quarta-feira, 27 de janeiro de 2010



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Artilharia da imprensa
Emanoel Barreto

Valho-me do título da obra clássica de James Reston para analisar as manchetes do Estadão e a Folha, encontrando no subtexto da segunda a ação do jornal como partido político. Gramsci deixava disso bem claro, quando enunciava que jornais podem inserir vilegiatura política em seu noticiário e opinião, desde que assumindo atitude proselitista, doutrinária, assemelhada à de partido político.

E isso a partir de uma constatação: o comportamento agressivo dos sem-terra, prática censurável é verdade, serve de deixa para que o jornal, que nos tempos da ditadura emprestava viaturas para ações repressivas de grupos paramilitares e parapoliciais, pratique ato de partido político. Como? Pelo simples fato de que, primeiro, nota-se um dado de júbilo na assertiva textual do título; segundo, essa asserção toma contornos opinativos, por consequência mesma do júbilo.

Trata-se de discurso que infere à existência de movimento popular contestador, cuja práxis, eivada de atos agressivos, permite aos setores da conservação emitir mensagens que se contrapõem a esse movimento. Que, a despeito da justeza de sua causa, incorre em falha que permite a adversários como a Folha obscurecerem a necessidade de uma reforma agrária, coocando o MST quase que em igualdade de contições com criminosos.

A isso acrescanta-se detalhe de relevo: o fato em si não mereceria jamais uma manchete de primeira página, em função de que jornalisticamente está distanciasdo no tempo (o tempo jornalístico é muito fugidio. Vide a situação do Haiti, que já começa a perder espaço editorial) e suas repercussões sociais foram bastante limitadas.

Quanto ao Estadão, a manchete está certíssima. A distribuição de lucros pelas empresas a seus funcionários, em percentual de cinco por cento (li isso no Estadão) gera evidentemente expectativa social generalizada quanto a seus possíveis desdobramentos.

Não que o Estadão também não seja de alguma forma um jornal com ação assemelhada à de partido político. Bem distante disso. Mas, tecnicamente, a escolha foi a mais acertada. Então, porque a Folha não divulgou com destaque o mesmo evento, deixando ao concorrente caminho livre para tratar de assunto efetivamente de importância?

Resposta: pela militância. Pela atitude de confronto jornalístico com os sem-terra. Por ver aí, na falha do método de ocupação, fator que permitirá, a longo prazo, o contínuo estilolar da imagem desse movimento, que é justo, mas metodicamente equivocado. Sua artilharia, sem dúvida, continuará com fogo pesado.

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