quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Jogo pesado


Foto: Estado de S. Paulo

O Brasil possível e o direito de roubar assegurado em lei

Vivemos, política e socialmente, um país que pode ser chamado de o Brasil possível. Ou seja: chega-se somente até um certo ponto, não mais –  além daquele há um interdito histórico em nosso DNA social que diz: não tente mudar privilégios, alterar escalas de valores, insubordinar-se às injustiças, ofender os sagrados princípios da imoralidade instituída e histórica de castas intocáveis.
O exemplo deu-se na noite/madrugada que antecede a redação deste texto. Acompanhei a votação até onde pude, mas fui vencido pelo cansaço.
Antevia, porém, o que as redes sociais e os jornais online já informaram: após mais de sete horas de sessão a Câmara dos Deputados aprovou diversas modificações ao texto que saiu da comissão especial.
Foi incluída punição de juízes e membros do Ministério Público por abuso de autoridade e rejeitada proposta que previa acordos de leniência (espécie de delação premiada em que empresas reconhecem crimes em troca de redução de punição) celebrados pelo Ministério Público.
Pior: retiraram trecho que tornava crime o enriquecimento ilícito de funcionários públicos e previa o confisco dos bens relacionados ao crime.
Mais claro que isso impossível: está garantido o enriquecimento ilícito de funcionários. Por consequência o que é garantido é incentivado. Mais claramente: pode roubar, que tudo bem.
 A criminalização do caixa dois, todavia, foi mantida. Assim, quem praticou o crime em eleições passadas pode ser punido retroativamente.
Ao final, das dez medidas anticorrupção, acabaram ficando: medidas de transparência a serem adotadas por tribunais; a criminalização do caixa dois; o agravamento de penas para corrupção e a limitação do uso de recursos com o fim de atrasar processos.
Esse é o Brasil possível a que referi. E com ele teremos de conviver, ao tempo mesmo em que devemos buscar a formação de uma sociedade civil atuante, firme, incisiva e norteada por valores democráticos e que atendam a valores humanistas.
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Armaram e se deram bem
Quando Temer chamou a imprensa domingo último para manifestar, ao lado de Rodrigo Maia e Renan Calheiros pretensa repulsa à descriminalização ao caixa dois fez jogada de mestre. Ou seja: assumiu perante a nação unicamente aquele compromisso; nada mais, percebeu?
Disse na ocasião que caso o caixa dois fosse liberado ele vetaria. Mesmo sabendo que depois o veto poderia ser derrubado pelos deputados e ele desmoralizado. Mas, ante a opinião pública foi feita a aposta de seriedade presidencial e, midiaticamente, armada a jogada do espetáculo político.
Claro que Temer sabia das maquinações que afinal foram aprovadas; óbvio que tinha conhecimento de que o pretenso repúdio ao caixa dois seria o óbolo a ser pago à opinião pública.
A grande pergunta agora é: ele vetará as medidas imorais aprovadas pelos deputados? Se chamado à liça poderá dizer que somente tinha compromisso contra o caixa dois, e pronto.
A resposta é: não, não vetará as mudanças feitas pelos deputados ao projeto de lei anticorrupção. Não terá disposição para isso nem vai contrariar os interesses daqueles com quem mantém concertos. 

E se o fizer, se viesse a fazê-lo, sofreria derrocada tão humilhante que melhor seria a renúncia.

Os deputados, em caso de veto, reagiriam com virulência típica e passariam por cima de Temer e mantendo o que fora decidido ao longo da noite/madrugada.

Os políticos querem se livrar de problemas. Mais problemas. Muitos estão enredados no cipoal da Lava Jato e apavoram-se com o que vem por aí: a denunciação do fim do mundo: as acusações da turma da Odebrechet melando muita gente. Até mesmo o velho PSDB, tão poupado por uma certa imprensa deve ser engolfado.
Mas essa é outra história, coisa para outra coluna. Vejamos os próximos passos. Cambaleantes, mas decididos a fazer o Brasil cada vez pior para quem trabalha e sustenta as castas de privilegiados.
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