A grande reunião com os Cenaculadores
Ilustre Diário,
Estive ontem no Porão Central da Augusta e Responsável Ordem dos Homens Bons, Frequentadores de Porões. Reunido com nosso Deão, o Honorável Rabaça. Estavam também ali presentes Dona Zulma, a Altaneira - única mulher admitida à Ordem - diretora da Diretoria de Álibis e um dos nossos maiores filosofadores, o solene Dr. Rubeão Pantalho.
À reunião fora eu convocado. Convocado, entende? Uma convocação é um chamamento do honor, meu caro. É missão, que, como tal, é dever irrecusável. E fui. Chegando, imergi ao Porão Central, onde candelabros tiveram acendidas as suas velas. Nossas reuniões são sempre à luz de velas, para manter-se a armosfera respeitável e ilustre de tais encontros.
Ali, fui informado de que Dona Zulma iria mobilizar a Diretoria de Disfarces (ver edição do dia 15) a fim de paramentar-me e, especialmente, receber um diploma de político a fim de penetrar nas esferas de tais seres e descobrir seus planos.
Como sabe, caro Diário, os pólíticos fazem parde da Conspiração, aquele movimento solerte contra os Homens Bons.
Imediatamente tudo foi providenciado e um carro levou-me ao Cenáculo, local onde eles são largamente encontrados e pululam ávidos. Lá chegando identifiquei-me como Cenaculador. Foi alvo de deferências e efemérides tais, que quase passei a supor que era um deles.
Quando me encaminhava ao auditorium, onde proferem suas discussões em nome do povo, um deles chamou-me ao lado e pediu que, disfarçadamente, o acompanhasse. Ato contínuo fui levado a uma câmara secreta onde graves e inclusas coisas iriam acontecer, foi o que me disse o anfitrião.
Quando perguntei o que era uma grave e inclusa coisa, respondeu apenas: "Logo verá. Logo verá".
Em seguida estava completo o círculo de convivas e um deles anunciou que a nação vive um instante profundo e oclusivo e que, portanto, todos os Cenaculadores deveriam assim se mobilizar.
Um deles pediu detalhamento. E lhe foi explicado e a nós demais também: um momento profundo e oclusivo referia-se a grande obra paralisada por excesso de superfaturamento e cabia aos Cenaculadores desentravar o processo. Mas, ele disse mas, havia um Cenaculador que estava disposto a se postar contra aquela realização tão pródiga e bonançosa ao povo e à nação, enfatizou.
São sei porquê, mas todos os olhares se voltaram para mim. Entrei em pânico. Afinal, não tenho prática de político. Quis correr e fui prontamente dominado. E então, em meio à geral confusão, um deles me disse: "Calma, seus dez por cento já foram depositados em conta". Eles pensavam que eu ia ao banco checar se a minha conta tinha crescido.
A reunião prosseguiu e foram traçados planos para o momento profundo o oclusivo. Partilha de dinheiro, entende? Tudoacertado, todos pareceram felizes e sacros com o dever cumprido.
Depois fui para casa. Achei muito estranho essa bondade dos políticos. Distribuir dinheiro? Assim, sem mais nem menos? Chegando em casa, fui direto mexer nas coisas da minha sogra. Temo que seja da política. Nada encontrei. Sorrateira, deve ter escondido provas. Vou investigar mais amanhã: afinal, foi para isso que me reuni com Rabaça, o grande mestre dos Homens Bons.
Não se engane, Diário, a Conspiração deve estar agindo pelas mãos dos Cenaculadores. E da minha sogra também.
Um abraço,
Bicalho
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