quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

A violência no Brasil ou viva nossa baderna



 A história do homem suspeito de ser sequestrado

http://www.ouricuriemfoco.com.br/mulher-e-filhos-sao-sequestrados-e-feitos-refens-em-assalto-em-pe/
Conto aqui caso gravíssimo que aconteceu no território da minha imaginação brasileira: um homem foi suspeito de ser sequestrado e passou horrores. 

Foi o seguinte: a manchete do principal jornal da cidade anunciou que um grande comerciante estava sob suspeita de ter sido sequestrado. Imediatamente as polícias civil, militar e federal entraram em estado de alerta porque quem é suspeito é suspeito de algo, ou seja: o verbo suspeitar sugere que o sujeito alvo da suspeição é praticante de crime. Se não fosse assim, não seria um suspeito.
Ora, o homem, que tinha sido sequestrado mesmo, estava padecendo em seu cativeiro. Enquanto isso as polícias ativavam seus serviços de inteligência para que fosse capturado. Quando o cativeiro foi estourado pela polícia civil lá estava o pobre: acorrentado e amordaçado. Os bandidos haviam fugido minutos antes. 
Então, estando sob cárcere privado, ou seja, confirmado o sequestro, havia ali prova material de que o homem era realmente culpado por ter sido sequestrado. Caso contrário, não estaria ali, em local típico de criminosos.
Quando os agentes saíam com o agora bandido, que alegava aos brados que não era bandido, mas empresário, portanto pessoa ordeira e, mais que isso, vítima, chegaram os policiais militares.
Imediatamente deram voz de prisão a todos. E de nada adiantou os policiais civis afirmar que eram agentes da lei: os soldados disseram que, se estavam em companhia de criminoso ocorria ali a formação de bando ou quadrilha e assim policiais civis e empresário foram postos em camburões.
Quando já seguiam para a delegacia, chega a polícia federal que por sua vez também prende a todos sob a mesma alegação: formação de quadrilha, crime agravado por serem todos homens da lei, conluiados com homem suspeito de ter sido sequestrado. 
A polícia federal então pensou em levar todo o já enorme grupo à prisão quando a Força Nacional de Segurança ia passando e, ao ver aquele amontoado, capturou a todos imediatamente.
Estabeleceu-se então grande tumulto e começou um tiroteio. Alguém chamou as Forças Armadas, pois pensou-se que ali havia algum tipo de levante, revolta, até mesmo revolução, luta armada. 
Então todo mundo começou a prender todo mundo e, ao final das contas, todo o aparelho armado do país estava envolvido e todos prenderam a todos, incluindo a população, que em meio a gritos de "o povo unido jamais será vencido “configurou situação de ato subversivo e todo subversivo deve ser tirado de circulação. 

Em meio à sedição agora instalada coube a um bandido, chefe da pior quadrilha do país, ter uma ideia: sequestrar alguém para pedir resgate. Pior: a quadrilha sequestrou todo mundo para garantir um bom lucro. Mas como todos estavam sequestrados não havia ninguém a quem cobrar o tal resgate.
 Assim a quadrilha denunciou à Justiça que tinha uma grande fortuna a receber, mas as famílias dos sequestrados não assumiam suas responsabilidades de devedores. O juiz do caso entendeu que a quadrilha tinha razão, uma vez que como trabalhadores do crime os criminosos tinham legalmente direito a seu salário.
Como solução decidiu-se que os bandidos teriam direito a assaltar um banco para ressarcimento de danos morais e materiais. Eles foram a assaltaram. Como garantia levaram o gerente de refém. E o gerente passou a ser suspeito de ser sequestrado.
Nesse momento todos esqueceram do sequestro anterior e de todas as suas loucas consequências e passaram a perseguir o agora novo suspeito. Isto posto, tudo voltou à normalidade, mas até agora o gerente não foi capturado.





terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Capa da Folha de S. Paulo

