segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

 Transcrevo do Estadão.

Vem aí o filme dos pracinhas

Acompanhamos os ensaios do nacional A Montanha, de Vicente Ferraz, que será todo rodado na Itália

Flavia Guerra - O Estado de S.Paulo
O Brasil foi o único país da América Latina a enviar tropas à Europa durante a 2.ª Guerra Mundial. Cerca de 25.324 soldados de várias regiões brasileiras combateram na Itália. Destes, 2.762 foram feridos e 465, mortos no conflito que mudou os rumos da História. Há pouco mais de uma semana, cerca de 20 homens de uniforme reproduziam em uma fazenda de Pindamonhangaba cenas que fizeram parte do dia a dia desses soldados, como sobreviver em condições precárias, resistir à fadiga e à fome, caminhar em um campo minado.
Joana Mariani/Divulgação
Joana Mariani/Divulgação

Entre os 20 oficiais, cinco eram atores. A tarefa de Daniel de Oliveira, Júlio Andrade, Togun, Francisco Gaspar e Ivo Canelas não era se preparar para desarmar campos minados, mas sim viver na pele o que os oficiais da lendária FEB (Força Expedicionária Brasileira) passaram durante a guerra. O treinamento fazia parte da preparação para rodar, em fevereiro, o longa A Montanha

Com direção de Vicente Ferraz, que há quatro anos vem preparando o filme, A Montanha retrata, justamente, a ação de quatro pracinhas em Monte Castello, na Itália, quando, após um ataque surpresa, sofrem pânico e acabam se perdendo do grupo. Quando se dão conta, estão perdidos entre as linhas alemãs e aliadas. Sem saber se devem voltar para a posição da noite anterior ou para a linha da FEB, sob o risco de serem acusados de deserção, eles acabam por vagar a esmo enfrentando frio, neve, até que encontram uma aldeia abandonada onde passam a noite. No dia seguinte, um correspondente de guerra se junta ao grupo. É ele quem, sem querer, acaba dando aos pracinhas a ideia perfeita para "serem perdoados" do crime de deserção: cumprir uma tarefa até então considerada impossível, que é a de desarmar o campo minado mais temido da Itália. No caminho, o grupo acaba encontrando outros "desertores": um partigiano (como eram chamados os heróis da Resistência italiana) e um oficial alemão cansado.      
In loco. Para que a veracidade adquirida com o treinamento com os oficiais da 12.ª Companhia de Engenharia de Combate Aeromóvel seja ainda mais real, todo o filme será rodado na Itália, em montes nevados do nordeste italiano, em cenário que reproduz fielmente as condições enfrentadas pelos brasileiros quando combateram na Europa. "Imagine que, somado a tudo isso que você viu hoje aqui, nós ainda vamos ter de encarar a neve e o frio. Imagine que os pracinhas não tinham nem preparo nem equipamento para sobreviver neste ambiente de aridez branca. Foi terrível. Por isso, desde o começo, eu queria filmar no próprio local em que as ações reais se passaram, na Toscana, mas, por questões de orçamento, transferimos tudo para a região de Friuli-Venezia Giulia", contou Ferraz, que dirige seu primeiro longa de ficção brasileiro. Antes, Ferraz ganhou público e crítica com o documentário Soy Cuba - O Mamute Siberiano e rodou também O Último Comandante, filmado na Costa Rica. "Quando, há alguns anos, com a formação que eu tenho, diria que filmaria uma história sobre o Exército brasileiro? Fiz escola de cinema em Cuba e cresci durante a ditadura. Isso é sinal de que o País mudou muito."

O comentário do diretor se refere à maneira como os oficiais da 12.ª Companhia receberam diretor e equipe para o treinamento expresso que realizaram durante três dias. "Foi incrível a recepção que tivemos. Além deles condensarem para nós um curso que levaria em geral nove semanas para ser feito, deram total apoio e entenderam muito bem a nossa ideia", comentou Ferraz.
Na hora de aprender como se explode um quilo de TNT, Daniel de Oliveira foi quem deu o disparo. E o que se viu e sentiu foi a sensação "quase" real de um campo de guerra. "Não há como negar que isso seja emocionante. Imagine os soldados vivendo sob o frio, com medo do inimigo, com fome, sem saber o que seria o dia seguinte, tendo de caminhar por campos minados e desarmá-los. Um ataque de pânico não é de se estranhar", comentou Daniel, que havia saído direto do Projac (onde gravava cenas da novela Passione) para Pinda. "Não peguei os primeiros dias de treinamento, mas só o que vi e aprendi hoje já mudou minha percepção de uma guerra. Esta experiência fará toda diferença quando estivermos filmando na Itália."
As filmagens, em fevereiro e março, devem durar seis semanas. Ao grupo de brasileiros, irá se juntar o italiano Sergio Rubini e o alemão Richard Sammel, de Bastardos Inglórios. O papel do jornalista de guerra, ainda que seja um jornalista brasileiro, será do ator português Ivo Canelas. O elenco internacional se justifica diante de uma realidade que está se tornando comum no cinema brasileiro: a coprodução. Orçado em R$ 9 milhões, A Montanha será coproduzido por Matias Mariani e Isabel Martinez (respectivamente das brasileiras Primo Filmes e Três Mundos Produções), o italiano Daniele M Azzocca (da Verdeoro) e o português Leonel Vieria (da Stopline).

PARA ENTENDER
Como o Brasil foi parar na 2ª Guerra
Em um mundo dividido entre o Eixo (Alemanha, Itália e Japão) e os Aliados (Estados Unidos, Inglaterra e França), o cenário geopolítico da 2.ª Guerra era mais que complexo. Até o final dos anos 30, ainda que simpatizasse com as diretrizes políticas nazifascistas, o Brasil de Getúlio Vargas tentou permanecer neutro. 

Mas os Aliados, sobretudo os EUA, que haviam feito empréstimos ao Brasil e que estavam interessados em construir bases no estratégico Nordeste brasileiro, acabaram convencendo o País a declarar guerra ao Eixo. E assim, em 1943, o Brasil enviava as primeiras tropas para combater, principalmente, na Campanha da Itália. Além do combate, o País enviou pilotos da Força Aérea, patrulhou o Atlântico com navios da Marinha e forneceu matéria-prima (sobretudo borracha).

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