foros de problema nacional a partir do fato de que envolve pessoa notória em situação negativa. 
http://www.google.com.br/imgres?q=adriano+jogador+tiro+disparo
Vamos analisar a questão por partes: do ponto de vista técnico encontram-se aí valores-notícia suficientes para sua divulgação. Se você não é jornalista, explico: valor-notícia diz respeito a atributos impregnados a um acontecimento suficientemente fortes para que este vire notícia.

Temos então um atleta, famoso até pelo fato de que com alguma constância se envolve em problemas, como aquele acontecimento em que foi de alguma forma flagrado por ter amizade com traficantes. 

Em seguida temos o mesmo atleta envolvido com um tiro disparado no interior do seu caríssimo automóvel quando estava na companhia de mulheres após uma noitada. Eis os valores-notícia. Agora, manter esse assunto em destaque como se fosse uma tragédia nacional...

O que deploro é a forma como se criou sensação em torno do acontecimento. Será que não há nada sério para noticiar? São por aspectos assim que deploro certos tipos de jornalismo: a mais importante TV do país - e suas imitadoras - atuando de maneira a obscurecer aspectos da realidade nacional em favor de um incidente de pessoas que haviam passado a noite numa boate.

O obscurecimento se dá em função de que temos assuntos mais importantes: a insegurança, a desassistência à saúde, as estradas mal-conservadas, a educação sucateada, os gastos abusivos com a Copa do Mundo. Qualquer pauteiro razoavelmente atento pode sacar aí um bom assunto. 

Mas, se o caso é encher o tempo com acontecimentos tipo submundo, então vamos cobrir o depoimento de Adriano, como se deu o disparo, quem atirou, etc..., etc,... etc... E se isso quer dizer um cidadão bem informado, ah, bom!

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Li no Observatório da imprensa

O fim de uma era

Por Leneide Duarte-Plon em 27/12/2011 na edição 674
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Sempre foi e sempre será uma triste tarefa a de noticiar o fim de um jornal. Foi duro para os jornalistas brasileiros verem a lenta decadência do Jornal do Brasil, seu desaparecimento na versão impressa, assim como foi penoso este mês para os jornalistas franceses verem chegar ao fim o France-Soir depois de 67 anos presente no panorama midiático francês.

Libérationdeu capa e a matéria principal de quatro páginas com a história do legendário France-Soir, além de uma análise da situação atual da imprensa francesa e das perspectivas futuras. No editorial assinado, Nicolas Demorand, diretor de Libération, escreveu que “o jornalismo da imprensa escrita é um esporte de combate” parafraseando o documentário sobre Pierre Bourdieu, A sociologia é um esporte de combate, de Pierre Carles. Como o brasileiro, o jornal francês vai manter sua versão online. Na França, France-Soir é o primeiro jornal impresso a parar de circular mantendo a versão online.

France-Soirfora comprado pelo milionário russo Alexandre Pougatchev, de 23 anos, em 2009, por 65 milhões de euros. O pai do jovem é um oligarca próximo de Vladimir Putin e já comprara o gigante da alimentação de luxo francês Hédiard. Mas tendo acumulado um prejuízo em 2010 de 31 milhões de euros, Pougatchev resolveu parar de perder dinheiro com a crescente perda de publicidade e de leitores. A equipe de 130 jornalistas que fazia o jornal impresso foi reduzida a 32 profissionais e o jornal passou a ter apenas uma versão online.

O fim da imprensa como a conhecemos
Criado em 1944 por Robert Salmon e Philippe Viannay, France-Soir é o diário que se originou do jornal clandestino da resistência contra os nazistas, Défense de la France, também fundado pelos dois jornalistas. Na época áurea de Pierre Lazareff, que comprara o jornal de seus fundadores, o jornal chegou a vender 1 milhão de exemplares diários.

O sociólogo Jean-Marie Charon, especialista da mídia, estima que essa tendência de passar do impresso ao web vai continuar na França. Os jornais La Tribune e L’Humanité podem seguir o mesmo caminho de France-Soir e passar a circular unicamente online. Nos Estados Unidos, onde a tendência ao fechamento dos jornais impressos é crescente, a imprensa diária já suprimiu 10 mil empregos desde 2007. Segundo o jornal Le Parisien, outro diário que migra lentamente para a internet, dois terços dos franceses se informa hoje pela internet.

