sábado, 25 de julho de 2020


O Ministério da Doença 
e as pessoas desterradas

Por Emanoel Barreto

Ouvi ontem de um viajante vindo do Extremo Oriente que um governante, não querendo gastar com a saúde do povo, criou o Ministério da Doença e proibiu a todos de... adoecer. Os doentes seriam considerados indivíduos nefastos e assim sendo deveriam ser levados a locais ermos sendo ali abandonados.

Veja bem: faz certo sentido, dizia o viajante; e salientava que uma pessoa em situação de prostração, cheia de problemas físicos, enovelada em questões psiquiátricas, somente serve de mal exemplo.

Esses tipos estimulam a preguiça, o ócio, malandragem, indolência e vadiação. Assim, devem todos ser levados aos tais locais distantes, para que fiquem livres de suas más influências os bons e operosos, os atentos e os que lavram a vida com força e decisão. 

Saiu o viajante de perto e mim e logo depois veio outro: falou-me do Ministério da Doença e acrescentou à história algo bem interessante: disse-me que os afastados – como passaram a ser conhecidos os que haviam sido desterrados – haviam se curado pouco a pouco; e então, já fortes e bem nutridos haviam voltado. 

Chegando à capital do país foram direto ao Ministério da Doença tomar satisfações. Ali constataram que ali agora funcionava o Ministério da Saúde, pois o ministro havia adoecido. E, com medo de ser deportado, havia criado o novo ministério, mandara construir um grande hospital e se encontrava internado. 

Todos partiram para o hospital. Ali descobriram que o ministro já não mais estava. Por precaução se fizera eleger presidente da república. Os antigos doentes perceberam então que, além  deles, não havia mais ninguém na cidade: o presidente havia privatizado o povo e todas as pessoas haviam sido vendidas a países que precisavam de mão de obra boa e barata. 

E nós?, perguntaram. Vocês todos estão presos, disse uma voz num grande alto-falante. Por quê?, foi a pergunta. Porque todo país que se preze precisa de presídios. E precisamos de presos para os presídios, respondeu a voz. 

Então todos foram levados à penitenciária e lá ficaram. O país foi entregue aos mesmos estrangeiros que haviam comprado o povo e preço vil; e agora o presidente diz que vai criar o Ministério de Fazer Não Sei de Quê.

Quando lhe perguntaram o que faria tal repartição ele respondeu: “Se é o Ministério de Fazer Não Sei de Quê, esteja certo: vai fazer não sei o quê lá! E já é muita coisa.”

Virou-se e foi passear.
PS: As pessoas presas continuam lá, no presídio.

Nenhum comentário: