sábado, 9 de outubro de 2010

Cartas de Alberany, o abominável

Teerã, 16 de março de 1620
A quem cometa a loucura de me ler,


Digo-vos que sou Alberany, o abominável, e que bem mereço tal apodo. Como sou desocupado e me dedico ao ócio e a ele sou devotado e mui, abri um banco e passei a produzir meu próprio dinheiro. Destarte, comprei enorme leito, que é levado aos ombros de quatro serviçais, que até de andar preguiça tenho.

Antes disso dediquei-me a mendigar e tinha à mão uma sacola presa à ponta de uma haste. Era para poder ficar deitado e me manter estático. Assim, estirava meu tosco engenho ao tolo que me presenteasse e podia ressonar enquanto lucrava os meus óbolos. Depois abri meu banco e tornei-me augusto e respeitável.

Como desta forma continuo nada tendo o que fazer, o que é muito bom, saudável e apreciável, atirei-me a viajar o mundo. De certa feita viajei a Teerã, de onde escrevo. Ao chegar, vi todos de quatro e perguntei o que se passava, pois temi que estivesse entre loucos. Cheguei a pensar que brincavam de imitar algum animal exótico e ainda não do meu conhecimento. Isso foi porque se assim fosse, iria a todos comprar e abrir um zoológico em Nova Iorque. Perguntei ró por precaução: sou um biltre, mas não quero dedicar-me à loucura, pelo menos não enquanto não me render uns cobres. 

A resposta que me deram a respeito de tão inesperado comportamento me dizia que estavam todos a orar e pediam a Alá graças e boas coisas. Fui tomado então de enorme riso, curvei-me e em seguida comecei a dar saltos fulgurantes. Pinotei com tanto entusiasmo, tanta arte e tantos gestos meus, que o surto aumentou sem mais parar.

Em meio aos pulos e aos upas relinchantes, comecei a emitir terríveis guinchos que muito impressionaram os bons crentes. E todos pensando que eu era um dervixe, vindo de terra estranha e de língua complicada, puseram-se tambvém a saltar e a guinchar, e o fizeram com grande mestria.

A seguir estabeleceu-se grande tumulto, com todos em Teerã guinchando muito e saltando a enormes altitudes. Alguns, como eu, chegavam a atingir os 20 metros, mas caíam no chão feito uma pluma. Pensaram então em um milagre e me puseram em uma liteira e me honraram.

Nisso, a guarda palaciana ia passando e o capitão logo quis saber daquele espanto. E lhe disseram que era eu bondoso homem, quem sabe um sufi mui devotado. Mas eu continuava a me rir e muito e muito, especialmente quando todos de quatro pés ficaram novamente.

Destarte o capitão notou que eu era um zombeteiro e alarmou a todos quanto a isto. E a multidão sôfrega me atacou e os muçulmanos me moeram de pancadas. Minha sorte foi a passagam de um judeu que havia se apoderado de um tapete voador lá para os lados da Oceania. Lá de cima ele notou o terrível intento e abriu fogo contra toda a multidão. Vinha ele munido de boas armas e espalhou o pânico entre eles.

O judeu me chamou, subi ao tapete bem depressa e logo fomos a uma alta construção. Ali ficava a ONU e lá nós nos abrigamos. No momento estamos em paz e deu tempo a escrever esta cartinha. Logo logo partiremos à Jamaica, onde dizem que tem reggae e um bom rum. Mas, acautelo-me: os muçulmanos estão batendo à porta e um deles se diz chamar Osama.

Atenciosamente,
Alberany, o abominável

PS: Nos veremos em breve.  O tapete acabou de partir.

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