De bons conselhos para que você se torne desocupado e depois banqueiro
Emanoel Barreto
Corria o ano da graça de 1734 e eu estava em Londres com um casal de tios. No meio da multidão eu me perdi. Quando quis entrar em pânico lembrei-me de conselho que tinham me dado: "Jamais entre em pânico, se se perder. Grite para saber se por perto tem alguém bondoso, que essa pessoa bondosa o encaminhará a nós." E assim fiz: gritei e logo um grupo de indivíduos se aproximou, apresentando-se como composto por pessoas excepcionalmente boas.
E quem são os senhores?, quis saber. Responderam: Somos integrantes de Grande e Pacífica Ordem dos Desocupados, a nosso lado nada temerá. E os senhores vão me levar a meus tios? Claro, foi a resposta. Mas antes, explicaram, eu deveria aprender a ser um desocupado. Assim não teria problemas se algum dia ficasse desempregado. Já teria prática e isso me daria grande vantagem no nobre ofício do ócio. Diante da magnífica sugestão, aceitei no ato. Eu tinha sete anos e sabia quando estava ao lado de gente escrupulosa e de um futuro promissor.
Logo me ensinaram que um bom desocupado primeiro deve fazer nada. Depois, se tiver talento, pode chegar a malfeitor. Então, assumi comigo mesmo o grande projeto de chegar a tão elevado posto, já que, como malfeitor, poderia, como me disseram, tornar-me banqueiro, que são os piores malfeitores do mundo.
Destarte, espichei-me em uma calçada e comecei a dormir. Fui visto imediatamente como um grande preguiçoso e desocupado e aplaudido por toda a Grande e Pacífica Ordem dos Desocupados . Após dez dias dormindo na calçada fui chamado a depor. Depor? Por que vou depor?, perguntei ao policial que já queria me algemar. Crime de vadiagem, respondeu. Precisa comparecer ao juiz. Não me dei por satisfeito e gritei, explicando que não era um vadio, mas um respeitável desocupado, prestes, dentro de mil anos mais ou menos, a buscar emprego de banqueiro.
O policial, vendo meus bons projetos e magnas intenções, liberou-me imediatamente. Foi promovido a sargento, uma vez que demonstrara ser grande conhecedor dos direitos dos desocupados. Anos depois encontrei meus tios. Estavam desesperados, haviam gasto tudo o que tinham na minha busca e encontravam-se na mais ultrajente miséria. E pior: tinham sido presos por vadiagem, somente sendo soltos depois de passar dez anos na Sibéria e vinte trabalhando em minas de sal não-sei-aonde.
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