Emanoel Barreto
O excerto que publico logo após este parágrafo é de texto da mais nova edição da revista Época. Em reportagem de capa intitulada "O passado de Dilma"a revista, seguindo caminho já trilhado pela Veja e Folha de S. Paulo, busca construir a seguinte imagem: a candidata Dilma é uma criminosa, foi assaltante, andava armada. Mais claramente: utilizando-se do mais estúpido senso comum a revista busca estabelecer uma espécie de silogismo sonso: quem anda armado é criminoso; Dilma andava armada, logo Dilma é criminosa; logo não vote nela.
Leia o excerto: Em outubro de 1968, o Serviço Nacional de Informações (SNI) produziu um documento de 140 páginas sobre o estado da “guerra revolucionária no país”. Quatro anos após o golpe que instalou a ditadura militar no Brasil, grupos de esquerda promoviam ações armadas contra o regime. O relatório lista assaltos a bancos, atentados e mortes. Em Minas Gerais, o SNI se preocupava com um grupo dissidente da organização chamada Polop (Política Operária). O texto afirma que reuniões do grupo ocorriam em um apartamento na Rua João Pinheiro, 82, em Belo Horizonte, onde vivia Cláudio Galeno Linhares. Entre os militantes aparece Dilma Vana Rousseff Linhares, descrita como “esposa de Cláudio Galeno de Magalhães Linhares (‘Lobato’). É estudante da Faculdade de Ciências Econômicas e seus antecedentes estão sendo levantados”. Dilma e a máquina repressiva da ditadura começavam a se conhecer.
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Aquele período da nossa história é contado de forma cambeta: usa-se de um reducionismo maniqueísta para sinalizar a ação dos grupos guerrilheiros como sendo o mal por oposição às forças da ordem, as forças do bem.
Não se fala que a ação de grupos de resistência surgiu em função mesmo de um estado de coisas opressivo; imposto por um golpe de estado perpetrado pelo estamento militar com aplauso das elites e voltado para manter, aí sim, a ordem que seus integrantes entendiam como normal e desejável: milhões de despossuídos no campo e nas cidades, concentração da riqueza, falta de perspectivas para as gerações jovens.
A participação da guerrilheira Dilma se deu nesse contexto, que serviu de pretexto para a criação de locais de tortura e mortes, ela própria barbaramente torturada. Um equívoco da minha geração foi o apelo à luta armada. Mas daí a classificar quem lutou politicamente como criminoso comum vai uma grande distância.
E quem usa de tal artifício, buscando nesse passado justificativa para desestabilizar a atual campanha, como se o país estivesse à beira de um abismo não tem, certamente, intenções democráticas. Quer no mínimo desviar o debate. Ou então... pede que haja um novo golpe.
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