
Brasília e a Sagrada Família
Emanoel Barreto
Há um quê de clamor cabisbaixo nessa foto de família anônima. Perplexidade compartilhada ante a Brasília recém-inaugurada, 50 anos comemorados hoje. A foto, documento instantâneo, momento preciso, é tragicamente biográfica. Nela, de alguma forma, estão todas as vidas anuladas de brasileiros desconhecidos, multidão de sonhos incompletos - pesadelos, pelo fato mesmo da incompletude.
A Sagrada Família do trabalhador honesto e maltratado olha a monumental obra, epopéia pulsante em cimento e utopia. Cinquenta pesados anos se passaram. Mil vidas vividas nessa travessia.
Brasília, festa de portentosos monumentos; arquitetura erguida no espaço grande do planalto central.
E essa família, meu Deus? Que fim levou? Onde estarão o pai, a mãe e os quatro filhos? Perdidos, quem sabe, na multidão parda onde as sobras e as sombras se encontram, enquanto se constroi a tragédia brasileira.
A foto em si é poema, é elegia. O homem pequeno diante do destino. Perplexo e maravilhado, vive uma espécie de medo ungido de humilde esperança. É como se o dobre de um sino dissesse: "Brasil, capital Brasília... Brasil, capital Brasília. Para onde vai você, José, com sua Sagrada Família? Brasil, capital Brasília, Brasil, capital Brasília"
Eu nao pergunto nada, porque o resto o sino não sabe; o resto o sino não sabe... o resto... bom, é melhor parar por aqui. Porque, o resto, o sino não sabe.
Um comentário:
Verdade verdadeiramente maravilhosa.
por Uai Minas
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