quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

O presente capítulo deste folhetim somente será entendido por quem leu os capítulos anteriores

Alberany, o abominável, faz grande fortuna

Em minha fuga deixei o cavalo seguir qualquer estrada, qualquer fosse o rumo. Após horas de fuga terminei no centro de grande e escura floresta onde encontrei soturno acampamento. Reinava ali ambiente de agruras e algum choro. Uma mulher barbada de aspecto terrível aproximou-se e temi estar na presença de uma fúria perigosa. Segui adiante e logo me vi diante de um que parecia ser o chefe daquele ambiente de horrores. Apresentei-me e pedi pouso: - Podeis ficar, mas aqui nada há para um homem decente. Se quereis sorver dos nossos sofrimentos ficai à vontade - foi a resposta.

Indaguei o que se passava e ele explicou: aquilo era um circo falido. A empanada havia pegado fogo e eram tantas as dívidas com o alimento dos animais e das pessoas, em atraso o salário dos artistas, que a miserável companhia havia entrado em total descalabro. Ante tal situação reagi: - Eis aqui, no problema, nossa solução.
http://www.google.com.br/imgres?q=mulher+barbada

O chefe perguntou-me como. Em rápidas palavras expliquei meu plano sinistro e isso o fez sorrir. Vede a seguir como é plena de artimanhas minha inteligência sôfrega de atos deslavados: mandei que se juntassem restos de panos; tais tecidos, sustentados por armação de varas, formaram um grande paralelepípedo de três metros de altura por sete de fundo. Isto feito, rumamos a uma cidade próxima. Pouco antes de nela adentrarmos mandei que um grupo de ordinários entrasse no paralelepípedo e ali acendessem tochas e nos pusemos a caminhar. 

Quem via de fora aquela patranha tinha a impressão de que algo vindo do inferno estava a chegar para o final dos tempos. Seguiu assim nosso maléfico cortejo: a armação flamejante andando pela noite, antecedida por grupo de malfazejos que rufava muitos tambores. Outros sopravam horrendas cornetas. Mais sinistro impossível.

À frente de todos eu, todo vestido de preto. Chegamos à infeliz povoação noite fechada, e qual não foi o espanto de seus honrados moradores. O cura foi tirado de sua casa pelos moradores aos gritos de - Salvai-nos, senhor cura, eis que chegam os loucos do inferno a nos atacar! - o pobre sacerdote saiu à rua e prosternou-se ao chão  pedindo socorro divino. 
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Aquela infausta procissão cruzava as ruas e os becos levando o terror e o desespero. Eu anunciava: - Chegamos a esta cidade pecadora e exigimos de todos temperança e bondade. O pecado mora em vossos corações. Quem é daqui o maior e responsável? 

Após algum tempo apresentou-se o maior e pediu para saber do que se tratava. Expliquei, enquanto os tambores troavam soturnamente: - Deveis dar o dinheiro devido aos pobres da grande visitação para que tenhais vossos pecados perdoados.

- Quem são os pobres da grande visitação? - indagou o trôpego mandatário. 
- Nós somos os pobres da grande visitação. Estamos percorrendo as cidades onde imperam o pecado e o vício. E todo aquele que paga tem os pecados perdoados - os tambores continuavam sua surda ameaça. Mas a multidão, que aos poucos se acalmava, disse não crer em nós, mesmo vendo que trazíamos o fogo das ameaças. 

Percebendo que a luta não seria fácil, eu disse: - Então, preparai-vos! Sobre esta urbe cairá uma tal fauna de animais perigosos, infames e nocivos que preferiríeis antes a morte. Eia! - e meus sequazes gritaram também: - Eia! - e nos retiramos em meio a grande alarido. 
http://www.google.com.br/imgres?q=mandril&hl=pt-BR&safe

Deixamos seguir a noite; noite seguinte retornamos. O mesmo fogaréu entre os tecidos, o mesmo batecum de tambores. E logo atrás uma leva de animais terríveis: rinocerontes e leões, tigres e hipopótamos, girafas e elefantes. Mandris e outros macacos malignos urravam e bramiam por toda parte. Aranhas e outros bichos perniciosos alarmavam mulheres e crianças. Mosquitos de grande porte enlouqueciam a quem não se protegesse. 

Gritei: - Aqui é o que se passa em tais cidades de gomorreus! Vinde e assisti a vosso próprio sofrimento! Tais bestas não se afastarão antes que pagueis o devido aos pobres da grande visitação!

Instalado o terror, foi o suficiente para que pessoas começassem a admitir culpas escondidas, pecados os mais mal-afamados, procedimentos injustos, tramoias e planos secretos, maus feitos e outras abominações. Aí, começou a aparecer dinheiro de toda parte e nisso fizemos muito gosto. Somente saímos quando as burras estavam cheias, levando para o profundo da floresta o butim daquele saque inominável. 
(Continua)

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