A quem leia esta, eis o que sucede.
Após encomedar uma sela a sinistra figura que habita o porão do horrendo navio onde me encontro, singrando em direção à Terra Brasilis, tracei meus planos: conluiar-me a quem possa garantir a mim e a meus intentos lucros e benesses. Se não vos lembrais, a sela que encomendei é parte de meus intentos, que somente revelarei à hora certa.
O navio viajava há já muitos dias quando afinal o gajeiro anuncia terra à vista. É a Terra Brasilis.
Logo após chegarmos ao porto observei grande movimentação. Negros fortes carregavam pesos descomunais, homens em charretes e em liteiras dão ordens e são obedecidos.
Pego a minha cela e o bridão e desço do navio. Dirigindo-me a um homem alto, forte e andrajoso, pergunto sois do povo? Mal ele me respondeu que sim, atirei-me às costas da infeliz criatura, apliquei-lhe aos ombros a cela e o bridão à boca. Ele saltou a corcoveou como um cavalo mas isso não me põe abaixo. Comprovo que sou excelente ginete. Era essa a minha intenção, encontrar um tolo que me servisse docilmente.
Multidão de parvos me aplaude o que é muito bom para a minha alegria. Enfim, cravando esporas, faço o homem galopar. Parto a grande velocidade, e para meu gáudio encontro outros homens montados em outros homens. Todos levam lanças e varapaus e a eles me ajundo naquela empreitada de loucos que não sei aonda vai dar.
Logo alguém me dá uma lança e pergunto para onde vamos. Iremos atacar o povo que parece rebelar-se foi a resposta. Após trinta minutos de galope deparamo-nos com a multidão. As pessoas não parecem enfurecidas. Na verdade trata-se de uma procissão. Pergunto se ainda levaremos a cabo nossa intentona que que não há motivos para o ataque.
O chefe do magote ao no qual havia me metido diz que não. Mesmo quando está em paz o povo deve ser advertido. E partimos para cima da procissão, distribuindo formidáveis golpes em todos. Espavoridas, aquelas pobres criaturas berram e se atiram ao chão, pedindo clemência. Afinal todos fogem e a minha malta para de distribuir estocadas.
Apeamos de nossas montarias humanas e entabulo conversa com nosso chefe. Pergunto da Terra Brasilis, seus costumes ou falta disso. Ele me fala do povo e das riquezas. Diz-me do poder e como se estrutura. Fala-me que existem senadores. E quem são?, quero saber. Representantes do povo, é a resposta. Imagino como trabalham e suponho como agem, ouvindo-me atentamente o farsante com quem falo.
Eis o que digo a ele: devem ser pobres criaturas esses senadores. Imagino-os no plenário que frequentam. Esmolambados, suarentos, barbas por fazer, esmolam entre si e uma única e pobre moeda é passada de mão em mão, que aqueles homens são bons e repartem entre si o pouco que têm. Como aquelas criaturas bondosas conseguem sobreviver, já que são representantes do povo e do povo são seus iguais e sendo iguais ao povo nada têm de seu?, pergunto. E mais: não tendes compaixão de tais famintos?
O tipo, maroto e sórdido, ri-se de mim e me explica que ser representante do povo é apenas uma metáfora, na verdade uma grande e cara brincadeira. Os senadores são homens de escol e vivem em mansões. A nosso lado as montarias humanas relincham. Sim, já relincham como cavalos.
Sinto que estou à larga e é grande o meu viver. Montamos e seguimos em direção a uma taberna, a fim de comemorar nossa desprezível vitória.
Na próxima carta vos contarei mais.
Saudações deste patife,
Alberany, o abominável
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