domingo, 10 de dezembro de 2006

"Turistas", uma história de horror onde o Brasil é personagem e monstro

Circula na internet um indignado texto atribuído à internauta Rosely Júlio, onde se denuncia que estreará no Brasil, em fevereiro de 2007, o filme "Turistas" - assim mesmo, em português. A indignação com a produção da Fox é que, em resumo, esta apresenta nosso país como uma terra de bárbaros, aproveitadores, gente sem o menor escrúpulo que seqüestra um grupo de jovens americanos para lhes retirar órgãos e vender no sinistro mercado que comercia a vida humana.

Trata-se evidentemente de um reducionismo grosseiro e mal-intencionado, feito a partir do estereótipo sensualidade tropical&selva. Selva para onde os jovens são levados após uma farra na praia, quando teriam sido vítimas do golpe do boa-noite-cinderela. Ali, em plena jungle, são submetidos a tratamento brutal numa cabana e aterrorizados. Aparetemente tentam fugir e uma jovem cai num abismo. O trailer que me chegou mostra até aí.

Vejamos agora alguns aspectos: primeiro - a Fox é propriedade do magnata anglo-australiano Rupert Murdoch, dono do grupo News Corporation, que no Brasil tem o controle das operadoras Sky e DirecTV. Portanto, ele tem todo o interesse em desmoralizar o Brasil selvagem, inculto, belo porém bárbaro, para dar lugar à nova cultura globalizada, que certamente nos levará ao caminho reto e seguro do american way of life.

Segundo, e aí a visão internacional sobre o Brasil se arrima para avançar sobre nós garras e asas dos falcões do capitalismo internacional, nós mesmos projetamos para o exterior a idéia de que somos ao mesmo tempo hedonistas e dependentes, lascivos e irresponsáveis, licenciosos e incompetentes. Ficamos loucos de alegria quando o carnaval explode em sexo e orgia e isso atrai dólares e, aí sim, turistas.

Para completar, os correspondentes estrangeiros somente enviam aos seus jornais e agências de notícias aquilo que a noticiabilidade jornalística já tem incorporada há séculos: acontecimentos brutais como a guerra dos traficantes no Rio, a incompetência do Estado brasileiro em enfrentar o crime organizado, sua histórica omissão perante a Amazônia em devastação.

Para os invasores, vale tudo para manter em maré alta sua situação central e a nossa periferia. De alguma forma esse tipo de filme é indicial, é uma pista de que algo não vai bem. E não vai bem há muito tempo. Há poucos dias a presidente do STF, ministra Ellen Gracia, foi assaltada. Seus seguranças sequer resistiram. Ela não deu queixa à polícia. Os invasores vêem isso e estão à espreita. Depois, sair da ficção para ingressar na realidade é um passo.

Ou alguém duvida que em mais uns quarenta anos os marines estejam saltando sobre a Amazônia para garantir que o Inferno Verde seja salvo da insanidade nossa, e todo o território seja entregue ao controle internacional? Afinal, a floresta está sendo atacada, e atacada por nós, brasileiros.

Como no filme, seus órgãos vitais, as árvores, estão sendo retirados e vendidos. E então, Turistas será uma visão antecipada, uma metáfora inesperada e truculenta daquilo que, temo, virá. E aí, chegará a hora dos rangers aportar em socorro da vida. Depois bye, bye Brasil. Será tarde e Inês é morta.

E o mais irônico: mesmo manifestando indignação com Turistas, o texto atribuído a Rosely informa que ela mora no exterior, amedrontada que está com a violência em nosso país. É um protesto ridículo ou deplorável? Será que somos apenas isso: ridículos e deploráveis?

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