"Saio deste mundo com a convicçãode que não é
nem a razão nem a verdade que nos guiam: só a paixão e a
quimera nos levam a resoluções definitivas.”
( Epitáfio do jornalista David Nasser)
Na TV, os programas de conteúdo policial, tentando justificar a exposição explícita da violência urbana, escudam-se sob o manto do que é chamado vulgarmente de “jornalismo-verdade”. A expressão, na verdade (com trocadilhos e tudo), encobre o desejo mórbido e sensacionalista de fazer chegar ao leitor, ouvinte ou telespectador, fatos chocantes em sua forma mais crua, uma vez que esse jornalismo se espalha nos três segmentos de mídia.
É básico, na ética jornalística, que não se deve levar ao leitor (em sentido amplo), fatos chocantes em detalhes, respeitando-se a intimidade de quem toma contato com a informação. É comum que pais e mães expressem revolta quando descobrem que seu veículo de informação preferido está trazendo a seus lares imagens ou textos de conteúdo grotesco.O jornal pode falar a respeito do fato terrível, do acontecimento lutuoso, do drama infinito dos assassinados, mas não precisa, nem deve, mostrar tudo isso em todo o seu terror.
Explicando melhor: passando por uma estrada, você se depara com um acidente. Sabe que morreu alguém de maneira trágica. Se puder ajudar, tudo bem, mas duvido, duvido muito, que tenha interesse de ver como ficou o cadáver desfigurado. Mas, se por mórbida curiosidade, achegar-se ao corpo, certamente recuará, sentindo que não se deveria ter exposto a tão chocante cena.
É a mesma coisa com o jornal: deve ter em seus arquivos os mais terríveis imagens, por enésinos motivos: ajudar a investigações policiais, contribuir em algum processo judicial. Mas tomando todas as precauções quanto a uma suposta e futura publicação.Mas hoje, especialmente na TV, frente à vulgaridade da programação, o sofrimento passou a fazer parte do noticiário espetacularizado.
Não sou contra a notícia televisiva bem editada, ou seja: mostrada de forma criativa, com todos os requintes que a informatização do noticiário permite, incluindo-se aí a música incidental. Explico-me: se você mostra um jogo de futebol, com câmeras em tudo quanto é lado, por que manter a coisa como se fazia há 30 anos, com takes laterais e, no máximo, de fundo de campo? Não: vamos mostrar tudo e da melhor maneira possível. É uma forma de jornalismo dramatúrgico, mas que, bem aplicado, tem um efeito positivo.
Numa matéria sobre natureza, por que não explorar as possibilidades estéticas de enquadramentos bem feitos, com uma música de fundo apropriada e uma locução compatível? Quem não gosta de uma crônica de Sandra Moreyra, no Bom Dia Brasil, mostrando como se prepara um finíssimo prato, aquela iguaria dos deuses? A própria crônica de Sandra já é uma obra de arte, tanto quanto a culinária que ela apresenta. É impressionista, informa e alegra a alma. É a notícia bela.
Mas é triste ver a exposição do homem morto, o peito perfurado a bala, o sangue espalhado no chão sujo da rua. Esse tipo de expressão jornalística somente desmerece a informação, cria no expectador uma espécie de destinatário cruel. Na verdade, tenta-se criar um destinatário cruel, como se as pessoas gostassem de ver o mal. Não, não gostam. As pessoas devem saber que algo aconteceu. Mas se esse algo contém algo de sórdido, de ruim, de cruel e torpe, não precisam de detalhes. É uma informação infame. São coisas do Brasil, mas o Brasil não precisa disso.
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