sábado, 19 de junho de 2010

O jornal envelhecido
Emanoel Barreto

A leitura da manchete da Folha dá-me a sensação real do perigo que corre o jornalismo impresso de perder espaço e presença histórica. Motivo? Muito simples: no espaço mínimo de 24 horas a notícia da morte de Saramago já está jornalisticamente envelhecida. A internet, a TV e o rádio já a haviam esgotado enquanto acontecimento noticiável. Especialmente a internet, esse inimigo não-intencionado do jornalismo impresso dá-me reforço à sensação 

E isso apesar da belíssima capa da Folnha, com Saramago em foto de tom blasée, um flâneur em pleno exercício de sua flanerie; um homem vivenciando sua senectude rejuvenscida e desafiadora, impávida ao vento e às tempestades da vida. Tormenta ele próprio, viajor, português, homem do mar.

O que faltou ao jornal? Faltou dar a informação adiantada, o dia seguinte, o hoje, a contextualização, o processo de vida em torno da figura carismo-turbulenta do autor, a representatividade da obra. Claro que teria que haver uma manchete. Mas não, não seria o anúncio episódico de uma morte já anunciada 24 horas antes.

Creio que deveria ter havido, mesmo de forma simplista, ou o anúncio de onde será ele cremado ou os lamentos carpideiros do povo português, a comoção, o luto. Dizer ao mundo apenas que Saramago morreu é no mínimo um equívoco.

Mas a falha não é da Folha, com trocadilho e tudo. É do jornalismo impresso de um modo geral. Que precisa se tornar analítico e antecipar fatos novos a partir de um grande acontecimento matricial, aprofundando-o.




Nenhum comentário: