quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

 Bolsonaro e o voo do urubu

Por Emanoel Barreto

Uma assertiva pode ser verdadeira enquanto construção frasal, mas totalmente falsa como representação da realidade. Explico de maneira bem simples. Veja a seguinte frase: “Quando for viajar para lugares distantes não vá de avião; vá de urubu, pois jamais se ouviu dizer ‘Um urubu caiu, matando todos os seus ocupantes.’”

É inteiramente verdadeiro que um urubu jamais caiu matando todos os seus ocupantes. Mas, fora do universo da frase, a afirmação não se sustenta, uma vez que é impossível viajar de urubu. Simples assim.

Apesar de tudo, foi justamente isso que aconteceu no Brasil. O urubu Bolsonaro apresentou-se como o transporte ideal para fazer do país uma nação de aloprados, foi ouvido por uma parte do eleitorado que embarcou no escalafobético projeto e levou junto quem queria um país melhor, mais justo e civilizado. 

O resultado, como seria de se esperar, foi o desastre que todos vivemos: Bolsonaro foi o único urubu no mundo a dar carona a passageiros, caiu junto com seus ocupantes, deixou o país à deriva, forças do atraso ocuparam espaços no governo e a violência do bolsonarismo transformou-se numa forma de fazer política, um fenômeno aterrorizante.

A memória histórica recente nos recorda que em 2018 o suposto atentado a faca sofrido pelo então candidato deu grande alento às propostas brutas de Bolsonaro, o país viveu um surto de comunicação patológica, ele foi guinchado à presidência e tipos medíocres, candidatos que seriam relegados ao lixo da História acabaram eleitos como deputados, senadores e governadores.

Tudo graças ao urubu Bolsonaro, que com uma mensagem reles, um discurso básico e o ato dramático do seu suposto esfaqueamento, como se fosse César morrendo no senado romano, levou multidões de insensatos a elevar-lhe nuvens de incenso ao som do urro “Mi-tô!, mi-tô!, mi-tô!

O tempo passou e mudanças aconteceram. Hoje vivemos um novo tempo; assim, você for viajar e lhe oferecerem passagem gratuita nas asas de um urubu vá a pé. Pode demorar, mas você chega - pois nunca se ouviu dizer que urubu seja avião. Só na cabeça de Bolsonaro. 

  

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

Dia 8 de janeiro: o dia em que a direita fracassou

Por Emanoel Barreto

A eleição de Lula representou mais do que a sua escolha como sucessor de Jair Bolsonaro. A alternância no Poder representou a escolha do retorno do País aos caminhos civilizatórios, a substituição do arbítrio, ignorância e boçalidade pelo respeito à Constituição, a derrocada do fascismo que se pretendia implantar como estatuto de existência da sociedade, tornando-se o Estado fiador de um status quo nitidamente inspirado no nazifascismo sob o lema Brasil acima de tudo, consigna também adotado por Adolf Hitler.

E tão radical, insana, violenta e fanática é a vivência do bolsonarismo como doutrina mequetrefe, aliada ao mais ralo e rasteiro senso-comum, que há um mês tínhamos em Brasília a intentona que tentou miseravelmente levar adiante um golpe de Estado. O monumental fracasso pôs fim a tal projeto.

Viu-se ali, ao vivo e em cores, como as forças do fascismo agem expressando todo o seu ódio intenso e sincero. O que se ouviu foi o grito, o discurso da brutalidade mais densa e adoidada, que manifestou-se no quebra-quebra e caos instalado com o apoio de setores das Forças da legalidade, uns poucos que cederam aos berros do porrete fascista.

Tivéssemos agora outro presidente e estaria o Brasil mergulhado num lodaçal medonho, onde política, religião e pactos terríveis com segmentos os mais reacionários poderiam até mesmo nos encaminhar aos abismos de algum tipo de república teocrática ou algo que o valha.

Diante de tudo o que aconteceu, da luta que se travou contra o bolsonarismo, da doutrina chã e estúpida que ainda o nutre apesar da aparente e inicial decadência, havia uma escolha a fazer: nenhum outro, a não ser Lula, teria condições de enfrentar o minotauro Bolsonaro e vencê-lo; qualquer outro teria sido derrotado.

Não digo que temos o estadista perfeito, o ser humano radioso, o grande condutor, o político completo, o perfil ateniense do ideal da democracia. Não, mas afirmo Lula que é a figura histórica que mais se aproximou e se aproxima do que se busca para o respeito ao processo civilizatório.

O dilema era o seguinte: eleger aquele que hoje preside o País ou o urro de um minotauro; a palavra de quem busca o esclarecimento ou o murro da estupidez.

Os atos de há um mês provam que escapamos por pouco de involuirmos à mais miserável situação política, submetidos ao lema suarento e sujo do nazifascismo.

PS: a tragédia dos yanomami é a prova concreta do que digo.

 

 


 É preciso retirar os malditos,

respeitar os yanomami

Por Emanoel Barreto

A tragédia Yanomami, impulsionada vigorosamente por Bolsonaro quando abriu as porteiras do inferno, da destruição e do descalabro ao garimpo estúpido e seus grandes financiadores, ainda hoje ocultos, é o visor por onde podemos observar a histórica e desastrosa presença do dito progresso acossando os povos ancestrais.

Tudo começou há séculos, com os contatos do europeu com os indígenas, aqui e em todos os locais onde havia povos autóctones. O expansionismo europeu resultou no surgimento de colônias e depois em países independentes e urbanizados, que cxobiçavam as terras ocupadas pelos... bárbaros. Ao longo do processo os naturais da terra foram expulsos, isolados, cercados em reservas, mortos...

Junto a isso todo um processo de descaracterização e busca da aculturação via catequese, “civilização dos silvícolas”, suposta elevação de seus padrões morais e uma hipócrita inclusão daqueles em nossos usos e costumes. Deu no que deu.

Na verdade, o que havia era a destruição de muitas culturas, abalo de modos de vida inteiramente inseridos e harmônicos com a natureza; desrespeitavam-se também comportamentos milenares, crenças, deuses, rituais – enfim, toda uma estrutura humana que jamais, antes dos brancos, precisou de mudanças ou orientações para continuar a existir em seu contato direto, em sua sagrada e nua naturalidade intensa e fulgurantemente orgânica como integrante da natureza em seu esplendor e desafios.

A hecatombe praticada com os yanomami é a prova mais crua do arbítrio e estupidez dos civilizados sobre os, digamos, primitivos: suas terras invadidas; seus rios contaminados; suas vidas desgraçadas. Tudo pela presença da ganância e da violência.

A ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, disse em entrevista, ao ser questionada a respeito do que os yanomami querem: “Eles querem paz.” Simples assim: eles querem paz, querem que os malditos sejam retirados, querem sua floresta de volta, querem seus costumes respeitados, seus deuses – querem, enfim, sua vida. Pronto. Só isso.

O problema é complexo, e a vida como era antes, bem antes, é algo que chegou ao plano das impossibilidades. Assim, a sociedade e o governo federal têm a obrigação de retirar e punir os garimpeiros, impedir a sua volta e meter na cadeia os grandes financistas, os capitalistas que estão levando à floresta seus interesses sujos, a busca do lucro abjeto e ruim.

Isso tem que parar. Isso tem que parar. Isso tem que parar.