Jean-Marie Charon arrisca uma profecia de especialista. Segundo ele, os cotidianos vão cada vez mais migrar para a internet. Alguns jornais manterão uma versão impressa apenas alguns dias da semana; outros, apenas um dia por semana. Ligados dia e noite no smartphone, no rádio e na TV, os leitores não têm mais tempo de ler um jornal impresso todo dia. E as novas gerações não formaram o hábito da relação sensorial, indispensável para alguns, do leitor com o papel do jornal.

Sem dúvida, o desaparecimento de uma geração que ainda compra ou assina um ou mais jornais diários marcará o fim da imprensa como nós a conhecemos.
***
[Leneide Duarte-Plon é jornalista, em Paris]

Alberany, o abominável, recebe dura punição do povo (O leitor precisará ler o capítulo anterior para compreender este capítulo)

O santo que caiu de uma árvore 

Após escapar do cárcere à testa de uma récua de indivíduos péssimos e de haver recolhido dinheiro de tolos que nos supunham santos homens dedicados ao bem e à temperança, dirigi-me com meus patifes a uma taberna onde gastamos à larga. Ali também chegou um sério e bom eremita que tentou fazer a nossa denunciação, mas foi por nós posto abaixo com vigoroso golpe na cabeça. 
http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=777

O bondadoso homem, todavia, transformara-se ao receber o ataque. Alguma coisa mudou em si devido àquele golpe. Assim, ao acordar, em vez de defender a paz e o bem, os bons ajustes e as cousas calmantes, deu mostras de que se tornara um bandido e um velhaco, portanto igual a mim e aos meus demais e nisso achamos muito gosto.


Ao acordar gritou impropérios e disse que queria falar com o chefe daquela caterva e me apresentei. Eis o que me então propôs: levar adiante grandes planos salafrários. Então, meu amigo, aquele que estivera comigo na masmorra, apresentou uma ideia logo por nós aprovada. Para levá-la a cabo eram precisas redes, dessas de pesca, e logo as adquirimos. Caso o plano desse certo teríamos dinheiro e tudo o mais até o fim dos nossos dias. 
http://www.google.com.br/imgres?q=multidoes+sec+17


Veja, ínclito leitor, o que aconteceu: meu amigo já havia ganho garrafas de bebidas do carcereiro dizendo que estas serviriam para os santos e os anjos que nos últimos tempos se davam à bebedeira, a fim de pelo álcoos ampliar seus altíssimos pensamentos. Agora, todavia, diríamos ao povo que tais e excelsas criaturas davam-se ao "lamentável vício do álcool" e que nós - os farsantes, os periculosos -, éramos os novos santos e todos nos deviam dar óbolos. 


Mas, antes, seria preciso que todos nos ajudassem a capturar com as redes os santos e os anjos beberrões, a fim de metê-los e ferros em profundas masmorras. E enquanto isso não acontecesse, a captura de algum ser celestial, a população deveria nos conferir dízimos, a fim de garantir aquela grande campanha: verbas para a construção da cadeia dos santos e dos anjos.


Então partimos para as ruas, cada um levando ou um saco para pedir dinheiro ou uma rede para prender um santo. Eu gritei: "Ó boas pessoas, ajudai-nos nesta faina! Eis que santos e anjos estão dados ao vício do álcool e estão em desgraça e decaídos! Sejam eles presos e agrilhoados e subiremos nós, homens justos e readores, à condição de santos e de anjos! Somos os novos santos e anjos."
http://www.google.com.br/imgres?q=multid%

Um bobo perguntou: - Sois os novos santos e anjos? - a isso respondemos "sim" e mostramos cruzes e objetos santos e todos acreditaram. 


E começamos a jogar as redes para o ar e a pedir dinheiro aos tolos. E dinheiro se deu em grande profusão. Mas as redes não capturavam santo algum, anjos menos ainda. As pessoas já começavam a desconfiar daquela bazófia quando uma rede foi para o alto atirada e pegou alguma coisa, que veio abaixo, enredada.


