Discriminação e preconceito: Tiririca tem de provar que é gente
Emanoel Barreto
Nordestino, mestiço, feio. Já foi pobre. À exceção do fato de que não é mais pobre, Tiririca, aliás deputado eleito Francisco Everardo Oliveira Silva, não podia esperar outra coisa que não o preconceito da elite branca e jurídica de S. Paulo. E não deu outra: foi obrigado a provar que tinha direito sim de assumir o mandato que lhe foi outorgado por bem mais de um milhão de votos.
Hoje à tarde, após ser constrangido a ler e escrever, foi afinal tido como gente e admitido a assentar-se às impolutas cadeiras da nossa Câmara dos Deputados. A presença de Tiririca em plenário tem um sentido simbólico que supera em muito sua evidentemente acanhada figura de futuro parlamentar: ele é legitimamente um representante do povo, pois deste veio e sobreviveu a duras penas.
Sem a fidalguia e a eruditismo de alguns de seus próximos pares, a figura de Tiririca será como uma sombra viva, passos de acusação, zumbi vindo dos manguezais e caatingas da pobreza mais aviltante, que muitos dos que na Câmara se encontram ajudam a perpetuar com seus gestos de corrupção e conluios.
Tiririca é o gol de placa feito por time de várzea em seleção de Primeiro Mundo. É o gemido do povo dizendo "eu existo", é o grito, a denúncia viva do escárnio que é tão solertamente prepetrado pelos membros da elite que resfolegam, obscenos, nos escaninhos do parlamento.
Tiririca pensa, apesar de tudo, pensa. Logo, existe.
Foto:Apu Gomes/Folhapress
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