terça-feira, 11 de abril de 2006

"É goooooooooooooool!"

“O sapateiro não é a
pessoa mais autorizada a
dizer onde o sapato aperta.”
(Raymundo Faoro, ex-presidente da OAB)

Não se sabe bem como, mas, de repente, ele se viu cercado por um bando de meninos taludos, todos acusando-o de haver, simplesmente, furado a bola da turma. “Eu? Como fiz isso?”, questionou, antes de receber o primeiro safanão na cabeça.

“Ora”, respondeu o maior de todos “vimos quando você ia passando e chutou a nossa bola, que voou e bateu bem ali, naquele caco de vidro.”

Só que não tinha sido ele. A bola realmente dera a impressão de haver batido em seu pé direito, seguindo então certeira para o caco de vidro, desses que são colocados em cima de muros, para proteger o quintal das casas.

O menino raivoso perguntou, ameaçador: “E agora, vai pagar o prejuízo?” Ele não tinha como pagar o prejuízo de uma bola oficial, novinha, orgulho de turma.

“Então”, disse o maioral, “vamos ficar com os seus sapatos. Vamos vender e comprar outra bola.” Ele não tinha como se defender. Era menor, mais fraco, estava sozinho e os outros eram exatamente o seu oposto.

Outro garoto da turma, sentindo-se o próprio senhor da situação, uma espécie de vassalo privilegiado do mandão do pedaço, até aproveitou para lançar um desafio, certo de que isso resultaria na humilhação total do garoto que estava sendo acusado.

Disse:“E vai ver que você nem ao menos joga futebol. Deu aquele chutão só por chutar. Não dribla, não faz embaixada, não cruza, não atira a gol.” Todos caíram na risada. Era o máximo, tripudiar sobre alguém indefeso.

Como que por encanto alguém apareceu com uma bola, também oficial e novinha e lha entregou: “Toma, vai lá, mostra que é o bicho...”, ironizou o aprendiz de brutamontes. O menino olhou para um lado, para o outro, buscou uma brecha por onde pudesse fugir e somente viu ante seus olhos uma massa compacta de corpos rijos, que impediam até mesmo um pensamento de escapada.

Aí, aconteceu o que nem ele mesmo esperava. “Vai!”, berrou um moleque, empurrando-o. E ele foi. Incrivelmente, dominou a bola, fez embaixadas incríveis, driblou um, dois, três, quatro e seguiu em frente, dando um show.

A molecada de queixo caído. Ele controlou a situação, saiu jogando sozinho, deu um chute enorme e estourou a bola contra um ferro pontudo que havia num muro. Todos fizeram “ohhhhhhhhh!”, enquanto viam a bola murchar.

Ele sorriu, virou-se para os adversários e berrou a plenos pulmões: “É goooooooool!!!”, e foi embora sorrindo.

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