Rápido, meu amigo gritou: "Pegamos um santo! Pegamos um santo!" - todos acorreram para ver um santo pela primeira vez. Na verdade, era o seguinte: a rede havia se prendido aos galhos de uma árvore, onde se escondia um indivíduo ordinário. Um reles ladrão de galinhas, que fugira da multidão ao raiar do dia quando estava metido nos fundos de uma casa a furtar. Ao ser visto subira na árvore; e nosso alarido o estava beneficiado pois dele desviara a atenção. 

http://www.google.com.br/imgres?q=santo+prociss
Agora estava ao chão e todos gritavam "pegamos um santo". Um dos nossos logo se exarcebou: "Vamos justiçar este maldito santo! Tem-se dado ao vício do álcool! Vamos punir este santo dos infernos! Bebe vinhos com o diabo! "

E a multidão: - Óóóóóóóóóóóóóóóóóóóóóóóóóóóóóóó´!!!!
E alguém grutou: - Este santo é um procrastinador - e a multidão repetia: - Procrastinador! Procrastinador! Santo procrastinador, dado à prática de atos abomináveis!

Algum do povo urrou: - Meu Deus, este santo é um procrastinador?

Todos gritaram: - Sim! Sim, ele o é!!!


Então alguém perguntou que pecado era aquele, "procrastinador". Ninguém sabia, mas devia ser cousa séria e de muitos maus ditames. E isto posto partiram para cima do santo, a surrá-lo: "Santo procrastinador! Maldito seja um tal santo! 

Em meio à confusão meus asseclas pediam mais dinheiro, explicando que além da construção da prisão para os santos era preciso pagar os advogados que iriam acusar aquela santo de alta traição sacramental. E o dinheiro jorrava.


Aí algo aconteceu: o indivíduo, que conforme eu disse, era um finório, mostrou toda a sua aptidão. Erguendo-se num salto contra-atacou: sua roupa negra, seu chapelão de abas, o cajado e sua altura imponente o fazam temível. E percebendo ser chamado de "santo", tendo a multidão aparentemente esquecido que era um biltre e ladrão de galinhas, eis o que fez o pelintra, quando disse:

- Ó fiéis seguidores do bem e dos leais sentimentos; morígeros servidores da temperança. Eis que me encontro aqui em viagem de observação desta mundo tão vão e tão sofrido, quando sou alcançado por rede infame e que me aperta. E assim me dizem santo decaído e mau ente celestial, dado a bebedeiras - ao ouvir tais palavras a multidão silenciou e mostrou respeito. Comecei a ver que estava metido com salafrário igual a mim e dele me atemorizei, pois percebi onde queria chegar.


Ele continuou: - Destarte, digo-vos que sois vítimas de insolente grupo de malvados, homens sem lei e sem registro, que se apoderaram de minha pessoa celestial e agora querem me pôr a ferros e me entregar a Hedores. 

A multidão horrorizou-se: - Hedores? Querem entregar o santo a Hedores?

- Sim, sim - respondeu o detestavél elemento - Serei entregue eu àquele ímpio e serei decapitado! - a multidão arregalava os olhos. Iam matar um santo! E um santo morto pelas mãos de Herodes!


- Assim - continuou o falastrão - promovo a consigna de que devereis libertar-me e pôr a ferros os malditos que me aprisionam. E dai-me também todo o dinheiro que recolhestes. E bestas de carga e  um bom cavalo, que retornarei à Terra Santa para adorações e outros gestos pios. 


Foi o suficiente. O povo juntou-se raivoso e nos atacou. O velho anacoreta que me havia incentivado àquela loucura partiu em rumo ignorado, escapando por pouco de ser morto. Eu atirei-me a correr sob chuva de paus e de pedras, e o farsante que me vinha acompanhando perdeu-se nos profundos de uma floresta. Neste momento encontro-me no lombo de um bom cavalo e busco apenas salvar a vida.
(Continua)

DEPUTADA CONSTRANGE TODO PLENÁRIO (INCRIVEL!!!!) - ASSISTA ISSO... - "RU...

sábado, 24 de dezembro de 2011

O tempo não destroi aquilo que ele mesmo ajudou a construir.

O rio turbulento é apenas o motivo para que a ponte que o supera seja mais forte e mais bela. 

Feliz natal.

