terça-feira, 13 de outubro de 2020

Porque acho que não

 existe o tempo

Por Emanoel Barreto

Não creio na existência do tempo; não o vejo como algo que tenha consistência própria, uma espécie de fato metafísico, uma realidade suprassensível, espécie de régua que mede o passar da vida e das coisas e com a qual podemos mensurar e valorar a sequência de tudo o que perpetramos na vida enquanto a vivemos.

Suponho que o tempo seja apenas uma ilusão de ótica histórica gerada pela percepção dos fatos, sua memorização, encaixe nessa memória e posterior recordação. Essa montagem dos episódios seria então o tempo.

Os dias e noites, as alterações que ocorrem na face da Terra, nosso envelhecimento, nossa memorização e lembranças ajudam a fortalecer a visão desse fantasma a quem chamamos tempo.

Veja bem: se uma pedra qualquer mantiver-se íntegra por um  trilhão de anos, ou seja, se não for partida ao meio ou algo que de qualquer forma a altere, será a mesma pedra ao final desse um trilhão de anos. E, portanto, o tempo não terá passado para ela. E por quê? Porque não haverá memória relativa a essa quebra ou alteração. Não havendo memória não haverá tempo, pois falta referência a esse fato.

As alterações se dão no mundo e, memorizadas, insisto, geram a sensação de tempo. O problema é que não podemos dizer enquanto esperamos aquele atendimento médico e o doutor nunca chega: “Estou aqui há dois fatos, três acontecimentos, duas ocorrências e quatro esperas.”

Em substituição dizemos: “Estou aqui há duas horas e nada de o médico chegar.” Isso faz sentido em nossa convenção social de fala e na parte relativa ao que chamamos tempo, e facilita a manifestação de nossa indignação.

E mais: a marcação do relógio, para onde olhamos desesperados e ansiosos ajuda na sensação de tempo perdido, e tal situação se amplia sob a lupa da impaciência. E é mesmo terrível esperar por médico, não acha?

Enfeixando tudo o que eu disse: a temporalidade, a aceitar-se meus argumentos, seria então uma espécie de metonímia, aquela figura de linguagem “marcada pela substituição de um termo por outro que guardam entre si uma relação de contiguidade, ou seja, um faz parte do outro”, segundo registro dicionarizado.

Sendo assim, substituímos a sequência de fatos e nossa inserção emocional naquelas pelo termo “tempo” e pronto. A vida passa. Depois viramos esquecimento que também é uma forma de tempo. Mesmo que o tempo não exista.

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PS: talvez algum grande filósofo ou físico ou matemático ou sei lá o quê, possa provar que estou errado. Então eu perdi meu tempo escrevendo essa crônica (termo que também tem a haver com tempo) e você perdeu o seu lendo este texto. Mas acho que valeu a pena, não valeu?

 

 

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