Alcoolismo, Justa Causa e o
Capital
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Walter Medeiros
Os direitos sociais sempre nascem e se consolidam depois
de penosos processos de experiência e amadurecimento, que findam custando muito
mais aos trabalhadores, sejam quais forem as diretrizes governamentais. É o que
se pode dizer de recente decisão que deixou de retirar da Consolidação das Leis
do Trabalho - CLT item ultrapassado e injusto que prevê a demissão por justa
causa para o trabalhador alcoólatra.
Trata-se de um momento que sintetiza vivências de décadas
de discussões esporádicas, esparsas e desorganizadas, tanto na sociedade como no
Poder Judiciário, no Governo e no Parlamento, terminando numa decisão simplista
do mundo capitalista: a lei não passa, porque prejudicaria as empresas.
Nada do que pode ser considerado realmente relevante no
caso foi levado em conta: a função social da empresa; os avanços nas ciências da
saúde, que já tem bem mais certezas sobre a doença alcoolismo; e a cegueira
gritante e lamentável do empresariado, que não consegue nem mesmo enxergar que a
despedida por justa causa de alcoólatras sempre será prejudicial às empresas, ao
contrário do que concluíram os deputados que trataram da questão de forma bem
apressada.
Vejamos a Ementa do Projeto-de-Lei:
“Altera o art. 482 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e o art. 132 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, para disciplinar a demissão do alcoolista e estabelecer-lhe garantia provisória de emprego.”
“Altera o art. 482 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e o art. 132 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, para disciplinar a demissão do alcoolista e estabelecer-lhe garantia provisória de emprego.”
E a Explicação da Ementa:
“A rescisão do contrato de trabalho do empregado ou demissão do servidor, somente será permitida caso haja recusa a se submeter a tratamento.”
“A rescisão do contrato de trabalho do empregado ou demissão do servidor, somente será permitida caso haja recusa a se submeter a tratamento.”
O resultado:
Rejeitada.
É importante observar alguns aspectos dessa questão.
O alcoolismo como doença foi objeto de muitas discussões,
demissões, alegações e decisões durante os últimos vinte anos, pelo menos, num
mar de opiniões que surgiam de acordo com as descobertas e anúncios de novas
pesquisas, interpretações e conclusões científicas. Paralelamente, os
trabalhadores eram vítimas ou beneficiários da questão conforme a crise
econômica ou o humor dos administradores, que decidiam demitir e o Judiciário
mandava readmitir; implantavam programas de assistência, aí o Judiciário mudava
de rumo e admitia a demissão.
A proposta de alteração na lei foi elaborada de forma
inteligente, pois não passava a mão na cabeça de qualquer bebedor contumaz.
Estava bem claro que para evitar a demissão por justa causa o empregado
precisava admitir seu problema com o álcool e partir para um tratamento. Era o
preço da preservação do emprego, e aí as empresas beneficiar-se-iam
principalmente com a recuperação de empregados preparados e nos quais haviam
investido em experiência, formação e treinamento.
Lamentavelmente a relatora na comissão que apreciou a
matéria de forma terminativa, deputada Andreia Zito (PSDB-RJ), ao recomendar a
rejeição por considerar que a medida prejudicaria as empresas, negou uma função
social importante que a empresa tem, tomando partido tão somente do capital
explorador da mão de obra. Não tem sentido, nos dias atuais, a alegação
mesquinha de que as responsabilidades seriam só dos próprios empregados, das
famílias e, em última instância, do Estado, não devendo, segundo ela, recair
sobre os empreendimentos privados.
Esta questão, com certeza, não deixará se ser motivo de
discussão e de novos projetos, pois existem parlamentares mais sintonizados com
a realidade em que vivemos. Tanto é assim, que a mesma proposta foi aprovada
pelo Senado Federal e esperava-se que o mesmo ocorresse na Câmara dos Deputados.
Da mesma forma, resta, nesse triste hiato de desproteção dos trabalhadores
vitimados pelo alcoolismo, a sabedoria e o poder de fazer justiça que se
encontra no Judiciário, capaz de interpretar o Direito além do simples interesse
daqueles que só conseguem enxergar em cada empreendimento o fluxo do
caixa.
*Jornalista e Bacharel em Direito
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