Deu na Folha

Atriz de "A Doce Vida" pede dinheiro para sobreviver


DA FRANCE PRESSE, EM ROMA
A atriz sueca Anita Ekberg, ícone do cinema e que em setembro completou 80 anos, empobreceu a ponto de ter que pedir ajuda financeira à fundação do célebre cineasta italiano Federico Fellini, informou nesta sexta-feira o jornal "La Stampa", da cidade de Turim. 

"Não é elegante dizê-lo, mas a senhora Ekberg sofre de uma verdadeira falta de liquidez", disse ao jornal Massimo Morais, um administrador nomeado pela Justiça e que pediu em nome da atriz os subsídios de emergência da Fundação Fellini.
"A fundação ainda não respondeu, mas eu conto com a solidariedade dos benfeitores, que queiram ajudar, mesmo modestamente, uma grande atriz que merece", disse. 

A atriz marcou a história do cinema com uma lendária sequência no filme "A Doce Vida" (dirigido por Fellini em 1960) rodado junto à Fontana de Trevi e na qual Ekberg atua junto a Marcello Mastroianni. Ekberg agora vive em um asilo perto de Roma.

Divulgação
A atriz Anita Ekberg em cena do fime "A Doce Vida", de 1960
A atriz Anita Ekberg em cena do fime "A Doce Vida", de 1960  
Limitada a uma cadeira de rodas desde que quebrou o fêmur em uma queda, Ekberg teve que deixar sua casa depois de um incêndio provocado por ladrões. Além de alguns vizinhos e dos serviços sociais, a diva recebe poucas visitas e passa o tempo escrevendo suas memória. 

Ao celebrar seus 80 anos, em setembro, a atriz admitiu em uma entrevista que se sentia "um pouco sozinha". "Os dias são infinitamente longos", disse ao jornal "Il Corriere della Sera".

Alberany, o abominável, recebe a ajuda de uma mosca e consegue escapar de juiz insensível. (O leitor precisará ler o capítulo anterior para compreender este capítulo))

Alberany transforma sua prisão em formidável procissão de infames perdulários

Ora, metido eu naquela infecta masmorra pensava em como dela me livrar. Enquanto isso, meu amigo, homem de esperteza salafrária, buscava amenizar ali os nossos dias. Utilizando-se de toda a sua astúcia dirigiu-se ao carcereiro, sujeito de modesta inteligência. Como nos haviam permitido ficar com nossos andrajos de falsos eremitas ele vestiu aquela lamentável roupagem, pegou do cajado e assim falou ao pobre idiota:
- Ó bondoso servidor do Altíssimo. Eis que chegou a hora de honrar o divino.

O carcereiro estranhou o manhoso procedimento. Mas veio ver do que se falava e o tratante assim o enganou: - Ó amável ser que povoa este antro com sabedoria e luz. Preciso falar-vos em nome de Deus.

- O que quereis de mim, prisioneiro? - o pobre homem se acautelava. Mas o malandrim que o assediava era calejado na arte de engabelar. Afirmou-se um eremita a serviço do Papa e preso ali por equívoco. E, respondendo à pergunta do carcereiro, disse:
- Nada desejo, a não ser a salvação de vossa alma. E que presteis serviços aos anjos e aos santos - o pobre homem era um temente. E ao ouvir tais palavras arregalou os olhos e perguntou o que seriam esses tais serviços e como poderia prestá-los. O magano não se fez de rogado e disse:
-  Saibais que nos últimos tempos os santos e os ajnos deram-se a beber vinhos e outras bebidas espirituosas, quero dizer destiladas, para ampliar seus altíssimos pensamentos. E assim, sendo eu e meu companheiro homens rezadores e dados a transes místicos, recebemos dos anjos e dos santos incumbência de adquirir tais artifícios e com tais nos aprofundarmos no contato com as entidades superiores. E trazei-me também pão e leite, que nem só de espírito vivem os santos.

Meu amigo tinha um jeito imponente de falar e isso conveio a seus malsinados intentos. O miserável carcereiro atirou-se de joelhos aos pés daquele sequaz da patifaria orando as pobres coisas que sabia orar. Logo saiu e retornou, vergado ao peso de grande carga de vinhos, bebidas destiladas e os alimentos pedidos. Não é preciso dizer que com isso empenhou sau paupérrimo salário. 

