quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

 Montagner e Maria Fernanda Cândido: o Brasil de presidente novo

 O brado retumbante

Impressionante a forma como a Câmara dos Deputados foi apresentada ontem na minissérie Brado Retumbante: tipos boçais aplicadíssimos em seus computadores, outros presos ao celular: são esses os nossos representantes. Com isso, a produção da Globo parece ser um desses raros instantes de inteligência nas coisas da emissora dos Marinho. 

O ator Domingos Montagner faz o papel de um novo presidente da república, e que república. Cercado por um ministério de tipos ávidos, inconfiáveis, homens de intenções rasteiras, o ator conseguiu assumir expressão facial de um homem inseguro, alguém pisando em gelo fino. 

Ressalte-se o aspecto existencial, bastante humano, do personagem: ao ser acordado por um amigo que o comunica que será o próximo presidente, Paulo Ventura, o deputado que vira presidente de uma hora para outra, está curtindo ressaca pesada - que o diga a garrafa de uísque quase vazia jogada a um canto. 

Vêm a seguir o choque, a perplexidade, o temor da nova responsabilidade por parte de Ventura, veja só: um homem separado, uma voz que prega no deserto da política das espertezas está envolvido com a mulher de um colega, um senador baiano, típico representante da política miúda, feita a retalhos, safada, brasileiríssima.

Temos então a mais pura realidade transposta à ficção. Temos, efetivamente, verossimilhança: representação exata, ou pelo menos aceitável do real pela ficção, que critica o real do qual é ilação. Ficção como realidade escandida, levada às consequências máximas da dramaturgia televisiva, cuja enunciação ganha força exatamente pelos liames firmes com aquilo que representa.

A minissérie é carnavalizada, aqui no sentido de uso do carnaval como elemento crítico e atuante em meio à condição dionisíaca que deflagra: o Brasil como pátria de pilantras - que preguiça. Creio que a série tem tudo para atender a um determinado tipo de público que, à falta de um brado retumbante na vida, ganha esse grito no meio da tragédia que nos chega pelas antenas de TV. A arte de viver com a fé, só não se sabe fé em quê.