quarta-feira, 10 de novembro de 2010

A marca do Zorro ou de como o sargento Siqueira se transformou no Sargento Garcia
Emanoel Barreto


A atitude da Mesa da Assembleia Legislativa, negando posse ao sargento Siqueira, aliando-se assim ao Ministério Público que contesta sua assunção ao mandato, mostra pelo menos um resquício de consciencia social e respeito  a esse ser coletivo a quem chamamos povo. Siqueira assumiria no vácuo deixado pelo deputado Gilson Moura, no que aparenta ser uma espécie de negaça, uma drible e uma afronta aos princípios republicanos.

Tomando conta do mandato Siqueira passaria a ter foro privilegiado uma vez que o processo contra ele, oriundo da Operação Impacto, o revestiria da armadura de parlamentar. A renúncia de Moura é vista como um conluio para beneficiar o colega de partido. 

O episódio é típico da nossa pequena política, aquela de bastidores, praticada nos escaninhos mais mofados da política. Aquela da troca de favores e benemerências cavilosas, onde a coisa pública passa a ser usada como proriedade do mandatário, em detrimento das mais comezinhas regras da moral e da ética. A política como epílogo da decência. 

Nossa cultura política é assim: sem grandes gestos, sem atos de grandeza, sem valoração de princípios, sem coerência ideológica.

Mas o sargento Siqueira teve a experiência dolorosa, vexatória, de ficar esperando inutilmente para tomar posse: como nenhum membro da Mesa compareceu à Casa, ele ficou plantado ontem, a tarde inteira, à espera de Godot. Mas, como na peça de Samuel Beckett, debalde foi a espera. Siqueira passou a humilhante situação de ver seus pais, um respeitável casal de mais de 80 anos, sofrer inutilmente, expostos publicamente ao vexame.

O gesto da Mesa, duro mas necessário, ficou nele como sendo a marca do Zorro: aquele "Z" que o heroi mascarado deixa fincado na testa dos seus antagonistas, labéu e pecha a denunciar que ali estava alguém que se postava contra os interesses sociais. Com o gesto, a Assembléia transformou o sargento Siqueira numa espécie de Sargento Garcia, atrapalhado e toleirão, a serviço de causa nada louvável.

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