quarta-feira, 22 de julho de 2020


O dragão, o louco e os males que já se espalham

Por Emanoel Barreto

Falei ontem que soube a respeito de um louco que pode e manda, ordena e afronta, ameaça e urra; falei de um poderoso bruto. Mais: soube que o ogro detém sob seu braço e ordens um grande dragão que cruza os céus e mete meto.

Como tipógrafo resolvi apurar tal e temível fato a fim de transformá-lo em uma de minhas narrativas pois é do alvitre dos bons e dos simples de tais cousas saber para delas poder fugir. Como disse ontem, minhas pobres notas somente circulam entre os que se incluem naqueles chamados povo, gente de poucas posses e que muitas vezes nada tem. 

E é junto a essas pessoas que busco minhas informações, especialmente quando me encontro com viajantes e marinheiros, pois são os caminheiros e velejantes aqueles que mais têm novas e anúncios. 

Um deles, chegado das terras do Oriente, garantiu-me que sim; que há um demente e seu dragão, e que a tal e animosa fera voa como pássaro e tem jatos de fogo pelas ventas. Outro, vindo de terras da Europa assegurou-me mais: disse ter visto o perigosíssimo prodígio e que, sim, já está em nossas terras causando pavor e morte. 

Passei toda a noite de ontem em busca de informações e todos os que ouvi me narraram fatos idênticos: e quando pessoas que não se conhecem contam a mesma cousa dou tal história por verdade e prontifico-me a passá-la aos meus papéis.

Soube também que o aluado que manda no dragão tem anunciado que haverá trevas e muitas mortes e que o dragão é o menor dos seus terrores; diz que infundirá a tirania como forma de governo e que isso deve ser visto como algo de boa ordem e por todos desejável. 

Mais, tem mais: muitos seguirão seus passos. Gritando e erguendo bandeiras. Pedirão que insensatez, imprudência, inconsequência, irresponsabilidade, irreflexão, temeridade, leviandade e precipitação sejam código e lei, e que os homens e mulheres sensatos e reflexivos sejam tidos como defensores de ideias exóticas e perigosas. 

Assim, depois de com muitos conversar retiro-me das ruas onde fui informado de tais fatos e ocorrências. Vou agora à minha tipografia. Imprimo tudo o que verifiquei de ver próprio e de ouvir atento, e farei a sua distribuição em praças e ambientes de taverna.

Espero que meus leitores, leitores deste velho tipógrafo, ouçam este texto e preparem-se para cautelosamente observar o que fará o dragão e que ordens lhe dará o seu mestre. E, se tiverem tempo, fujam.

Agora preciso parar de pensar e começar a escrever.


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