A masmora, assim, transformou-se numa festa. Meu amigo e eu, dizendo palavras sem sentido e inventadas, simulávamos transe sob o olhar apatetado do carcereiro. Depois íamos descansar. Porém, passavam-se os dias e coisas aconteciam. Como a vinda novos presos, homens deploráveis, tipos iguais a nós, perniciosos. Logo tínhamos ali um magote de malfazejos da pior espécie. Espertamente começamos a cantar hinos e louvores e logo tínhamos uma seita de safados a explorar o mísero carcereiro.

Mas, ai, o tempo passava e eu sabia que a mão da justiça cairia sobre mim. Eis então que aconteceu algo inesperado. Uma mosca apareceu na nossa cela e, por artes não sei do quê, seu zumbido a mim se assemelhou a uma voz e ela me dizia que poderia ajudar-me. Estupefato por estar falando com um animal, e animal tão horrendo,contei-lhe a minha desdita e ela assegurou que poderia efetivamente livrar-me da prisão. 

Explicou-me com um bater de asas que os prisioneiros dali eram sempre julgados por dois juízes: um, probo e justo e esse seria bom para mim, pois, quando lhe explicasse que era apenas um patife espertalhão, não um parricida, saberia dar-me pena mais modesta; quanto ao outro, era homem da mão pesada, dado a fraudar processos, tomar para si as coisas dos pobres e das viúvas e aplicar penas duríssimas ao mais pequeno furto, caso o apenado nada lhe desse em troca. E contou-me tudo a respeito do funesto elemento, dizendo que, na audiência, eu deveria insinuar ter conhecimento da vida privada do magistrado que, em público, aparecia como homem honrado. De posse de tais conhecimentos preparei-me para enfrentá-lo.

Veio afinal o dia do interrogatório. Eu e meu detestável amigo fomos levados à presença do juiz. Era justamente o molesto magistrado, que assim tratou-me: - Ah, temos aqui dois mouros, heim? Sois mouros, pois não? Tendes todos os jeitos de mouros...

Senti que estava às voltas com um pergosíssimo embusteiro, talvez pior do que eu ou pelo menos igual a mim, só que do lado oposto. Defendi-me. Ele contra-atacou: - Então, se não sois mouros sois certamente marranos, solertes e febris em vossos intentos - garanti que não, mas ele insistiu: - Sois sim, sois feiticeiros e, vós, um parricida. 

Nisso, vi a mosca voejando ao retor de minha cabeça, orientando-me a reagir. Foi o que fiz. Pedi a palavra, o juiz deu-ma e contra ele investi, blandicioso: - Ó judicioso magistrado, homem de benquerenças com a Justiça! Sei que sois altaneiro e sábio em vossas decisões! Sei, por exemplo, que respeitais vossas criadas, sem delas abusar, e sustentais os pobres e as viúvas sem de suas bocas retirar o pão. E que em vossas terras todos ganham o almoço e janta cantando no cultivo das videiras, e que tendes apenas uma mulher e digníssima esposa. E somente com ela tendes filhos, sem jamais, no exercício da magistratura, haver claudicado em favor dos fortes e dos opressores. E acima de tudo, sois leal a El Rey, sem se apoderar dos impostos a ele devidos.

Eu sabia pela mosca que o juiz era exatamente o contrário de tudo aquilo. E ele, sentindo-se atacado perante a corte que presidia, à frente do capitão da guarda, dos guardas e do povo em geral que a tudo assistia, percebeu a minha insinuação e a minha manha. Notei pelo seu olhar que o havia encurralado. 

Ele pediu o processo, leu-o e permitiu que me defendesse. Especialmente da acusação de parricídio. Minha defesa foi altaneira e forte e afinal, tendo o juiz subjugado, fiz meu ataque final. Reafirmei que éramos, eu e meu amigo, homens santos a serviço do Papa em pregação pela Cruzada, a última, a que libertaria a Terra Santa das mãos dos mouros, e mais: queria ser libertado juntamente com a súcia que ficara na masmorra, pois eram todos homens de rezas e de expiações e com eles iria continuar aquela santa luta. 

