sábado, 17 de dezembro de 2022

 Bolsonaro, o mito de Narciso e a dura derrota

Por Emanoel Barreto

A Folha de S. Paulo informa que Bolsonaro está deprimido, pois afinal entendeu – embora não aceite –, que logo, logo, não mais será presidente. Frente a tal situação, diz a Folha, passará três meses sem envolvimento político, recolhido à mansão que seu partido, o PL, alugou para ele em Brasília.

Mais: como presidente honorário do partido terá salário e gabinete. Além disso, seus filhos que detêm mandato atuarão no sentido de manter o pai em evidência e as redes sociais continuarão inundadas de informes que louvarão o ex-presidente.

A questão a ser levantada é a seguinte: se ele tem mesmo liderança, por que é preciso manter-se em Brasília, como se ainda fosse figura central a decisiva no processo político nacional? Por que necessita criar em torno de si efervescência, por que precisa causar para em busca de manter vínculos comunicacionais com o eleitorado?

Em situação reversa, o presidente eleito, Lula, ao término de seu último mandato foi para São Paulo, não teve qualquer sistema de comunicação a seu favor, foi preso, espezinhado pela grande imprensa e, mesmo assim, voltou. A verdadeira liderança, por ser autêntica, prescinde de engenharia de comunicação a fim de manter-se em linha com essa entidade difusa chamada povo.

A questão é que Bolsonaro, como é incapaz de formular propostas político-administrativas relevantes, elaborar um projeto de nação, estabelecer utopias, vale-se e trabalha a pequena política, aquela do disse-me-disse, do não-sei-quem-é-ruim, Lula-não-presta, vamos defender a família, o comunismo vem aí...

De tais atitudes de comunicação planejada surgem comentários nas redes sociais e uma intensa troca de conversas que tem por fundamentação mentiras e visões de mundo, limitadas e balizadas pelo mais baixo e grotesco senso comum.

Isso é tão perigoso que resultou nos atos de terrorismo em Brasília, quando pessoas partiram para o ataque à sede da Polícia Federal e queimaram ônibus e automóveis. Então, o que se busca, e isso não é só Bolsonaro, mas seu entorno, é criar um sujeito, um personagem identitário àquele candidato baixo-clero que levou uma suposta facada e com isso logrou a eleição.

Estão tentando criar um Bolsonaro do pastiche de si mesmo. Espelhamento de si mesmo feito por um ator político que, parece, começa a não mais existir enquanto representação, símbolo de uma corrente de pensamento caótica, líder da mais reacionária e grosseira direita deste país.

Como cambaleia na depressão – e isso é lamentável e indesejável a qualquer pessoa – surge o aparato de comunicação e a encenação de ficar morando em Brasília como se presidente fosse, mesmo que presidente postiço, por honorário, do PL. O que se pretende é criar uma aparência, uma sensação, a performance de que o mito está forte e intacto – “Bolsonaro ainda é Bolsonaro”, quando, na verdade, tenta arremedar a si mesmo.

A História dirá, muito em breve, quais serão os resultados da proposta desse narciso que busca se encontrar na imagem, na aparência de si, e espera que seus seguidores acreditem que ainda é a mesma pessoa política. O homem, claro, é o mesmo, mas o narciso, o simulacro que se busca criar pode se perder frente à realidade desoladora que o quase ex-presidente busca não ver: perdeu a eleição e nenhum sortilégio midiático poderá inverter tal quadro.

 

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