De coisas loucas, de monstros e dragões
Por Emanoel Barreto
Os poucos que me conhecem sabem
que sou tipógrafo de profissão. Trabalho com maquinaria antiga, coisa do tempo
do mestre Gutenberg. O papel também é feito por mim, seguindo os mesmos princípios,
técnicas e métodos. Escrevo sobre coisas fabulosas, acontecimentos estranhos, iminências
de fatos terríveis.
São publicações que distribuo a
preço baixo junto a pessoas do povo, gente que acredita em fatos extraordinários
como políticos dementes que chegam a altos postos, magistrados que agem com
esmo furioso semelhante a ogros, poderosos que zombam dos pobres e cansados.
Falo também de ocorrências que coisas
que, dizem, virão: o fim do mundo, a destruição dos tempos, a devastação dos campos,
o mar subindo e engolindo as terras, a mulheres mortas, os homens gritando imprecações
blasfemas.
Mas isso, advirto, são previsões de
um velho louco – eu –, e nada garante que sobrevirão para alarmar a humanidade.
Digo isto pois não quero apavorar meus humildes leitores, que me leem à luz de
velas e candeeiros baços, metidos no interior de seus casebres e cortiços em
busca de fugir da injustiça e frio.
Destarte, é preciso ao tipógrafo bom
senso e siso, pois em tal ofício não se deve alguém deixar-se levar apenas pela
inventiva e trazer aos bondosos e aos simples todo o horror que habita seu
cérebro nervoso e temerário: sei, por experiência própria, que somos, os tipógrafos,
seres que habitam o universo de seu próprio interior e ali descobrimos mundos
vastos e pensamentos grandiosos, mas, convenhamos, inadmissíveis frente à ordem
e ao bom servir dos mandatários e seus carrascos.
Vou ver se amanhã escrevo algo
que valha a pena. Soube que um dragão foi visto cruzando os céus e anunciava o
desterro e o medo. E o dragão estava a serviço de um louco, um demente com sonhos
de grandeza. Mas, vou apurar; amanhã trarei o relato.
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