O juiz, apavorado, declarou: - Ó homens de lei e de justiça forte. Fostes, vós e vossos seguidores lídimos, perseguidos por equívoco judicial e por infame e turbulenta multidão, avara de justiça. Estais livres para o exercício do vosso mister. Ide e pregai a palavra da salvação e da bondade. E para que tenhais de mim a certeza de magistratura altíssima, dou-vos estas moedas de ouro a fim de contribuir com a vossa e augusta causa! Eia!


Isto feito, entregou-me o dinheiro, libertou-me das cadeias, a mim e ao salafrário que me acompanhava, e determinou imediata soltura dos infames lá na masmora. Saímos todos pela cidade, uma malta de maus praticantes. Notícia espalhou-se pela cidade: um grupo de santos homens havia sido libertado por bondoso juiz e agora pedia esmolas para libertar a Terra Santa; seria a última Cruzada, depois de centenas de anos da última surtida daquela virtuosa guerra.


Pessoas boas e tolas nos paravam nas ruas para nos encher os bolsos e os sacos. Assim, ao final do dia já tinhamos uma bela fortuna. Dirigimo-nos a uma casa de tavolagem e ali, sob o argumento de saudação aos santos e aos anjos, que nos últimos tempos haviam se dedicado à beberagem, como meu amigo sempre anunciava, promovemos grande esbórnia. E chegando entre nós um velho em andrajos, ele sim, um verdadeiro eremita, acusou-nos de falsários e mandriões. E já intentava levantar o povo em protesto, quando o silenciamos com vigoroso golpe na cabeça.
(Continua)

 
Presépio

--- Walter Medeiros

 Vi trinta Presépios de gênios,
 Onde a luz do mundo se confunde
 Com a beleza do Menino Jesus,
 De manjedoura tão rústica,
 Os visitantes atentos e curiosos,
 Os anjos espreitando cada hora,
 A apreensão de Nossa Senhora,
 São José com seu cajado forte,
 Os animais de olhos e focinhos,
 E a paisagem de Jerusalém.

 Vi Nossa Senhora em oração
 Sentindo o cheiro das folhas,
 Imaginando o destino do Filho,
 E os visitantes de todo mundo,
 Amigos, parentes e até reis,
 Cada um com suas intenções,
 E a notícia, que ia se espalhando,
 De que ao mundo estava chegando
 Para a terra o Messias Salvador
 Num Manto branco de paz.

 Vi o silêncio que tudo rondava
 Naquela noite do mês de dezembro,
 Com aquelas expressões de dúvida,
 Peregrinos levados pela fé
 Contemplando com firmeza o bebê
 Naquele ambiente de beleza,
 Apesar da pobreza que se vê,
 Rodeado de uma santa nobreza
 Superior a qualquer realeza
 Que os homens inda iam conhecer.

 Vi a glória da confraternização,
 Músicas saudando o Filho de Deus,
 O ar tomado por divina canção
 E um pequeno pássaro no telhado,
 Auréolas e mais auréolas belas
 Fazendo do estábulo um santuário,
 E daquela cobertura um altar,
 Conectado com a luz do Céu
 Para anunciar a chegada da vida
 Daquele que seria a maior paixão.

 Vi as essências daquele Mistério
 Que preenchia tudo de beleza,
 Realçando cada grão da natureza
 Nas mãos postas e olhar bondoso,
 Fazendo da pedra o berço do Divino,
 Parecendo frágil e pequenino,
 Como que num aplauso geral
 Pelas mãos sempre tão postas
 De tanto júbilo então sentido,
 Como que um encanto esclarecido.

 Vi as flores e folhas perfumadas,
 Borboletas rondando o lugar,
 O destino se formando devagar,
 O menino se mexendo e sentindo,
 O Espírito Santo com seu brilho,
 E o fogo aceso em cada canto,
 Uns presentes de longe lhe chegando,
 Por Belchior, Gaspar e Baltazar,
 A estrela no alto a orientar
 O caminho para o novo anunciado.

 Vi o rio banhando aquela terra,
 Jesus no colo da amada Mãe,
 O Pai pensativo pela relva,
 Mas uma coisa faltou fazerem,
 Não vi em nenhum quadro do mundo
 O sorriso de Nossa Senhora,
 Pois por mais tensa fosse a hora
 A Mãe regeu uma alegria
 Surgida justo naquele dia
 Em que o seu Filho ali nasceu.