sábado, 5 de fevereiro de 2011

A lenta derrocada de um ditador

Diz a Folha:

Mubarak deve permanecer durante transição, diz enviado dos EUA

DAS AGÊNCIAS DE NOTÍCIAS
Revolta Árabe O ditador egípcio, Hosni Mubarak, um "velho amigo" dos Estados Unidos, deve seguir em seu posto durante a transição democrática, disse neste sábado o enviado especial para o Egito do presidente Barack Obama, Frank Wisner. 

"Necessitamos chegar a um consenso nacional em torno das condições prévias para dar um próximo passo à frente. O presidente deve permanecer em seu cargo para liderar essas mudanças', disse Wisner, a um encontro sobre segurança em Munique, sul da Alemanha, através de uma videoconferência. "A continuidade da liderança de Mubarak é decisiva", acrescentou. 

Segundo o enviado especial de Obama, que nesta semana reuniu-se com Mubarak, para o ditador egípcio "é a oportunidade de escrever seu próprio legado. Ele dedicou 60 anos de sua vida a serviço do país, este é o momento ideal para ele mostrar o caminho a seguir". 
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A participação dos Estados Unidos no episódio tem um objetivo: assegurar sua hegemonia na região; nada de garantir "a continuidade da liderança de Mubarak" em meio ao processo de transição. Mubarak, a rigor, não lidera mais nada, nem está mostrando qualquer "caminho a seguir". Ninguém lidera sua própria débâcle ou aponta qual o melhor caminho para o seu fim.
Corrente de soldados na praça Tahrir, no centro de Cairo;  Mohammed Abe/AFP


Assim, é preciso dar às coisas um certo ar de organização e de grande política, uma espécie de respeitabilidade mofada. É a farsa do poder em sua mais abjeta expressão. 

O ditador do Egito, desde o início das mobilizações, já dava mostras de que não teria forças para se impor aos que o contestavam: dada a magnitude dos protestos, e com a real ameaça à sua perpetuação no comando, poderia simplesmente ter determinado às tropas que dissolvessem as multidões à bala, e isso teria sido fácil. Por que não o fez? Simples: não conseguiria suportar a pressão da opinião pública mundial e isso, ao invés de mantê-lo à testa do governo, apressaria sua derrubada. O banho de sangue o levaria de roldão.

Desta forma, Mubarak esperou que os protestos arrefecessem, o que não aconteceu. Os Estados Unidos perceberam que seu "velho amigo" estava mumificado e resolveram passá-lo ao museu da história, mas de forma o mais amena possível. Retirar Mubarak pura e simplesmente seria dar ao movimento força suficiente para atirar longe o jugo e assumir o protagonismo. Logo, foi melhor buscar uma saída lenta, retirando à voz das ruas sua condição revolucionária.

Saindo ele em meio a processo político negociado fica para a história que foi isso mesmo, uma saída. O contrário seria deposição. E tudo o que os americanos não querem é um novo governo que não lhe seja obediente. Um governo que chegou a se constituir como tal pela força popular. O que se deseja, do ponto de vista americano, é um governo com quem possa, no day after, manter algum tipo de relacionamento estável.  

O Egito, do ponto de vista geopolítico, é importante demais para que os EUA negligenciem com ele um bom relacionamento. A história, contudo, está a se fazer. Os passos a seguir serão de importância vital para o futuro próximo. O novo governo, se merecer mesmo esse nome, tem a seu encargo a administração de um espólio de pobreza e miséria extremos e com essa situação o povo egípcio disse que não quer mais conviver. Que o novo governo seja mesmo novo. Não mais uma praga do Egito.

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