domingo, 8 de outubro de 2006

A cidadania acabrunhada

"O espetáculo não é um conjunto
de imagens, mas uma relação
social entre pessoas, mediada
por imagens."
Guy Debord , no livro "A sociedade do espetáculo"

O debate hoje na Band, entre o presidente Lula e Geraldo Alckmin, se encaixa à perfeição na frase de abertura desta coluna. Tristemente, este país vê seu destino histórico literalmente dependende de um espetáculo televisivo, a ser repetido proximamente pela Globo.

Tristemente, o debate resulta das condições histórico-político-comunicacionais do país, que parece ter se transformado num grande palco, onde políticos encenam uma ópera bufa e o povo paga para ver.

O resultado do primeiro turno foi claríssimo: Lula tinha tudo para ganhar, mas, por incompetência sua e de seus assessores não soube conduzir o clima que lhe era favorável e terminou perdendo terreno para o tucanato. Nisso, é óbvio, teve também o auxílio luxuoso do pandeiro da ala corrupta do PT. A fusão foi fatal para liquidar as pretensões de Lula a uma vitória no primeiro turno.

E Alckmin, que parecia fadado a sofrer uma, como se dizia antigamente, fragorosa derrota, conseguiu dobrar os ânimos petistas e agora mantém algum alento de chegar à presidência da República.

Suspeito que teremos hoje não um debate de idéias, um confronto de visões de mundo, propostas de governo, emissão de compromissos com a socidade.

Os candidatos entrarão na arena da Band como os gladiadores, que não eram heróis, nem guerreiros, mas homens degradados. Não se enfrentavam em batalhas, mas numa carnificina. O que veremos hoje à noite deverá ser um combate, uma troca de acusações. Cada um procurando provar que é bom, reto e justo.

Todos os participantes, desde os candidatos, passando pelos jornalistas, os convidados que estarão no estúdio e especialmente o povo, aqui colocado na condição técnica de telespectador, sabem que ali está em andamento não um debate na essência do termo, mas uma simulação, um simulacro de debate.

Na verdade, estarão se enfrentando dois seres humanos que, desesperadamente, lutam para chegar a um ponto do Poder: a presidência da República. Como ambos são portadores de comportamento político reprovável, cada um buscará apor ao outro todos os defeitos éticos possíveis.

Resumindo: Lula deu total guarida a todos os atos de corrupção de seus seguidores; Alckmin trabalhou firmemente contra a instalação de qualquer CPI que quisesse apurar casos de corrupção em seu governo. Ou seja: é um pelo outro. Ou, como diria o ditado popular: o sujo falando do mal-lavado.

Temo que venha a se tornar um espetáculo deprimente. Será impossível a emissão de um raciócínio mais elaborado, pois o tempo para perguntas e resposta é curtíssimo: perguntas deverão ser feitas em 45 segundos e respostas em dois minutos.

É a ditadura do espetáculo televisivo colaborando para decidir os destinos nacionais. Eu disse "colaborando"? É a ditadura do jogo político, suas sendas escuras, suas retóricas vazias, ajudando a formar o futuro da nação, do seu povo, dos seus pobres. Eu disse "ajudando"?

Sim, quem sabe, ajudando no sentido de Judas; no sentido de traição ao social pelo ganho dos trinta dinheiros do Poder e tudo o que se pode fazer com esse Poder.

A cidadania está acabrunhada. Às oito da noite o Coliseu da Band abre seus espaços. Ave Caesar, morituri te salutant .

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