O laissez faire do crime

Ao que venho observando, o fenômeno das organizações criminosas no país evoluiu da simples formação de quadrilhas para a estruturação de grupos orgânicos e identitários que agem à moda de empresas: têm seus mentores, métodos, técnicas e setores que cuidam da administração de, digamos, custos, investimentos e lucros das organizações.
Funcionam até mesmo como se fossem franquias. Acima de tudo têm como cimento social o sentimento pertencer a algo, a uma espécie de classe, sistema humano que mobiliza laços de solidariedade e afetividade; seriam, talvez se possa dizer, como uma fraternidade criminal, o crime como entidade formulada a partir de uma ética paradoxal a unir seus praticantes.
No Rio Grande do Norte as últimas explosões de violência em Alcaçuz dão o exato poder de fogo dos bandidos. De um modo geral o governo do estado nada fez de concreto e efetivo para enfrentar, muito menos conter, sequer reduzir a capacidade do crime organizado.
A Polícia Militar não patrulha as ruas de Natal e grande Natal; assaltos e mortes ocorrem com precisão cotidiana como se fossem fatos programados, necessários à vida de todo dia. Há um sentimento de medo quando alguém entra num ônibus ou caminha por uma rua escura.
As falhas da segurança, agora em plano nacional, vão desde a ineficácia do policiamento e corrupção da força pública até falta de equipamento e falta de um sistema de inteligência que rastreie as contas das quadrilhas – que têm vida bancária como se fossem empresas legalizadas.
É preciso estancar o fluxo de caixa dos criminosos, como também é necessário e urgente um grande esforço na fronteira oeste do país, impedindo o ingresso de armas e drogas.
A tarefa é complexa e exige ação preventivo-repressiva, bem como firmeza ao longo do tempo para que surjam os efeitos desejados.
Enquanto isso não acontece – devido à molícia, frouxidão e relaxo das ditas autoridades – o crime sempre estará à frente. Cada vez mais organizado e atuante.
Vivemos no Brasil uma espécie de liberalismo criminal. A omissão das autoridades permitindo algo como um laissez faire ao mercado do crime que tem na sociedade uma mercadoria a ser pilhada, usada e brutalizada.
Os políticos e os ricos estarão sempre à salvo, entocados e intocados no poder, enquanto o restante da sociedade estará sempre na mira. E sem ter a quem apelar.
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Os privilegiados vão bem, obrigado
A matéria encontrei no UOL Economia.
Os seis homens mais ricos do Brasil concentram a mesma riqueza que toda a metade mais pobre da população do país (mais de 100 milhões de brasileiros), segundo o relatório da ONG Oxfam divulgado nesta semana.
A ONG britânica de assistência social e combate à pobreza usa como base levantamentos sobre bilionários da revista "Forbes" e dados sobre a riqueza no mundo de um relatório do banco Credit Suisse.
De acordo com a "Forbes", as seis pessoas mais ricas do Brasil são:
  • Jorge Paulo Lemann, sócio da Ambev (dona das marcas Skol, Brahma e Antarctica) e dono de marcas como Budweiser, Burger King e Heinz
  • Joseph Safra, dono do banco Safra
  • Marcel Herrmann Telles, sócio da Ambev e dono de marcas como Budweiser, Burger King e Heinz
  • Carlos Alberto Sicupira, sócio da Ambev e dono de marcas como Budweiser, Burger King e Heinz
  • Eduardo Saverin, cofundador do Facebook
  • João Roberto Marinho, herdeiro do grupo Globo
A fortuna somada desses seis empresários era de US$ 79,8 bilhões (cerca de R$ 258 bilhões) em 2016, de acordo com a "Forbes".
http://t.dynad.net/pc/?dc=5550001892;ord=1484657036875
Na sexta posição entre os mais ricos do país, João Roberto Marinho aparece empatado com seus dois irmãos, José Roberto Marinho e Roberto Irineu Marinho, com patrimônio estimado em R$ 13,92 bilhões cada um. Se fosse considerado o patrimônio dos três irmãos juntos, a desigualdade seria ainda maior, segundo a Oxfam.






segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

A marca da brutalidade



O direito de ser bandido

A violência no Brasil é sistêmica, complexa e, pela forma como se apresenta, organizada e enraizada, dificilmente será vencida.
http://informebaiano.com.br/tag/bandidos
Vejamos: é preciso entender que a violência está dentro dos presídios mas mantém firme conexão com os atos criminosos que se dão fora deles, inter-influenciando-se mutuamente.
Além disso, as causas históricas do fenômeno criminal permanecem inalteradas secularmente, num perverso processo de marginalização que leva muitos à prática de delitos como se aquela fosse forma aceitável de viver.
As causas históricas manifestam-se nos baixos salários pagos pela iniciativa privada – e no seu inverso: os segmentos estamentais eternizados em situação privilegiada: régias remunerações contemplam o judiciário, a alta oficialidade das forças armadas, políticos profissionais e setores do funcionalismo público.
Junte-se a tal fato a corrupção perpetrada pelo alto empresariado junto a agentes públicos – agregando-se a isso a sonegação de impostos – e temos a receita social perfeita e o caldo de cultura exato a propiciar o encaminhamento do indivíduo socialmente desvalido ao crime.
Com o Estado aparelhado e tornado meio de vida para os privilegiados todo o dinheiro que deveria estar ao dispor da sociedade vai parar em poucas contas bancárias. Simplificando: falta dinheiro para as funções sociais da instituição estatal.
E muitos jovens que vivem um cotidiano de privações e fome compreendem-se como membros de alguma forma de sociedade marginal e passam a vivenciá-la. Entendem-se como se tivessem o “direito” de ser criminosos.
Ou seja: nas favelas e arrabaldes esse tipo de pensamento passa a ser compartilhado, torna-se um valor, uma espécie de crença, uma maneira de experienciar a existência e uma forma de ser no mundo.
Então, imbuído de tais princípios, o indivíduo passa a cometer atrocidades com grande desenvoltura e sem qualquer senso de culpa. Torna-se convicto. Mata e agride com a mesma naturalidade que um trabalhador ergue uma parede ou pega um ônibus de volta à casa. É o “direito” de ser criminoso.
Entre os criminosos e os privilegiados há um abismo profundo. As elites não estão dispostas a ceder seus privilégios, os bandidos reagem. E  o resultado é o que temos: presídios explodindo, o terror batendo à sua porta.
O Estado não tem como garantir ao trabalhador integridade física, bem-estar, sossego, tranquilidade, saúde, educação, cultura, transporte, dignidade.
Também não consegue ser eficaz na busca de levar adiante ações repressivo-preventivas para enfrentar aqueles que estão no caminho do crime, ofendendo os que trabalham.
E chegamos ao atual ponto: uma situação insustentável, especialmente pelo fato de que os criminosos já vivem seu sentimento de pertença a um grupo e entendem a sociedade como sua presa legítima.
Caso não haja uma profunda revisão de valores, caso os dinheiros públicos não venham a ter devida aplicação. E mantendo-se – como serão mantidos– os privilégios e a corrupção, a tendência do quadro é de constante agravamento.
O “direito de ser criminoso” crescerá, e os bandidos, identitários e armados, continuarão a disseminar a violência e a morte. Recolhidos aos presídios continuarão a exercitar bestialidade e horror. 

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