quinta-feira, 27 de janeiro de 2011


Reproduzo carta do zootecnista Edgar Manso de Menezes ao  jornalista Marcos Aurélio de Sá, do Jornal de Hoje, em que analisa questões conjunturais da economia do Rio Grande do Norte. Abaixo:

Caro Marcos Aurélio,

Mais uma vez venho parabenizá-lo pelo O Jornal de Hoje, principalmente no tocante ao nosso agronegócio potiguar, tão judiado nos últimos anos.

Hoje estava arrumando alguns papéis e vi artigos que já te mandei, e que para meu grande orgulho foram publicados em seu jornal, e por isso são guardados com carinho. Para minha tristeza e reflexão mais profunda, notei que um deles era do ano de 2002 e eu comentava sobre “Dificuldades na produção de leite do RN”. Após lê-lo, vi que poderia ser republicado em 2011 sem nenhuma alteração, a não ser o preço pago pelo leite, que era de R$ 0,36 na fazenda que eu gerenciava em no mesmo ano da publicação.

Há meses que acompanhamos em todos os veículos da mídia, a falta de respeito para com os que fazem a cadeia da produção de leite no RN, com quatro, cinco quinzenas para receber do governo do Estado, e nada! O atual governo, através do novo secretário de Agricultura Betinho Rosado até que tem se mostrado sensibilizado e entendedor do problema, mas a proposta inicial de parcelamento da dívida em 24 parcelas quinzenais não vai resolver o problema deixado pelos desgovernos anteriores. 

Muito se falou e perdeu-se muito tempo na pendenga entre os órgãos que seriam responsáveis pelo não-pagamento aos produtores. Ora era a SETHAS, ora era a EMATER, mas sempre os atrasos foram permanentes.
Discutir sobre a importância social e para a pecuária leiteira do RN desse Programa do Leite é mais do que batido, é de domínio público as benesses do referido Programa.
Mas, meu caro Marcos, o que mais me chamou atenção nas páginas do seu vespertino do dia 24/01/2011 foram outras notas e notícias que paralelamente se assemelham a essa triste e repetitiva agrura dos produtores de leite. São pequenos agricultores, carcinicultores e piscicultores sendo impedidos de desenvolver suas culturas, e, consequentemente o nosso RN. E quem impede?
Hoje a Ministra da Pesca e da Aqüicultura, a petista Ideli Salvatti, teve o privilégio de conhecer uma pequena parcela do potencial do RN no setor em que a pasta dela se propõe a coordenar. Correndo os olhos nas notícias começo a fazer um paralelo com os produtores de leite e temo o desenrolar da trama. Há quantos anos os carcinicultores do RN brigam por melhores condições de produzir? Quantas e quantas vezes vimos Itamar Rocha dando entrevistas e batalhando por essa classe? Não só ele, mas como líder de um grupo ele é o porta-voz do mesmo. Quantas vezes já vimos absurdos relacionando carcinicultura com desmatamento do mangue? É importante deixar claro a sociedade que a carcinicultura não prejudica o meio ambiente, quem prejudica é o projeto mal elaborado e sem respeito às leis ambientais, quem prejudica é o homem de mau caráter. Hoje, por exemplo, temos trabalhos científicos de repercussão mundial, que provam que as águas que entram em uma fazenda de criação de camarões em cativeiro em João Pessoa, vindas do rio Paraíba, saem da fazenda após o ciclo de produção, com melhor qualidade do que entram, e a área de mangue na propriedade é a mesma há 14 anos, sem nenhum desmatamento. A população de caranguejos lá até aumentou nos últimos seis anos.

Na criação de tilápias em tanques-redes é que vejo o maior desperdício atual, pois é uma excelente oportunidade de renda para pequenos e médios produtores e as liberações das águas públicas no RN se arrastam há anos e não avançam em nada. A criação de tilápias é extremamente rentável. É possível um retorno de todo o investimento inicial em apenas seis meses, em se tratando de pequenos produtores. É uma atividade que se bem manejada não polui os mananciais. 
 
No Nordeste, são no Rio São Francisco os melhores exemplos da pujança da piscicultura em tanques-redes, desde a barragem de sobradinho, passando por Petrolina, na represa Luiz Gonzaga em Petrolândia, Paulo Afonso e seguindo até Penedo, já perto do encontro do Velho Chico com o mar, na divisa dos estados de Alagoas e Sergipe. A diferença desses municípios é que os gestores já definiram há muitos anos as políticas de liberação das águas, com medidas de preservação e sustentabilidade do ecossistema.

Seria uma utopia pensar em tilápias na merenda escolar? Proteína de altíssima qualidade produzida com baixo custo. Um quilo de tilápia é comercializado por cerca de R$ 5,00 nas fazendas. Dia desses alguém me falou em Programa da Tilápia... Confesso que achei uma boa idéia, mas esse nome é que dá medo...

Li ainda que os agricultores do RN já reclamam do atraso na entrega das sementes por parte do governo.

O agropecuarista Marcelo Abdon foi certeiro quando questiona se a EMPARN não divulga mais a previsão do tempo. Eu completaria dizendo que até divulga, e tem acertado até agora nesse ano, mas os elos são quebrados: A previsão do tempo que deveria servir para programar a entrega das sementes não é levada em consideração. Se fosse não haveria atrasos em anos de bom inverno e indicações errôneas de culturas inadequadas para anos com perspectivas de seca. Talvez o Seguro Safra seja uma repescagem para quem errou quando não podia.

O governo atual fala em revitalizar a fruticultura e criar a Secretaria de Pesca e Agricultura. São projetos importantíssimos, sem dúvida, desde que existam realmente “projetos”. Aliás, as duas secretarias terão bastante trabalho esse ano, pois de acordo com a EMPARN, a região do Vale do Açu corre sério risco de sofrer inundações novamente, prejudicando justamente carcinicultores, piscicultores e fruticultores.
Será que em 2012 veremos notícias diferentes? 

Sementes na época certa, previsão do tempo servindo de parâmetro, projetos de carcinicultura e piscicultura bem elaborados e acompanhados por técnicos competentes, proteína de qualidade na merenda de nossas crianças, produtores das diversas culturas supracitadas com a digna e justa recompensa pela sua produção.
A seca não é fenômeno novo!
Sempre me questiono o seguinte: DNOCS quer dizer Departamento Nacional de Obras Contra a Seca. Se esse “C” fosse sigla se CONVIVÊNCIA, será que alguma coisa mudava?
Eu sempre vou preferir conviver a ir contra qualquer coisa.

Edgar Manso
Zootecnista

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