Democracia e manobra eleitoreira ou até a Folha acusa falta de ética dos tucanos
Emanoel Barreto
Ao contrário do que o senso comum dos políticos procura passar e impor, democracia não é um estado social consolidado, uma "coisa", uma realidade perfeita e maquínica, onde tudo funciona perfeitamente apenas porque se tem direito - obrigação ao voto. Essa é uma compreensão vulgar e tosca. E, quando utilizada para iludir segmentos menos escolarizados, mal-intencionada.
Democracia é um processo, uma saudável utopia quando tal processoé regido por algo chamado ética. Democracia é também distribuição de renda, escolarização, acesso a gens e serviços, o Estado em suas manifestações fenomêmicas a serviço do social. É cidadania em compreensão plena. Democracia é a cidadania posta em prática.
Uma das manifestações do Estasdo é o Poder Judiciário, que não deve servir ao privado mas ao público.
Às vésperas da eleição surgiu essa coisa de exigir-se o uso de dois documentos para votar, como se não bastasse o título de eleitor ou outro documento e a conferência destes nos arquivos do TRE, facilmente acesível aos mesários graças à informatização. O propósito é descartar eleitores menos escolarizados, o que chamo aqui de "uso dos simples para confundir a sua cidadania".
Leia a matéria abaixo e você compreenderá. Compreenderá também como age a Folha, que ao noticiar essa manobra faz parecer que é um jornal apartidário. Segue o texto:
Após receber uma ligação do candidato do PSDB à Presidência da República, José Serra, o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes interrompeu o julgamento de um recurso do PT contra a obrigatoriedade de apresentação dos dois documentos na hora de votar.
Serra pediu que um assessor telefonasse para Mendes pouco antes das 14h, depois de participar de um encontro com representantes de servidores públicos em São Paulo. A solicitação foi testemunhada pela Folha.
No fim da tarde, Mendes pediu vista, adiando o julgamento. Sete ministros já haviam votado pela exigência de apresentação de apenas um documento com foto, descartando a necessidade do título de eleitor.
A obrigatoriedade da apresentação de dois documentos é apontada por tucanos como um fator a favor de Serra e contra sua adversária, Dilma Rousseff (PT).
A petista tem o dobro da intenção de votos de Serra entre os eleitores com menor nível de escolaridade.
Após pedir que o assessor ligasse para o ministro, Serra recebeu um celular das mãos de um ajudante de ordens. O funcionário o informou que o ministro do STF estava do outro lado da linha.
Ao telefone, Serra cumprimentou o interlocutor como "meu presidente". Durante a conversa, caminhou pelo auditório onde ocorria o encontro. Após desligar, brincou com os jornalistas: "O que estão xeretando?"
Depois, por meio de suas assessorias, Serra e Mendes negaram a existência da conversa.
Para tucanos, a exigência da apresentação de dois documentos pode aumentar a abstenção nas faixas de menor escolaridade.
Temendo o impacto sobre essa fatia do eleitorado, o PT entrou com a ação pedindo a derrubada da exigência.
O resultado do julgamento já está praticamente definido, mas o seu final depende agora de Mendes.
Se o Supremo não julgar a ação a tempo das eleições, no próximo domingo, continuará valendo a exigência.
À Folha, o ministro disse que pretende apresentar seu voto na sessão de hoje.
Antes da interrupção, foi consenso entro os ministros que votaram que o eleitor não pode ser proibido de votar pelo fato de não possuir ou ter perdido o título.
Votaram assim a relatora da ação, ministra Ellen Gracie, e os colegas José Antonio Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa, Carlos Ayres Britto e Marco Aurélio Mello. Para eles, o título, por si só, não garante que não ocorram fraudes. Argumentam ainda que os dados do eleitor já estão presentes, tanto na sessão, quanto na urna em que ele vota, sendo suficiente apenas a apresentação do documento com foto.
"A apresentação do título de eleitor não é tão indispensável quanto a do documento com fotografia", afirmou Ellen Gracie.
O ministro Marco Aurélio afirmou que ele próprio teve de confirmar se tinha consigo seu título de eleitor. "Procurei em minha residência o meu título", disse. "Felizmente, sou minimamente organizado."
A obrigatoriedade da apresentação de dois documentos foi definida em setembro de 2009, quando o Congresso Nacional aprovou uma minirreforma eleitoral.
O PT resolveu entrar com a ação direta de inconstitucionalidade semana passada por temer que a nova exigência provoque aumento nas abstenções.
O advogado do PT, José Gerardo Grossi, afirmou que a exigência de dois documentos para o voto é um "excesso". "Parece que já temos um sistema suficientemente seguro para que se exija mais segurança", disse.
Foto:Moacyr Lopes Junior/Folhapress
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